Com a limitação do prazo do crédito rotativo para 30 dias - medida confirmada ontem -, as taxas de juros cobradas nos cartões de crédito vão convergir para níveis mais baixos, de até um dígito ao mês, sem a necessidade de tabelamento de preço aventada pelo governo. Essa é a expectativa de Marcelo Noronha, presidente da Abecs, associação que representa as empresas do setor.
Ao transformar automaticamente a linha do rotativo, cuja taxa alcança 475,8% ao ano, em crédito parcelado, com juros de 156%, explicou, o cliente passa a ter um prazo mais elástico para o pagamento do saldo remanescente. Consequentemente, há um menor comprometimento da renda mensal, o que reduz a inadimplência e abre espaço para a convergência para taxas menores. "A redução da taxa se dá por razões técnicas", ressaltou ontem, em teleconferência. "Eu não posso responder pelas taxas de cada banco, mas posso inferir que elas vão cair significativamente para os níveis do parcelado, hoje de um dígito [ao mês]."
Segundo dados do Banco Central, em outubro, a inadimplência da pessoa física atingiu 36,1% no rotativo do cartão de crédito, ante 1% no crédito parcelado. Das concessões totais no cartão de crédito para a pessoa física naquele mês, equivalentes a R$ 91,2 bilhões, o rotativo respondeu por mais de 30% (R$ 27,5 bilhões) e o parcelado, por 2,6% (R$ 2,3 bilhões). A diferença refere-se ao pagamento à vista (67,4% ou R$ 61,4 bilhões).
Noronha reconheceu que os bancos perdem mais do que ganham no curto prazo com a troca do rotativo pelo parcelado. Ele disse, porém, que a medida traz um equilíbrio quando se olha um horizonte maior de tempo. Segundo ele, que ocupa a vice-presidência do Bradesco para área de cartões, a Abecs já vinha discutindo uma alternativa ao rotativo. "Com o BC chegamos a um modelo que não diz respeito a tabelamento de taxas, mas a uma modificação da modalidade para que se possa ofertar condições melhores para o consumidor que usa o rotativo."
Ele ressaltou que o Brasil pode caminhar para o modelo americano ou qualquer outro usado no exterior, mas desde que preserve o equilíbrio do mercado. A taxa alta do rotativo, diz, é resultado do risco e do alto custo do dinheiro no Brasil.
Noronha espera bom senso do governo também em relação à perspectiva de mudanças no prazo de pagamento para os lojistas. "Há uma preocupação legítima, mas é preciso olhar as implicações de sair de 30 para 2 dias", disse, referindo-se à declaração do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, interpretada como uma forma de pressão para a queda dos juros no cartão. "Um cavalo de pau não é apropriado."
Em nota, Roberto Setubal, presidente do Itaú Unibanco, disse que "há espaço para redesenhar o sistema de cartão de crédito, modernizando o setor com práticas internacionais, promovendo um rebalanceamento dos custos dos vários tipos de pagamentos e financiamentos contidos no produto, notadamente o rotativo e os parcelados com e sem juros", afirmou. "As medidas são fundamentais para a redução da taxa do rotativo, que atualmente está muito onerada", mas, pondera, "é importante preservar a facilidade de uso do cartão".
Também na visão de Paulo Rogério Caffarelli, presidente do Banco do Brasil, as medidas vão contribuir efetivamente para a redução dos juros do rotativo do cartão de crédito, a partir do aprimoramento da regulação e dos instrumentos de oferta de crédito. O presidente do Santander, Sergio Rial, em nota, disse que as medidas são positivas porque estimulam a economia e ajudarão os brasileiros que enfrentam dificuldades financeiras.
As mudanças serão detalhadas em norma do BC, mas a Abecs, via autorregulação, já recomendou aos seus associados que ofereçam a modalidade do parcelamento da fatura para todos os clientes. Noronha disse que vários bancos já oferecem a opção hoje, em prazos que chegam a 24 meses, mas é preciso ter a oferta para todos.
Noronha espera que a implementação da medida ocorra em 90 dias, mas disse que é preciso aguardar a norma do BC para que a data se confirme. O Banco Central informou que já está elaborando a proposta para ser encaminhada ao Conselho Monetário Nacional (CMN).