Célia Froufe e Márcia De Chiara
Janeiro registrou o maior volume de retiradas da caderneta de poupança da série histórica, iniciada em 1995. Segundo o Banco Central (BC), os saques superaram os depósitos em R$ 12 bilhões.O recorde negativo anterior era de março de 2015, com perdas de R$ 11,4 bilhões.
O resultado de janeiro passado só não foi pior porque no último dia útil do mês ingressaram R$ 3,4 bilhões na poupança. Até o dia 28, a conta estava negativa em R$ 15,4 bilhões. Esse movimento de fim de mês é recorrente por causa de aplicações automáticas da conta corrente que alguns investidores deixam programadas em seus bancos.
A acentuada deterioração da caderneta se dá depois de uma recuperação em dezembro do ano passado, quando ocorreu uma injeção de recursos do pagamento do 13.º salário. Em dezembro, o saldo foi de R$ 4,7 bilhões, único resultado positivo de 2015.
As perdas da caderneta se explicam pela piora da economia, pelo aumento do desemprego e pelaconcentraçãode pagamentos de impostos em janeiro, como de veículos e de imóveis, e de gastos extras com matrícula e material escolar. Apertados pelacrise, os brasileiros aumentaram os saques da aplicação.
De acordo com o BC, o total de depósitos no mês passado foi de R$ 149,5 bilhões e o de saques, de R$ 161,5 bilhões. O patrimônio acumulado da caderneta de poupança está em R$ 648,6 bilhões,já considerando os rendimentos de R$ 4 bilhões de janeiro.
Mesmo com essa rentabilidade, o estoque da caderneta recuou em relação a dezembro, porque o saldo de saques foi praticamente três vezes superior a esse valor. Outro ponto que pesa contra a poupança é que há no mercado investimentos mais rentáveis, atrelados ao dólar e aos juros e que fizeram a caderneta perder o brilho nos últimos meses.
Habitação - A sangria de recursos da caderneta de poupança, que é a principal fonte de financiamento da casa própria, preocupa o setor da habitação. Hoje, recursos do FGTS e da poupança respondem por 95% do funding dos financiamentos. A poupança responde por 60% desse total.
Para o presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Gilberto Duarte de Abreu Filho, a retirada de recursos acima do esperado deve encarecer o crédito para o consumidor, uma vez que os bancos terão de buscar outras fontes de financiamento, como LCI e CRI (títulos de dívida lastreados por crédito imobiliário), em que o custo de captação é mais alto. “O que já está difícil deve piorar”, diz o vice-presidente de Habitação Popular do Sinduscon-SP, Ronaldo Cury, fazendo referência à dificuldade de se obter crédito imobiliário. Ele acredita que o volume de distratos dos contratos de compra de imóveis na planta, que já é alto, deve crescer nocurto prazo.
Para atenuar o aperto e o encarecimento do crédito, Cury diz que as construtoras pediram ao governo que reduza os depósitos compulsórios que os bancos têm de fazer no BC. Outra alternativa é as próprias empresas bancarem os empréstimos.