Nos últimos anos, como alternativa para buscar recursos no mercado para bancar lançamentos, um número relevante de incorporadoras abriu o capital. A Luciano Wertheim, de São Paulo, não seguiu a onda. Na visão dos proprietários dessa companhia familiar de 73 anos, a postura um pouco mais conservadora é uma das razões da longevidade da empresa. “Temos endividamento zero para capital de giro e expansão”, afirmou à coluna
Ely Flávio Wertheim. Juntamente com seus dois irmãos, Ricardo e Osvaldo, ele dirige o negócio que leva o nome do seu pai, que foi responsável por fundar a empresa em 1950. Luciano Wertheim chegou ao Brasil sozinho, aos 13 anos, vindo da Polônia. Por aqui, formou-se em engenharia pela Escola Politécnica da USP, dava aulas para poder se sustentar e entrou no mercado imobiliário trabalhando como empreiteiro.
Na entrevista a seguir, Ely Flávio Wertheim, que é também presidente do Secovi-SP, fala da trajetória da Luciano Wertheim e das perspectivas do mercado imobiliário:
Qual a receita para a longevidade da empresa, uma das mais antigas em atuação na área de incorporadoras?
A receita é uma soma de ações. A primeira talvez seja dirigir a empresa respeitando seus limites, ou seja, traçar todo o planejamento enxergando o tamanho que ela tem. Seguimos ao longo desses 73 anos de atuação no mercado com endividamento zero para capital de giro e expansão. Outra ação importante é uma governança responsável, principalmente quando se trata de uma empresa familiar, que precisa estar atenta aos procedimentos e profissionalização dos processos em prol de um objetivo comum, sem misturar com o lado pessoal.
O terceiro ingrediente dessa receita é a capacidade de se modernizar, pois não se pode fazer a mesma coisa do mesmo jeito sempre, precisa estar atento as mudanças do mercado e da sociedade e se modernizar. Por fim, mas não menos importante, são as parcerias estratégicas. Uma das razões da Luciano Wertheim crescer sem se endividar é o resultado de parcerias que proporcionaram desenvolver projetos que, sozinhos, não conseguiríamos realizar, seja em tamanho ou em quantidade. Hoje temos parcerias importantes com o Fundo Secoi, com a Cyrela e a Plano e Plano.
A empresa já tem um plano de sucessão?
Esse é o hoje o maior desafio da empresa e ainda não encontramos uma solução de sucessão propriamente dita, mas construímos um modelo de sociedade interessante que tem funcionado bem. Hoje trabalhamos com algumas frentes de trabalho que operam de forma integrada, mas também podem atuar individualmente. Além da incorporação, oferecemos projeto de arquitetura e gerenciamento de obra para o mercado. É como se existisse um grupo da empresa com alguns braços de atuação, mas todos dentro do mesmo princípio.
O faturamento da empresa vai além dos lançamentos imobiliários?
A incorporação é a maior parte da empresa, sem duvida e além desses outros serviços que oferecemos. Ao logo dos anos construímos imóveis para renda, a maioria lajes comerciais, uma receita recorrente importante que nos dá uma certa segurança, principalmente na demanda dos pagamentos mensais que a empresa tem.
E como ficou essa parte de locação comercial durante o período da pandemia?
A pandemia foi sofrível, renegociamos muitos contratos, claro, entendemos a situação de todos e ajudamos bastante, mas foi uma perda nesse braço da empresa e ainda estamos nos recuperando. Inclusive, esse tema de trabalho remoto que a pandemia trouxe foi um aprendizado pra mim, pois era muito contra e não imaginei que pudesse dar certo. Ainda sou a favor do trabalho presencial e acho que as empresas em geral estão caminhando para se manterem assim, mas consegui perceber que a performance do trabalho a distancia foi boa também.
Duas semanas atrás, a taxa Selic se manteve alta, em 13.5%. Como o senhor enxerga os impactos desse número no mercado?
Vender imóvel nunca foi fácil. Selic alta ou baixa, fechar um negócio sempre foi difícil. O mercado imobiliário gira em função de três questões: taxa de juros, taxa de juros e taxa de juros. Seja para comprar imóvel, investir ou construir, o segredo é se antecipar e estar informado. O juro futuro indica uma queda, é para ele que devemos olhar. Claro que uma taxa Selic mais baixa muda o ambiente, mas não deve ser vista como um impeditivo. O percentual da Selic não é igual ao do financiamento imobiliário, eles não crescem iguais. Enquanto a Selic está em 13.5% o financiamento está e 10%. E usar o artificio de financiamento imobiliário permite sonhar mais alto. Se postergar a compra de um imóvel em função de taxa, em pouco tempo ele estará mais caro. Se comprar hoje e o juros do financiamento baixar, pode pedir automaticamente ao banco uma negociação ou até mesmo fazer a portabilidade para outra instituição bancária, aproveitando os valores menores do presente.
E a revisão do Plano Diretor de São Paulo, outra novidade dessa quinzena, qual a sua opinião?
O Plano Diretor da cidade permite que se façam novas leis de zoneamento que poderão ou não, aplicar o que foi definido na revisão, não significa que uma vez aprovado pelo prefeito, as mudanças já serão aplicadas. Muitas delas podem até mesmo nem acontecer ou levarão anos para serem colocadas em prática. O Plano Diretor é um estimulo ao Minha Casa Minha Vida e a ter uma cidade mais inclusiva. Em 40% da cidade moram apenas 25% das pessoas e aumentar a possibilidade de mais gente morar perto desse espaço é o que se chama de inclusão, já que as pessoas estarão mais perto de emprego, escolas, saúde e transporte. Sempre existirão os críticos das propostas dos planos diretores. Um dos pontos que sempre é questionado é o aumento do fluxo de carros em função de novos prédios, mas o que causa trânsito não é a chegada de um prédio, mas a falta de transporte público. O mercado imobiliário não pode responder questões e se responsabilizar por departamentos que não é dele.
É comum ouvir que o metro quadrado dos imóveis residenciais estão muito altos. Qual a razão para que se tenha essa impressão do mercado?
Preço alto ou baixo é muito relativo. Tudo vai depender do produto, mas principalmente do endereço. O que dita o mercado ainda é localização, localização e localização e terreno está muito caro porque são muito poucos que podem ser comprados. Isso acaba refletindo no preço final.
Como o senhor vê o papel do corretor no processo? Acha que a tecnologia pode reduzir a presença humana do profissional de vendas?
A Luciano Wertheim tem sua própria equipe de corretores, mas conta também com parcerias de vendas em algumas projetos. Acredito que o corretor que se destaca é aquele com mais conhecimento, cultura e postura profissional. A qualidade do atendimento faz a diferença e não acho que a tecnologia vai acabar com o papel do vendedor físico, eu sou judeu, tenho 5700 anos de comércio (risos). Quem souber manusear a tecnologia e usá-la a seu favor, vai se dar melhor.