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29/02/2016

Apesar da crise, saques do FGTS tiveram queda em 2015

O desemprego cresceu mais de dois pontos percentuais em 2015 e o mercado formal perdeu 1,5 milhão de vagas. Apesar desse comportamento negativo do mercado de trabalho, menos trabalhadores sacaram recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

O desemprego cresceu mais de dois pontos percentuais em 2015 e o mercado formal perdeu 1,5 milhão de vagas. Apesar desse comportamento negativo do mercado de trabalho, menos trabalhadores sacaram recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). O número total de saques caiu 3% na comparação com 2014. Já o valor total descontado das contas cresceu 3,7% (já corrigido pela inflação), percentual bem inferior à alta média de 8% dos quatro anos anteriores.

O FGTS foi poupado de saques mais expressivos que o de anos anteriores, porque menos trabalhadores foram demitidos por justa causa em 2015 (em relação a 2014). Além disso, a crise deixou os beneficiários mais inseguros para assumir o compromisso de comprar um imóvel. Os valores sacados para dar entrada na casa própria caíram quase 12% em termos reais (2,7% em valores nominais).

Apesar do fechamento de 1,5 milhão de postos de trabalho formais no ano passado, as empresas demitiram 3,6% menos trabalhadores por justa causa em relação a 2014, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Parte expressiva do ajuste foi feita pela queda em novas admissões. Na modalidade "demissão sem justa causa", ocorreu queda de 5% no número de saques nas contas do FGTS em relação a 2014. O valor sacado por essa razão, contudo, cresceu 8,3% em relação a 2014, descontada a inflação.

Há expressiva diferença entre os dados do Caged para desligamentos sem justa causa e a quantidade de saques no FGTS pela mesma razão. Pelo Caged foram desligados 10,8 milhões sem justa causa (registros no prazo) em 2015. Pela Caixa, passaram de 19 milhões.

A Caixa explica que a discrepância ocorre porque um mesmo trabalhador pode fazer mais de um saque na mesma conta, se o empregador fizer um depósito adicional após o primeiro saque, e também porque um mesmo trabalhador (de setores como educação, saúde e outros) pode ter mais de um vínculo com o mesmo empregador e pode ser demitido dos dois. A Caixa informou que, de acordo com o Ministério do Trabalho e Previdência, considerando os registros fora do prazo, o total de desligamentos sem justa causa sobe para 11,3 milhões em 2015.

"As empresas seguraram as demissões e não criaram novas vagas. Essa dinâmica do mercado de trabalho no ano passado levou a menos saques no FGTS", observa Alexandre Ferraz, economista do Dieese em Brasília e que atua como assessor do movimento sindical no Conselho Curador do FGTS. Além disso, observa, a taxa de desemprego subiu muito pelo corte do emprego informal -nesse caso, os trabalhadores ficam sem FGTS.

"O número absoluto de desligamentos diminuiu e isso ajuda a explicar a queda nos saques porque menos trabalhadores tiveram direito a esse benefício", diz Eduardo Zylberstajn, pesquisador da Fipe-USP. Quando a economia estava aquecida, as pessoas trocavam mais de emprego, e essa rotatividade (em parte por intenção do trabalhador, em parte pelo empregador), aumentava o número de demissões, afirma o pesquisador.

Os dados do Caged mostram que no ano passado aumentou o desligamento de trabalhadores mais escolarizados, com maiores salários e mais tempo de serviço. Isso explica, segundo Zylberstajn, a alta mais expressiva nos valores sacados - o valor médio passou de R$ 2,6 mil para R$ 3,3 mil entre 2014 e 2015. "Os desligamentos avançaram para os trabalhadores mais qualificados." Os desligamentos sempre se concentram nos trabalhadores de menor qualificação, diz, mas em momentos de crise o empregador também faz ajustes de custo nas faixas salariais seguintes. "O desemprego sobe na hierarquia", afirma. Como reflexo, o salário médio de desligamento subiu no ano passado, enquanto o de admissão ficou menor.

Os demitidos sem justa causa com um ano ou mais no emprego passaram de 53% para 56,5% do total desse grupo entre 2014 e 2015. Além disso, em 2015, pela primeira vez em mais de 20 anos, o país fechou postos de trabalho para profissionais com curso superior. Os desligamentos dos profissionais com mais de dez salários mínimos de renda mensal cresceram 14%, enquanto na média dos trabalhadores eles foram menores.

Os dados do FGTS também mostram uma mudança nos saques relacionados à casa própria. Pela primeira vez desde 2009, caiu o número de saques para quitação total ou parcial de casa própria (relacionado momento de aquisição). A retração foi de 2% em quantidade em saques e de cerca de 12% no valor sacado, descontada a inflação. Para Ferraz, do Dieese, a crise gera insegurança em assumir um compromisso longo como um financiamento imobiliário.

Nas outras modalidades relacionadas à casa própria - amortização de saldo devedor, pagamento de prestações e construção da casa própria -, tanto os saques em quantidade como o valor total sacado subiram em 2015 na média dos últimos anos.

Apesar da alta menos expressiva dos saques do FGTS, o saldo caiu no ano passado porque os depósitos subiram menos. A arrecadação passou de R$ 104,7 bilhões em 2014 para 113,5 bilhões em 2015, alta nominal de 8,4% (queda real de cerca de 2%). Como os saques cresceram 14,8% em termos nominais, a arrecadação líquida caiu de R$ 18,4 bilhões em 2014 para R$ 14,4 bilhões no ano passado.

Para Ferraz, a maior parte da piora no saldo anual ocorreu nos últimos meses de 2015. No primeiro semestre, a arrecadação cresceu mais de 10% sobre 2014 durante vários meses. Depois, o ritmo recuou, enquanto os saques ficaram mais intensos no último trimestre. "O mercado de trabalho reage com defasagem ao aumento dos juros e à queda da atividade. Em abril, os efeitos das recentes altas da Selic serão mais intensos", diz.

Apesar desse resultado no fluxo anual, o resultado do FGTS em 2015 será muito bom, diz Ferraz (o balanço ainda não está fechado). O fundo recebeu R$ 19 bilhões do Tesouro por conta das "pedaladas" e possui R$ 130 bilhões aplicados em títulos públicos rendendo taxa Selic. Por isso, avalia, o fundo pode liberar novos recursos para financiamentos sem prejuízo ao patrimônio.

FONTE: VALOR ECONôMICO