Diante de um cenário de inflação baixa (3%) e de desemprego ainda elevado (11,8%), o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) reduziu, na noite da quarta-feira 7, a taxa básica de juros (Selic) pela décima primeira vez consecutiva, para 6,75% ao ano. Quando assumiu a presidência do BC, em junho de 2016, o economista Ilan Goldfajn encontrou um cenário com Selic em 14,25% e inflação anual em 8,84%. A taxa, que está no menor patamar da história, ajuda a aguçar o apetite de consumidores e de empresários, que, aos poucos, voltam a demandar financiamentos após um longo período de recessão.
O Departamento de Pesquisa e Estudos Econômicos do Bradesco prevê o maior impulso do crédito desde 2007, com uma expansão de 5% neste ano, sendo de 6,5% na carteira de pessoa física e de 3,4% na carteira de pessoa jurídica. “A queda da inadimplência abre um espaço para as pessoas voltarem a se endividar”, afirma Thaís Zara, economista-chefe da consultoria Rosenberg Associados, que participou do programa “Papo de Economista”, na TV Dinheiro.
Apesar de saudarem a queda da Selic, os empresários reclamam que as taxas não caem na ponta com a mesma intensidade. E eles têm razão.Um levantamento feito pela Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) mostra que as empresas pagam 29% ao ano de capital de giro e os consumidores desembolsam 27% em financiamento de automóveis (leia quadro ao final da reportagem). Detalhe: essas duas taxas são até pequenas se comparadas com as linhas de conta garantida (146%) e de cheque especial (295%).
A culpa é do chamado spread bancário, que é a diferença entre a taxa que os bancos captam e a taxa cobrada dos clientes. As instituições financeiras alegam que a carga tributária elevada e o risco de inadimplência justificam o spread elevado. Porém, na avaliação do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, “o Banco Central precisa deixar de só fazer ameaças ao sistema bancário e tem de tomar ações incisivas para reduzir a taxa de juros ao tomador final”. Aumentar a concorrência bancária seria um bom caminho.
A despeito das taxas de juros ainda altas, vários setores apostam no crédito mais farto para crescer muito acima dos 3% previstos para o PIB, em 2018. O Secovi-SP, por exemplo, calcula que os lançamentos e as vendas de imóveis terão uma expansão de 10% neste ano. Para isso, as construtoras contam com mais financiamentos, que lubrificam a engrenagem do setor. “Após três anos consecutivos de queda, prevemos um crescimento de 15% no crédito imobiliário”, diz Gilberto Duarte de Abreu Filho, executivo do Santander e presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip). “Inflação baixa, juros menores, geração de emprego e alta na confiança ajudam muito.” Além disso, Abreu Filho salienta que a caderneta de poupança, responsável por quase metade dos recursos destinados aos financiamentos imobiliários, precisa ter captações positivas.
A indústria automotiva também aposta suas fichas no crédito mais barato ao projetar alta de 11,7% nas vendas de veículos em 2018. “Financiamento é fundamental”, afirma Antonio Megale, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). “A queda dos juros faz com que a prestação caiba no bolso dos consumidores.” O setor acredita que uma parte da clientela, que havia migrado para o segmento de carros usados durante a crise, voltará a frequentar as concessionárias. Otimismo semelhante é constatado na indústria de eletroeletrônicos, que tende a crescer à medida que os bancos forem reabrindo a torneira do crédito. Para 2018, ano de Copa do Mundo, a Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros) prevê alta de quase 10% nas vendas de televisores, totalizando 12,6 milhões de aparelhos. Boa parte será paga em prestações.
O atual ciclo de juros baixos não tem data para acabar. Ao contrário do que ocorreu no governo Dilma Rousseff, quando a taxa Selic foi derrubada na canetada, os fundamentos macroeconômicos atuais permitem a manutenção dos juros básicos em patamares inferiores a 10% por um longo período. “Sem aparecer uma Dilma no caminho e sem um choque externo grave, não há motivos para a Selic voltar ao patamar de dois dígitos”, diz Evandro Buccini, economista-chefe da Rio Bravo Investimentos. “Mas o Brasil precisa equacionar o rombo fiscal, e isso inclui a reforma da Previdência.”