O presidente da China, Xi Jinping, tende a conseguir o que quer. Mas há um grupo em particular que nem ele consegue controlar. Os irados mutuários chineses estão furiosos com as incorporadoras em dificuldades. Os bancos locais provavelmente terão de arcar com a conta para manter as políticas de Xi intactas
A repressão de Pequim em seu endividado mercado imobiliário não foi desencorajada por uma série de calotes de incorporadoras e por quase uma centena de bilhões de dólares de valor perdido pelos bônus de alto risco das companhias imobiliárias chinesas. Mas os protestos da classe média chinesa poderão frustrar os esforços do governo.
O problema das incorporadoras chinesas é que os protesto são acompanhadas por crescentes boicotes aos pagamentos do crédito imobiliário em quase 100 cidades. O primeiro grupo de mutuários afetados é o dos que já pagaram estimados 2 trilhões de yuans (US$ 296 bilhões) por imóveis residenciais que as incorporadoras deixaram de entregar devido a problemas financeiros. A queda dos preços dos imóveis leva a deduzir que a fúria, e os boicotes, poderão se espalhar em breve para mutuários que arcam com elevadas prestações por casas que perderam o valor.
Xi está a alguns meses de garantir um histórico terceiro mandato à frente do país. Enfrentar a insatisfação social é crucial. A agitação entre mutuários comuns pode ameaçar os alicerces de sua investida pela “prosperidade coletiva”.
Os bancos locais, portanto, serão mobilizados para preencher os rombos financeiros. Esse setor, que já enfrenta um aumento no saldo da dívida podre (de difícil recuperação), provavelmente terá de absorver os prejuízos decorrentes do boicote ao pagamento do crédito imobiliário.
Mas os aproximadamente quatro mil bancos locais chineses já sofreram uma corrida de saques dos depósitos nos últimos doze meses devido aos efeitos da má situação do mercado imobiliário. Esses bancos não dispõem de recursos suficientes para gerir essas novas perdas.
Historicamente, os maiores bancos estatais locais, como o Industrial and Commercial Bank of China (ICBC), concederam socorro financeiro a bancos de menor porte, muitas vezes por meio da compra de participações nos bancos locais. Isso pode não acontecer desta vez. As ações dos maiores bancos, entre as quais as do ICBC, do Agricultural Bank of China e do China Construction Bank, caíram neste ano. Estão sendo negociadas a apenas um terço de seu valor contábil, menos de metade da cotação dos papéis de seus pares regionais, como o HSBC.
Os bancos locais sofrem de uma pesada exposição e precisam de ajuda. Conjuntamente, têm estimados US$ 6,8 trilhões em empréstimos imobiliários. Isso equivale a cerca de 33% do total dos empréstimos no caso dos maiores bancos. Trata-se de uma tendência que pode marcar um mau começo para o terceiro mandato de Xi.
Matéria publicada em 20/07/2022