Pedro Garcia
A mudança da correção do saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), aprovada na Câmara e atualmente no Senado, irá aumentar não apenas os custos dos financiamentos habitacionais, mas de obras de infraestrutura e desenvolvimento urbano.
Até o final de junho, o fundo possuía R$ 437,8 bilhões em ativos. Desse total, 50,6% haviam sido destinados para operações de crédito, sendo R$ 185,7 bilhões para financiamentos imobiliários e R$ 26,2 bilhões para obras de infraestrutura e desenvolvimento urbano.
Os gastos com a remuneração desses recursos, que atualmente rendem 3% ao ano mais a Taxa Referencial (TR), por sua vez, foi de R$ 6,79 bilhões, no período. Com a mudança, que propõe que o rendimento passe para 6,17% mais a TR, o fundo passará a pagar mais pelo dinheiro depositado pelos trabalhadores, mas também terá que cobrar mais juros nos financiamentos, para manter a rentabilidade do crédito.
O principal banco que usa recursos do FGTS para empréstimos é a Caixa, que também é o operador do fundo.
Uma estimativa feita pela instituição aponta que, com o aumento da correção, o valor das prestações de um financiamento habitacional de R$ 126 mil, incluindo os juros, pode crescer até 27,3%. No caso de empréstimo de R$ 75 mil, a alta chega a 37,7%.
Ainda de acordo com a Caixa, o valor financiado também cairia - no caso do imóvel de R$ 126 mil, seria 21,4% menor, e no de R$ 75 mil, o valor cairia 27,4%.
"A situação da casa própria deve se agravar. O mercado imobiliário no Brasil vem sofrendo choques sucessivos e mudanças drásticas de cenário. Ele [setor] cresceu a uma taxa rápida e, de repente, foram tirados vários elementos que contribuíam para sua expansão", avaliou o economista e professor de Finanças Ricardo Couto, do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec).
De acordo com ele, os saques recordes da poupança, somados à desaceleração da economia, especialmente do setor de construção civil, e agora a mudança na remuneração do FGTS pesaram na situação. "A tirada desses pilares fez com que o mercado desabasse", concluiu.
No caso do financiamento de obras de infraestrutura, Couto diz ser "significativo". "Essa mudança vai alterar toda a estrutura do mercado, vai alterar toda a cadeia. O crédito mais caro vai remodelar a estrutura de captação das empresas, que terão que buscar novas fontes de recursos, como debêntures", apontou.
Na Caixa - Em seu balanço do primeiro semestre de 2015, divulgado na quinta-feira passada, a Caixa Econômica aponta que os recursos do FGTS são aplicados "em operações de infraestrutura, desenvolvimento urbano e crédito imobiliário".
Segundo a demonstração de resultados, o banco público possuía, até o final do primeiro semestre, R$ 156,4 bilhões emprestados por meio de recursos captados no fundo. Os gastos para remuneração desse dinheiro, por sua vez, foi de R$ 5,5 bilhões, no período.
A título de comparação, a instituição possui R$ 232,1 bilhões captados por meio da poupança (que também pode ser usada para financiamentos imobiliários) e gastou R$ 8,1 bilhões para remunerá-los. As Letras de Crédito Imobiliárias (LCIs), que também fazem funding aos financiamentos, por sua vez, somaram R$ 105,7 bilhões e custaram R$ 5,08 bilhões à instituição.
Como o aumento do rendimento do FGTS vai fazer com que o custo do fundo se equipare ao da poupança, as despesas com a remuneração desses recursos também deve chegar ao montante gasto com as cadernetas.
Custo político - Embora a mudança, se aprovada no Senado, vá deixar mais caro os financiamentos imobiliários e das obras de infraestrutura e desenvolvimento, o dinheiro recolhido mensalmente dos trabalhadores de carteira assinada, por outro lado, vai render mais, o que divide as opiniões sobre o assunto.
Para Couto, do ponto de vista político, a tese da melhora da remuneração é vista com melhores olhos do que o aumento do custo dos financiamentos. "O crédito imobiliário já está mais caro de uma maneira geral, por conta da poupança e do momento econômico. Então, se aumentar mais um pouco, é porque já estava aumentando", analisou.
Já a melhora no rendimento do FGTS pode servir até como uma carta na manga do governo federal para melhorar sua avaliação perante a população, ponderou o especialista.
Medidas - Em nota, a Caixa afirmou que precisa esperar o fim da tramitação do projeto de lei no Congresso "para que o banco, enquanto agente operador do FGTS, possa adotar as medidas necessárias ao atendimento da nova legislação".
"A Caixa reforça ainda que estudos preliminares apontam que o aumento da taxa de juros de remuneração das contas vinculadas [ao Fundo] vai refletir, por consequência, no incremento das taxas de juros dos financiamentos com funding do FGTS, tendo em vista necessidade de se manter o equilíbrio entre as despesas e receitas do fundo", informou.
O balanço do banco mostra que os recursos da poupança, principal funding do crédito imobiliário, estão diminuindo, desde o primeiro trimestre e fecharam junho em R$ 232,1 bilhões, queda de 0,4%.