Notícias

15/09/2016

Como a reforma da previdência pode afetar nossa poupança

m 2040, esta proporção será de quatro para um e este envelhecimento, apesar de natural, traz grandes desafios para a sociedade pela sua celeridade.

Ainda que o Brasil seja uma nação relativamente jovem, com idade mediana de cerca de 31 anos, a preocupação com o tema previdenciário não deve ser entendida como um excesso de zelo. Com o atual patamar de endividamento público na casa dos 70% do PIB e em trajetória crescente, essa discussão ganha urgência.

Adicionalmente, nossas projeções demográficas são ainda mais preocupantes.

Segundo dados da ONU, o Brasil terá uma transição demográfica bem mais acelerada que a vivenciada em países que já possuem uma população mais idosa. O que se deu na média em 65 anos em uma amostra abrangente de países, aqui se dará em apenas 20 a 25 anos. Hoje, temos um indivíduo idoso para cada dez em idade potencialmente ativa. Em 2040, esta proporção será de quatro para um e este envelhecimento, apesar de natural, traz grandes desafios para a sociedade pela sua celeridade.

Atualmente, o Brasil ainda se encontra em um momento do ciclo no qual a estrutura demográfica contribui positivamente para a economia, com mais pessoas entrando na força de trabalho do que saindo todos os anos. Em outras palavras, ainda está presente o chamado bônus demográfico. A má notícia é que essa situação se inverterá em breve.

Assim, mais do que nunca se faz necessária uma reflexão acerca das características do nosso sistema de Previdência Social que, para padrões internacionais, encontra-se em uma situação relativamente incomum: somos uma sociedade jovem e de renda média, mas dedicamos à seguridade social um pedaço tão grande de nosso orçamento quanto países envelhecidos e ricos.

Essa situação reflete a existência de regras relativamente generosas de acesso ao sistema, pois, apesar do contínuo aumento da expectativa de vida, os brasileiros continuam se aposentando cedo. Além disso, ainda contamos com o piso do benefício atrelado a um salário mínimo que tem uma regra de crescimento real e gera uma crescente necessidade de financiamento. Logo, sem uma reforma nas leis que regem a seguridade social, a atual tendência de aumento de gastos se agravaria, passando dos já elevados 40% do orçamento federal para valores ainda mais altos e deixando cada vez menos espaço para os gastos públicos com educação, saúde ou investimentos.

Entre as mudanças que podem contornar esta tendência, temos a adoção da idade mínima para aposentadoria e a equalização das regras de acesso aos benefícios, que hoje fazem distinção entre homens e mulheres, trabalhadores urbanos e rurais, servidores públicos ou privados, entre outros. Não menos importante, seria a desvinculação do piso da previdência em relação ao salário mínimo. A escolha entre uma reforma mais abrangente ou com regras mais brandas poderá ser o contraste entre resultados alinhados com a nossa estrutura demográfica, ou com o contínuo crescimento da dívida pública.

Não é exagero afirmar que a ausência de uma reforma previdenciária já contribui para o atual desarranjo da economia brasileira e seu elevado patamar de juros básicos, sendo importante ressaltar que mesmo uma reforma dura pode ter efeitos inócuos no curto e médio prazo caso sejam estabelecidas regras de transição demasiadamente benevolentes.

Desta forma, podemos concluir que esta pauta veio para ficar e que a alteração nas regras atuais será inexorável, dada a dinâmica fiscal e demográfica brasileira. Logo, a geração que vai se aposentar daqui a uma ou duas décadas deveria se preparar desde já para um regime previdenciário menos generoso que o que vigorou até então.

Adicionalmente, caso tal reforma vá adiante e traga a melhora nas contas públicas, podemos esperar uma queda sustentável nas de taxas de juros reais, quando comparadas às atuais. Isto reforça a urgência de uma reprogramação dos indivíduos em relação a suas aposentadorias, aumentando já suas taxas de poupança e, não menos importante, aproveitando os ainda elevadíssimos juros reais negociados nos títulos públicos.

Por último, não é demais lembrar que, caso a sociedade opte por protelar ainda mais tal discussão, a consequência provável será um aumento do desarranjo fiscal, que deve levar a maior desorganização econômica, elevação da inflação e diminuição do nosso crescimento potencial. Nesta hipótese, apesar da esperada volatilidade nos títulos públicos indexados à inflação, provavelmente estes ainda serão interessantes por proteger o investidor da aceleração da carestia.


*Rodrigo Noel é especialista em portfólio da Itaú Asset Management

Mirela Sampaio é economista da Itaú Asset Management  

FONTE: VALOR