As elevações da Selic já interromperam os cortes nos juros de algumas linhas de crédito imobiliário e aumentarão as taxas cobradas em outras linhas do setor, segundo o presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães. Mas, ainda que o cenário econômico tenha se tornado mais turbulento, a situação do banco é tão confortável que há espaço para aumentar os dividendos pagos ao Tesouro Nacional, afirmou o executivo em entrevista ao Valor.
Em setembro, ao anunciar redução nos juros do crédito imobiliário com taxa atrelada à poupança, o presidente da Caixa afirmou que aquela era uma “primeira calibrada”. Agora o cenário é diferente. “A partir do momento em que a pressão inflacionária continuou, [novos cortes] não têm viabilidade”, diz.
O cálculo é feito com base nas regras de remuneração da poupança: com a Selic em até 8,5% ao ano, o rendimento desses recursos fica em 70% da taxa básica de juros mais a taxa referencial (TR). Quando supera os 8,5% anuais, o rendimento equivale a 6,17% ao ano mais a variação da TR.
Guimarães destaca que as linhas de crédito imobiliário atrelado à poupança ou ao Índice de preços ao Consumidor Amplo (IPCA) só “são atrativas” quando a Selic está abaixo de 5% ao ano. Nas ocasiões em que a taxa básica de juros está entre 5% e 6% ao ano, a atratividade é “neutra”. Por fim, quando a Selic supera os 6% anuais, o crédito mais atrativo é aquele cujas parcelas são corrigidas pela TR, modalidade que ficou conhecida como “TR mais”.
Atualmente, a taxa básica de juros está em 7,75% ao ano, mas o Comitê de Política Monetária (Copom) já sinalizou nova alta de 1,5 ponto percentual para a reunião de dezembro. Além disso, afirmou que considera “ser apropriado que o ciclo de aperto monetário avance ainda mais no território contracionista”. Ou seja: continuará elevando a Selic.
Assim, está em curso uma “mudança na composição” do crédito imobiliário, com o mercado “voltando ao funding de ‘TR mais’”, segundo Guimarães. Mas ele chama a atenção para o fato de curvas longas de juros dessa modalidade estarem “mais altas”, o que exerce “uma pressão” e fará com que a Caixa também eleve as taxas que cobra na linha. “Vamos seguir o mercado, com tranquilidade”, afirma.
Essa conjuntura ainda favorece a linha de crédito imobiliário com taxa de juros prefixados, lançada em fevereiro do ano passado. “É a melhor de todas, como estamos vendo neste momento, mas teve baixíssima adesão”, diz o presidente da Caixa.
Mesmo com o cenário fiscal cada vez mais turbulento, com impactos sobre inflação, taxas de juros e atividade econômica, Guimarães mantém o discurso otimista para o desempenho da economia em 2022. Segundo ele, tanto os modelos econômicos da Caixa quanto as demandas da instituição financeira apontam para alta de “pelo menos” 2% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano que vem.
O presidente do banco também chama a atenção, por exemplo, para o avanço do mercado de capitais, leilões de infraestrutura já realizados e outros que estão por vir, como o do 5G. Nesse caso, cita números semelhantes aos destacados com frequência pelo ministro da Economia, Paulo Guedes: há R$ 550 bilhões em investimentos contratados para o país (que serão em parte financiados pela Caixa) e R$ 125 bilhões em outorgas.
“Existe de fato uma confiança no que está sendo feito”, diz Guimarães. Além disso, segundo ele, as mudanças propostas pelo governo federal no teto de gastos representam “uma medida pontual” e “a situação fiscal é extremamente sólida”. “A política econômica mantém total respeito ao teto”, afirma.
A conjuntura econômica favorável projetada pelo presidente do banco é um dos fatores que o fazem não enxergar riscos de aumento da inadimplência. Outros são a carteira de crédito com 91% de garantia real ou do Tesouro Nacional; e medidas adotadas pela Caixa durante a pandemia, que deram fôlego financeiro aos clientes, como o adiamento de parcelas e descontos para alguns débitos.
“O mercado tem momentos de estresse. Mas, se eu fizer política de crédito imobiliário seguindo estresse de mercado, não consigo, porque tenho uma política de longo prazo”, diz Guimarães.
Outro ponto destacado pelo presidente da Caixa é que a instituição financeira “nunca esteve tão bem avaliada” pelos órgãos de controle quanto agora. Ele cita o ranking de governança e gestão pública divulgado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), no qual o banco é a terceira empresa estatal, entre 378, com a maior nota. “As duas primeiras são pequenas”, afirma.
Essa melhora também se reflete, entre outros fatores, em um Índice de Basileia superior a 20%. De maneira simplificada, quanto maior o indicador, mais sólida é considerada a instituição financeira. No Brasil, a exigência mínima para o índice é 11%.
A Caixa “nunca esteve tão líquida e tão sólida”, acumulando “mais de R$ 200 bilhões de excesso de liquidez”, destaca Guimarães. Por isso, a instituição financeira pode, caso seja solicitada, ajudar a reforçar os cofres do governo federal. “Tenho espaço sim para pagar dividendos, mas isso é uma demanda [que depende] do Tesouro Nacional, a ser aprovada pelo conselho de administração”, afirma.
Bastante próximo do presidente Jair Bolsonaro, o presidente da Caixa negou, na entrevista, que tenha pretensões eleitorais. “Não vou concorrer a nenhum cargo.”