Notícias

11/08/2016

Bancos elevam taxas sobre serviços para atenuar queda nos lucros

Nos Estados Unidos, a média de rentabilidade dos bancos privados é de 7,5%, segundo a Economática.

São Paulo - Cobrar tarifas mais caras dos correntistas e elevar continuamente os juros do crédito, mesmo com a Selic estacionada em 14,25% há mais de um ano, tem sido a estratégia dos grandes bancos para atenuar a queda nos lucros e na rentabilidade em meio ao aprofundamento da recessão. Nos seis primeiros meses do ano, somente os três maiores bancos privados do país — Itaú Unibanco, Bradesco e Santander — aumentaram em R$ 3,6 bilhões suas receitas com tarifas e serviços em relação ao mesmo período de 2015, um salto de quase 9%.

O Bradesco, por exemplo, que havia faturado R$ 11,86 bilhões com tarifas na primeira metade do ano passado, viu essas receitas alcançarem R$ 13,12 bilhões este ano, um incremento de 10,7%. Já as receitas com tarifas e serviços do Santander, no mesmo período, cresceram 11,96%, a R$ 7,98 bilhões.

De acordo com dados compilados pelo Banco Central (BC), as tarifas máximas praticadas pelos bancos privados subiram bem acima da inflação nos 12 meses encerrados em junho: a emissão de talões de cheques com dez folhas, por exemplo, saltou de R$ 16 em junho de 2015 para R$ 25 este ano, uma alta de 56%. Já a tarifa dos chamados pacotes padronizados mais caros subiu de R$ 336 para R$ 460, aumento de 36% na mesma comparação. E a transferência eletrônica (TED), cuja tarifa mais cara era de R$ 150 há um ano, estava em R$ 200 em junho último, um salto de 33%, segundo os dados do BC.

E essa alta não é de hoje. Pesquisa do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) mostrou que, nos 12 meses encerrados em junho de 2015, os custos dos serviços bancários avulsos, não incluídos nos pacotes padronizados dos bancos, haviam subido 136%.

Além do encolhimento nas operações de crédito, os resultados dos grandes bancos vêm sendo afetados pelos pedidos de recuperação judicial de grandes empresas, já que as instituições financeiras têm de elevar suas provisões contra perdas. Por isso, nas novas operações de crédito, ou no refinanciamento de operações antigas, os bancos vêm cobrando taxas maiores, com o objetivo de aumentar suas margens financeiras.

Levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), que será divulgado esta semana, mostra que os juros ao consumidor voltaram a aumentar em julho pelo 22º mês consecutivo, mesmo com a taxa básica de juros (Selic) estável desde julho do ano passado.

Dados do BC também comprovam o aumento dos spreads — a diferença entre o juro que o banco paga na captação do dinheiro e o que cobra ao emprestá-lo aos clientes. O spread médio subiu 3,2 pontos percentuais nos empréstimos às empresas (pessoas jurídicas) e 13,4 pontos percentuais aos correntistas (pessoas físicas), no período de 12 meses até junho.

— O spread e as tarifas são as ferramentas usadas pelos bancos para compensar as perdas expressivas geradas pela difícil situação econômica do país — observa Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor executivo da Anefac.

Os números divulgados nas últimas duas semanas pelos grandes bancos privados (o Banco do Brasil informa seu balanço hoje) deixam claro o impacto da recessão nos seus resultados. O Itaú Unibanco, maior instituição privada do país, viu seu lucro cair 8,7%, para R$ 10,7 bilhões, nos seis primeiros meses do ano em relação a igual período de 2015. No Bradesco, o tombo foi um pouco menor: 5,3%, para R$ 8,3 bilhões. Já no Santander, o recuo foi de 43,9%, para R$ 2,6 bilhões — no primeiro semestre do ano passado, o banco espanhol contabilizou receitas extraordinárias com a reversão de provisões fiscais relativas à Cofins, o que elevou seus ganhos no período.

Procurado, o Itaú informou que foi o “foco estratégico em produtos com menor inadimplência e nas receitas de serviços e seguros, além da disciplina em custos”, que permitiu um resultado “compatível com a realidade” e “acima do que era esperado pelo mercado”.

Angel Santodomingo Martel, vice-presidente do Santander, diz que a alta das receitas com serviços ocorreu não pela elevação das tarifas aos clientes, mas pela maior oferta de serviços e adesão a novos produtos.

— Nossa estratégia tem sido ficar bem perto dos clientes, e isso é bom para os dois lados. Os clientes estão afetados pela crise, e nós temos os produtos para ajudá-los. E não é uma ajuda de graça — afirma Martel, acrescentando que o banco também ampliou sua base de clientes, outro impulso para as receitas.

Sobre a elevação do spread, ele diz que sempre que a economia está em retração, o spread sobe, devido ao maior risco em emprestar. O Bradesco não quis comentar o assunto. Mas, na divulgação de seu balanço, o banco informou ao mercado que está focado no crescimento da receita com serviços (o que inclui as tarifas e o custo do crédito) para manter os seus resultados.

Rentabilidade se mantém alta - Sobre os estragos dos processos de recuperação judicial nos resultados dos grandes bancos privados, os analistas destacam que os processos envolvendo a Oi e a Sete Brasil foram os que mais pesaram. Somente Bradesco e Itaú tinham uma exposição de quase R$ 5 bilhões à Oi. As instituições, porém, não comentam tais dados.

João Augusto Salles, analista de bancos da Lopes Filho Consultores, observa, entretanto, que as provisões para essas operações só se transformarão em prejuízo efetivo se as empresas não conseguirem se reerguer. Caso isso aconteça, a provisão pode se transformar em ganho.

Salles confirma, porém, que elevar as tarifas tem sido uma estratégia recorrente dos bancos. Segundo ele, os aumentos de tarifas se dão em “movimento conjunto”, o que inviabiliza ao cliente procurar uma instituição que cobre menos:

— Os bancos conseguiram contornar bem a situação difícil da economia, ajustando as carteiras de crédito, o que significa elevar seu spread, e aumentando as tarifas. Dessa forma, mantiveram uma retorno sobre o patrimônio altíssimo.

Apesar disso, a rentabilidade do setor, que ainda é altíssima no Brasil, tem cedido. O retorno sobre o patrimônio líquido (ROE, na sigla em inglês) do Itaú, por exemplo, caiu de 23,3% em junho de 2015 para 19,4% este ano. O do Bradesco recuou de 20% para 17,1%, e o do Santander, de 14,8% para 8,6%. Nos Estados Unidos, a média de rentabilidade dos bancos privados é de 7,5%, segundo a Economática.

Para Erivelto Rodrigues, presidente da Austin Rating, a capacidade de driblar os problemas e manter bons níveis de rentabilidade e lucro mostram a solidez do setor financeiro nacional:

— Eles conseguiram segurar os efeitos da crise até agora. E, se você comparar os resultados obtidos pelos bancos com os de outros setores da economia, eles seguem como os mais fortes. 

FONTE: O GLOBO