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16/11/2015

BM&FBovespa; oferece R$ 10,2 bi pela Cetip

O valor está pouco acima dos R$ 38,06 do fechamento de sexta-feira, mas representa prêmio de 15,5% ante o valor de mercado da Cetip em 30 de outubro, antes da divulgação do primeiro fato relevante que tratou do tema.

Ana Paula Ragazzi e Fernando Torres

Depois de se recusar, na manhã de sexta-feira, a comentar detalhes de suas negociações com a Cetip para combinação de negócios, a BM&FBovespa anunciou na noite do mesmo dia um novo fato relevante, no qual finalmente colocou um preço para a transação. A empresa comandada por Edemir Pinto está disposta a pagar R$ 10,25 bilhões pela Cetip, ou R$ 39,00 por ação.

O valor está pouco acima dos R$ 38,06 do fechamento de sexta-feira, mas representa prêmio de 15,5% ante o valor de mercado da Cetip em 30 de outubro, antes da divulgação do primeiro fato relevante que tratou do tema.

Ainda segundo a bolsa, a proposta tornada pública ainda é não-vinculante e depende do andamento das negociações e de aprovações regulatórias.

Caso seja aceita pela concorrente, o plano da BM&FBovespa é pagar no mínimo 50% desse montante em dinheiro e no máximo 50% em ações - nesta hipótese extrema, os atuais acionistas da Cetip ficariam com quase 20% do capital social da empresa combinada.

O Valor apurou, contudo, que a negociação para fusão enfrenta resistência de administradores e acionistas da Cetip. Um ponto principal da conversa refere-se à governança e gestão que, na Cetip, seria mais bem avaliada, do ponto de vista de seus acionistas, do que a da BM&FBovespa.

De acordo com fontes, o fato de, depois de ambas terem confirmado conversas para uma associação no início do mês, a BM&FBovespa ter divulgado sua proposta, sem que a Cetip se manifestasse também (até a tarde de ontem não houve nenhum comunicado), é um sinal de que as conversas não estão evoluindo bem. Além disso, como dito, a proposta não é vinculante.

"Desde o anúncio, os papéis de ambas estão sendo alvo de especulação. Ao lançar a oferta, a BM&FBovespa também colocou um preço para a Cetip, o que vai evitar que as ações da empresa continuem a subir, encarecendo a negociação para ela", afirmou Adeodato Netto, sócio da Eleven Financial Research, casa de análise independente.

Ao tornar o preço que está disposta a pagar público, a bolsa também chama mais acionistas da Cetip para a negociação - e não apenas seus conselheiros e executivos -, em estratégia semelhante à usada recentemente pela AB Inbev para conseguir fechar a compra da SABMiller.

Olhando para múltiplos, a Cetip é "mais cara" que a BM&FBovespa - enquanto a primeira é negociada por 20 vezes o lucro ou mais de 13 vezes o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda), a bolsa tem múltiplos próximos 8 e 3,5 vezes, respectivamente.

O especialista da Eleven classifica a proposta da bolsa como um "achaque", mas avalia que não pode ser classificada como uma oferta hostil, uma vez que inclui pagamento metade em dinheiro, mas também metade em ações ordinárias. Agora, ele observa, a Cetip tem um preço, o que, em tese, também poderia suscitar ofertas de outras bolsas, se desejarem entrar no segmento no Brasil. De qualquer forma, na avaliação de Netto, a proposta coloca pressão para uma decisão sobre o negócio pela Cetip.

Outra questão que surgiu nas negociações é uma preocupação com eventuais acionistas relevantes que a empresa resultante da fusão poderá ter, se for confirmada a operação via ações. Há acionistas comuns a ambas, mas há também aqueles que estão em apenas numa delas. Existe ainda um temor de que os acionistas da Cetip, que já sinalizavam questões contra a associação, possam vender as ações assim que as receberem, afetando negativamente suas cotações. Por conta disso, apurou o Valor, as negociações incluem a possibilidade de haver um período de restrição à venda (lock up) para os atuais acionistas. Ambas não têm controlador definido, mas a BM&FBovespa  possui mais acionistas relevantes: Oppenheimer (7,37%)? Vontobel (7,16%)? Capital World (6,23%)? BlackRock (5,09%) e Capital Group (5,03%). Na Cetip, os relevantes são a ICE Overseas (12%) e a BlackRock (5,01%).

Para os investidores da Cetip, as duas bolsas possuem modelos de gestão diferentes, daí a resistência. A Cetip possui hoje 11 conselheiros, nove diretorias e mais seis comitês que assessoram o conselho, incluindo um comitê de indicação de conselheiros independentes. A BM&FBovespa tem 11 conselheiros, cinco diretorias e cinco comitês. Além disso, há mais nove comitês criados para assessorar o diretor-presidente Edemir Pinto, um nome muito forte no comando bolsa.

Netto avalia que o negócio hoje parece interessar mais à BM&FBovespa, que fez muitos investimentos na parte tecnológica e tem hoje capacidade ociosa. "Daqui a pouco os acionistas vão começar a cobrar a empresa por isso, diante da fase ruim dos mercados. A associação com a Cetip traria ganhos nesse sentido, pois poderia estimular novos negócios", diz. Ele destaca ainda que, no terceiro trimestre, a BM&FBovespa registrou uma perda relevante no segmento bolsa, que tem a ver com a negociações de ações no pregão e deveria lhe trazer receitas mais estáveis.

De julho a setembro, as receitas da parte Bovespa caíram 15,8% para R$ 221,9 milhões na parte de negociação, compensação e liquidação em relação ao mesmo intervalo de 2014. Na mesma comparação, no segundo trimestre, essas receitas haviam subido 8,3% e ficado estáveis de janeiro a março. Netto destaca declarações do diretor-presidente da bolsa, Edemir Pinto, de que seria "loucura" uma empresa abrir capital nas atuais condições do mercado, pois venderia ações na "bacia das almas". "Ele próprio acabou atestando a fragilidade do segmento, em vez de apontar tentativas para melhorá-lo", avalia. O resultado da bolsa foi puxado no trimestre passado por um crescimento bastante expressivo no segmento BM&F, que alcançou R$ 306,8 milhões, com alta de 34,2%.

Além do aspecto operacional, investidores também tem considerado os possíveis benefícios fiscais que uma fusão entre as duas empresas pode gerar, como consequência da amortização do ágio gerado na transação. 

 

FONTE: VALOR ECONôMICO