Por Ana Luiza Tieghi e Paula Martini
Perto de completar cinco anos do início da pandemia de Covid-19, o setor de prédios corporativos sente que voltou ao que era antes da doença. O tipo de ocupação feito pelas empresas, porém, mudou.
A taxa de vacância dos prédios corporativos de alto padrão terminou 2024 em 20,9% em São Paulo e em 31% no Rio, de acordo com a consultoria JLL, ante 20,8% e 40,9% em 2019. A absorção líquida, medida que subtrai as devoluções do que foi locado no período, atingiu 295 mil m2 na capital paulista, mais do que o dobro de 2019. O preço pedido pelo metro quadrado subiu de R$ 84 para R$ 104.
Foram anos difíceis até chegar nesses resultados. A partir de março de 2020, quando as companhias que não faziam atividades essenciais liberaram o trabalho de casa, “o mercado de escritórios foi colocado em xeque”, lembra Yara Matsuyama, diretora da divisão de escritórios da JLL. Mais ainda porque o novo modelo deu certo. A produtividade não foi afetada - em alguns casos, até cresceu.
Para Felipe Giuliano, diretor de locação da consultoria CBRE, isso também se deve ao fato de que não era um home office qualquer. “Ninguém podia fazer nada, só comer, trabalhar e ver TV”, diz. Depois das vacinas, as distrações voltaram junto com a possível vida “normal”, e muitas companhias logo pediram o retorno ao escritório, o que tem sido outro desafio.
“Todo mundo passou por home office, então se o escritório não for tão confortável quanto a sua casa, é difícil trazer o funcionário de volta”, afirma Renato Almeida, gerente de transações imobiliárias da consultoria Cushman & Wakefield. Em edifícios corporativos de alto padrão, companhias tentam adaptar suas áreas para promover mais interação entre os funcionários, o que faltava no modelo remoto, e dedicar mais espaço para cada um.
O mercado de escritórios foi colocado em xeque (na pandemia)”
— Yara Matsuyama
Quando se imaginava que o home office duraria para sempre, houve empresas que decidiram criar sedes fora dos grandes centros, imitando movimento do mercado residencial, que viu uma explosão do preço de lotes em condomínios de luxo no interior.
O caso mais emblemático, segundo as consultorias, é o da XP, que comprou por R$ 99 milhões um terreno da JHSF para fazer sua sede rural em São Roque (a 60 km de São Paulo), e devolveu os andares que ocupava no edifício São Paulo Corporate Towers, na Vila Olímpia. Depois, alugou-os de novo. Em novembro do ano passado, a JHSF comprou o terreno de volta. “Foi um grande erro”, afirma Almeida. “A vida do indivíduo não é só trabalho, ele quer morar perto, mas estar bem localizado”.
Na quarta-feira (15), o Pipeline informou que a XP vai mover parte da equipe para um edifício na Chácara Santo Antônio. A empresa foi procurada pelo Valor, mas não participou da reportagem.
Algumas regiões sofreram mais do que outras. Em São Paulo, a Faria Lima se recuperou rapidamente, por ser a mais valorizada. O edifício Birman 32, por exemplo, foi entregue em 2020 e todo locado em um ano, lembra Giuliano. Já outras áreas, que tinham um grande volume de novos prédios para serem entregues, como a Berrini e a Chucri Zaidan, amargaram vacâncias altas. “Os investidores fizeram uma série de concessões para atrair ocupantes”, afirma Almeida.
São áreas que seguem em recuperação. Enquanto na Faria Lima a vacância ficou em 5,8% em 2024, é de 21,2% na Chucri Zaidan e de 48,4% na Chácara Santo Antônio, segundo a JLL. A expectativa das consultorias é que a ocupação cresça, porque é nessas áreas que há prédios grandes disponíveis para novas locações.
O mercado de escritórios do Rio já vinha com problemas desde antes da pandemia - a vacância, que ainda é alta, praticamente só caiu de 2019 para cá. Mais dependente de empresas de óleo e gás, de telecomunicações e públicas, a capital fluminense passou por um esvaziamento do seu centro, o que exigiu até medidas da prefeitura.
Foi criado o programa Reviver Centro, que dá incentivos para o retrofit (reforma) de prédios antigos, a maior parte de escritórios e salas comerciais, com conversão para o uso residencial, além da construção de novas habitações. Entre os beneficiados está o edifício A Noite, na Praça Mauá.
De acordo com Osmar Lima, secretário municipal de desenvolvimento econômico, a prefeitura concedeu, desde 2021, 42 licenças para empreendimentos no centro, sendo 33 para retrofit e nove para novos prédios. Os projetos vão resultar em 4.062 moradias. “Não tenho a menor dúvida de que nos próximos três ou quatro anos vamos ver uma transformação na dinâmica da região”, diz o secretário.
A imobiliária Sérgio Castro Imóveis, que administra mais de seis mil imóveis comerciais no Rio, destaca que 2024 foi um ano de franca valorização da zona sul, especialmente do Leblon e de Ipanema. A CBRE prevê que novos prédios de alto padrão devem chegar nessa área nos próximos três anos.
“O esvaziamento logo antes da pandemia foi do centro para Botafogo e, agora, a ocupação está no movimento contrário”, afirma o diretor Cláudio André de Castro. Ele observa que ficou mais caro manter uma grande empresa no Leblon ou em Ipanema, o que levou companhias a dividirem as operações entre a zona sul e o centro. A mesma dinâmica tem ocorrido na Faria Lima, em São Paulo, com “backoffices” em zonas consideradas secundárias, como Chácara Santo Antônio e Alphaville.
Historicamente residencial, o Leblon passou a ser chamado de “Faria Lima carioca” pela concentração de prédios empresariais de alto padrão que receberam escritórios de advocacia e gestoras. Os empresários são atraídos pela oferta de serviços, a sensação de segurança e a proximidade de casa. A vacância no Leblon e em Ipanema é de apenas 10%, segundo a Sérgio Castro, o que contribui para a alta nos preços - enquanto o metro quadrado de um escritório no Leblon pode chegar a R$ 300, no centro há opções por R$ 40.
A área mais nova da região central do Rio tem vacância de 21%, segundo a Sérgio Castro. É onde ficam os prédios da Petrobras e do BNDES. “Os prédios modernos estão com um valor de aluguel que é metade do que foi projetado para eles”, diz Castro. Já no centro histórico, com construções mais antigas, a vacância sobe para até 65%, ante 40% em 2019.
Para Giuliano, da CBRE, 2025 deve ser um ano melhor para o Rio, já que as empresas públicas devem reforçar o trabalho presencial. “A Petrobras já avisou que acabou a reforma do Edise [sua sede]”, afirma. O prédio estava em reforma desde 2021. A estatal também irá ampliar o trabalho presencial de dois para três dias, a partir de abril. Hoje, são apenas dois dias por semana. Procurada, a Petrobras não participou da reportagem.