O pequeno crescimento da demanda por crédito imobiliário neste ano foi concentrado em linhas mais baratas. Porém, a restrição dessas modalidades, baseadas especialmente em recursos do FGTS, pode limitar a retomada, que passa a depender da maior disposição dos bancos em reduzir os juros.
Maior agente do setor, a Caixa Econômica Federal anunciou neste mês a suspensão da linha pró-cotista até o ano que vem, depois de já ter interrompido as contratações em abril e junho. A modalidade, apoiada no funding do FGTS, é a mais barata do mercado depois do Minha Casa, Minha Vida - programa que desacelerou sob o governo Temer.
A Caixa já liberou R$ 6,1 bilhões do pró-cotista desde janeiro, o que corresponde a todo o orçamento para a linha em 2017 e a cerca de um terço das contratações de crédito imobiliário feitas pelo banco desde janeiro. No ano passado, os recursos na modalidade somaram R$ 5,5 bilhões. Novas contratações foram suspensas porque o limite orçamentário foi alcançado - o banco nega qualquer relação entre o esgotamento e os saques das contas inativas do FGTS, que já somaram R$ 41,8 bilhões.
O Banco do Brasil (BB) também oferece pró-cotista, mas numa escala menor. No primeiro semestre deste ano, foram liberados R$ 700 milhões na modalidade, com alta de 35%. Até agora, foi a linha de maior crescimento. "Temos um volume aportado pelo FGTS que é suficiente para atender a demanda até o fim do ano", afirma Edson Pascoal Cardozo, diretor de empréstimos, financiamentos e crédito imobiliário do BB.
O executivo do BB diz não ter notado um aumento na procura por conta da suspensão do pró-cotista na Caixa, mas ressalta que, de maneira geral, tem havido um maior interesse pelo crédito imobiliário. "A gente já percebe um otimismo maior", afirma Cardozo.
No caso da própria Caixa, o maior crescimento neste ano foi verificado numa linha que usa recursos da poupança e tem taxa máxima de 11% ao ano. As contratações nessa modalidade somaram R$ 4,2 bilhões no primeiro trimestre, um aumento de 50% em relação ao orçamento do ano passado, informa o banco.
A limitação no financiamento imobiliário com funding do FGTS - operado apenas pelos bancos estatais - abre espaço para os concorrentes privados. Porém, também representa um desafio, já que essas instituições dependem dos recursos da poupança e das emissões de letras de crédito imobiliário (LCI), duas fontes mais caras. Nos momentos em que os recursos do pró-cotista encolhem, o mercado não consegue preencher totalmente essa lacuna. Essa linha, destinada a imóveis novos de até R$ 1,5 milhão ou usados de até 950 mil, tem taxas de 7,5% a 9% ao ano, enquanto a média do mercado estava em 11,8% ao ano em maio.
A Caixa interrompeu o pró-cotista em abril e depois novamente em junho, antes de suspendê-la de vez até 2018. Apesar disso, o crédito imobiliário com recursos da poupança não mudou de patamar, o que sugere que não houve um escoamento entre as modalidades. Em maio, o volume de financiamento com recursos da poupança foi de R$ 3,565 bilhões, segundo a Abecip, associação do setor. Houve crescimento de 13,8% em relação a abril, mas o mercado encolheu em relação a março, quando somou R$ 4 bilhões. Em relação a maio do ano passado, o volume caiu 8,6%.
"A migração não acontece totalmente porque as pessoas buscam a parcela que cabe no bolso", afirma Fabrizio Ianelli, superintendente executivo de negócios imobiliários do Santander.
Para tentar ocupar esse espaço, o banco anunciou neste mês uma redução no custo de suas linhas. O Santander baixou para 9,49% ao ano a taxa para financiamentos via Sistema Financeiro da Habitação (SFH) - antes, ia de 10,5% a 11%. Na carteira hipotecária (CH), o intervalo era de 11% a 12% e agora a taxa é de 9,99%. "Como reduzimos a diferença [em relação ao pró-cotista], esperamos ficar com uma parte desses clientes", diz Ianelli, ressaltando que as novas taxas do banco ficaram com um custo efetivo inferior ao das demais modalidades oferecidas pela Caixa.
Com isso, o Santander quer se posicionar para o que considera ser o início de uma retomada do mercado imobiliário neste semestre e no ano que vem. Em maio e junho, mesmo antes dos cortes nos juros, os pedidos de financiamento no banco cresceram mais de 50% em relação a meses anteriores, diz o executivo. "O crédito está mais barato e o preço dos imóveis ainda não reagiu", observa Ianelli.
A carteira imobiliária do Santander somava R$ 27 bilhões no fim de março, o que representa crescimento de 2% em 12 meses. A expectativa é acelerar essa expansão nos próximos meses.
Até agora, os demais bancos não anunciaram cortes nas taxas em resposta ao Santander.
"A gente é corredor de maratona", afirma Leandro Diniz, diretor de empréstimos e financiamentos do Bradesco. Segundo ele, o banco não fez nenhuma redução pontual de taxas, mas tem acompanhado a tendência do mercado com produtos "extremamente competitivos". Embora não se trate exatamente do mesmo perfil de tomador, o banco também tem a expectativa de captar parte da clientela que não conseguiu se financiar com a linha pró-cotista.
O Bradesco já notou uma melhora na demanda no primeiro semestre, dentro do esperado, e espera que essa "sequência favorável" continue na segunda metade do ano. "A queda da Selic e da inflação e o desemprego estabilizado são fatores que influenciam muito", diz o executivo.
Diniz afirma que a maior procura tem sido por financiamento para imóveis de dois dormitórios, na faixa de R$ 500 mil a R$ 600 mil. "A compra hoje é muito mais consciente, concentrada em imóveis para a necessidade da família."
A Caixa também nota uma movimentação maior no mercado. Só no primeiro trimestre, o volume de contratações em todas as linhas de crédito imobiliário do banco foi de R$ 18,79 bilhões, o que equivale a um aumento de 22,1% em relação ao mesmo período do ano passado.
O orçamento da instituição para o setor neste ano é de R$ 84 bilhões, pouco acima dos R$ 83,2 bilhões contratados em 2016. Porém, se o crescimento da demanda continuar no mesmo ritmo verificado no primeiro trimestre, o volume efetivo deve superar o previsto no orçamento, diz a Caixa por meio da assessoria de imprensa.
As taxas e as condições do mercado estão melhores que há um ano, observa Gilberto Duarte, presidente da Abecip. "Os preços têm caído. Os bancos têm repassado taxas melhores", ressalta.
A expectativa da associação é que o segundo semestre seja melhor que a primeira metade do ano e que o volume de financiamentos com recursos da poupança feche 2017 num patamar parecido com o do ano passado, de R$ 46,6 bilhões. "Os indicadores de confiança na economia já não reagem tão negativamente", afirma Duarte.
No ano, até maio, as concessões de crédito imobiliário, segundo dados do Banco Central, cresceram 1,8% em relação ao mesmo período do ano passado. Em maio, a alta foi de 23,4% ante abril.