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08/08/2023

Após retomada forte, setor de construção deve ter ano morno (Valor Econômico)

Projeções apontam crescimento inferior a 2%, fruto de juros altos, demanda fraca e lentidão do Minha Casa, Minha Vida

Após dois anos de forte avanço, o setor de construção deve encerrar 2023 com a pior performance desde 2020, quando amargou queda de 2,1%. A aposta de instituições consultadas pelo Valor é que o resultado deste ano será positivo, mas bem aquém das altas de 10% de 2021 e de 6,9% em 2022 dentro do PIB brasileiro.

 

Juros elevados, demanda mais fraca e demora na retomada do Minha Casa, Minha Vida são fatores que levam a projeções de crescimento inferiores a 2%, segundo Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Fundação Getulio Vargas (FGV), e Sindicato da Indústria da Construção Civil de Grandes Estruturas dos Estados de São Paulo e de Minas Gerais (SindusCon-SP e SindusCon-MG).

 

A expansão menos intensa do setor está sendo acompanhada de perto pela CBIC, que, no fim do mês passado, revisou para baixo a projeção de elevação da construção para 2023. A estimativa, que no começo do ano estava entre 2% e 3%, passou para 1,5%. “Percebe-se claramente que há uma intensidade menor da atividade do que no ano passado”, disse o presidente da câmara, Renato Correia.

 

Segundo ele, isso se deve a alguns fatores. Um deles são os juros elevados. A Selic influencia os juros cobrados de construtoras e incorporadoras e o custo do financiamento de imóveis. A taxa básica foi cortada na semana passada em 0,5 ponto percentual para 13,25%.

 

Outro aspecto notado por Correia tem a ver com o Minha Casa, Minha Vida, cujas novas regras foram aprovadas pelo Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) no fim de junho e começaram a ser implementadas em julho. Segundo ele, Isso vai levar à aplicação desses recursos do programa no fim do ano ou início do ano que vem. “O Minha Casa, Minha Vida ainda não produziu efeitos no mercado neste ano.”

 

Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção no Instituto Brasileiro de Economia da FGV (FGV Ibre) concorda. Ela citou outro exemplo de menor intensidade de crescimento no ritmo da construção esse ano: o saldo líquido de vagas do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que mede o emprego com carteira assinada. O saldo de vagas para a construção foi positivo em 20.953 em junho. “Mas esse saldo foi 31% inferior ao saldo de junho do ano passado”, disse. Para ela, mesmo mais fraco, o saldo é “robusto”.

 

“Podemos dizer que na construção em junho você pode enxergar o copo meio cheio, ou o copo meio vazio, a depender de como se olha”, comenta.

Mas os fatores que compõem o “copo vazio” da construção devem levar o setor a uma alta de 1,3% em 2023, segundo projeção do FGV Ibre citada por Castelo.

 

Ela ressalta que 2023 tem diferenças significativas em relação a anos anteriores em termos de negócios. “Precisamos lembrar que a construção no Brasil não é somente construtora, incorporadora”, disse. “Temos também aquelas obras formiguinhas, pessoas que reformam suas casas e contratam autônomos para fazê-lo”, ressaltando que a prática, frequente no período mais intenso da pandemia, não é mais tão comum. “Esse grupo está puxando o setor para baixo. Mas o setor formal conseguiu sustentar a alta no ciclo de construção [até junho].”

 

Um desses exemplos no mercado formal foi a construtora Alumbra Empreendimentos Design. Criada em 2021, com sede em Santa Catarina, tem hoje R$ 3 bilhões de Valor Geral de Vendas a lançar nos próximos anos - R$ 530 milhões são para lançamentos nos próximos 24 meses no litoral catarinense. Já o restante será aplicado seguindo o planejamento estratégico da empresa até 2030.

 

Para o CEO da companhia, Alex Sales, o mercado do litoral catarinense pode se aquecer mais, no segundo semestre, com possibilidade de juros menores. No entanto, ele admitiu que o mesmo pode não ocorrer em outras regiões.

No mercado de São Paulo, o setor mostra-se menos aquecido ante igual período do ano passado, segundo Yorki Estefan, presidente do Sinduscon-SP.

 

A construção paulista representa 27,6% da construção brasileira, de acordo com a entidade. “No mercado de São Paulo lançamos 20% a menos empreendimentos de médio padrão ante o ano passado. E temos grande demanda de obras para fazer.”

 

Questionado se o custo para a produção estaria dificultando o ritmo de negócios, ele negou. “O INCC está comportado”, disse, citando o Índice Nacional do Custo da Construção - Mercado (INCC-M). Segundo a FGV, que calcula o indicador, o INCC-M acumula alta de 3,15% em 12 meses até julho, menor taxa acumulada desde fevereiro de 1999 (2,81%). O executivo citou, ainda, a mesma projeção do FGV Ibre de alta de 1,3% para PIB da construção neste ano.

 

Estefan também citou os juros altos como o maior entrave atual. “O cenário animador é uma projeção futura com início do declínio das taxas de juros” disse. “Se esses juros caminharem para um dígito, é o ideal para a construção civil.

 

Ieda Vasconcelos, economista do Sinduscon-MG, também cita juros altos como principal motivo para projeção de alta de 1,5% para o setor este ano. Para ela, não somente o patamar dos juros é muito elevado como também ficou alto por muito tempo. “Creio que a taxa de juros ter ficado elevada por longo período é o principal problema hoje do setor”, afirmou, no evento virtual Desempenho Econômico da Construção, da CBIC

FONTE: VALOR ECONôMICO