O gerente de tecnologia, Marcos Vinicius, de 40 anos, investiu R$ 60 mil na reforma de sua casa em São Bernardo do Campo. Trocou o piso da residência, cobriu parte da garagem e ampliou a área de lazer.
— Comprei a casa quatro anos atrás. Só agora consegui reformar. E, mesmo assim, parcelei parte dos gastos no cartão de crédito.
Obras como a de Marcos Vinícius estão ganhando espaço em diversos lares do país, o que tem se refletido nos indicadores de desempenho da construção civil, setor fundamental na geração de empregos. Depois de amargar queda de 30% na capacidade de geração de riqueza entre os anos de 2014 e 2018, o setor abre 2020 com uma boa perspectiva.
A construção civil deve crescer 3% este ano, o que representa um potencial para criação de 150 mil postos de trabalho formais até dezembro, explica o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, superando a marca de 2019, que deve ficar próxima aos cem mil postos de trabalho, com avanço de 2%.
— Esse número de vagas pode até crescer mais, caso o mercado imobiliário continue surpreendendo com os lançamentos.
Segundo Ana Maria Castelo, coordenadora de Estudos da Construção da Fundação Getulio Vargas (FGV), o crescimento mais forte esperado para o setor em 2020 é reflexo da expectativa positiva em relação ao desempenho da economia brasileira, que inicia o ano com aumento da confiança dos consumidores e dos empresários, juros baixos e inflação sob controle. — Há expectativa de melhora na economia de modo geral, o que tende a elevar os investimentos. E as expectativas para a construção refletem esse cenário — afirmou Ana Maria.
O vice-presidente de Economia do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP), Eduardo Zaidan, avalia que esse trabalho de “formiga” das pessoas que reformam suas casas ou fazem autoconstrução está dando novo gás ao segmento.
— A recuperação está começando pelo setor informal — observa. O varejo da construção conta com cerca de 140 mil lojas em todo o Brasil e movimenta mais de R$ 100 bilhões por ano.
São Paulo costuma ser o motor de recuperação do setor imobiliário. Mas um levantamento da consultoria Tendências mostrou que a retomada dos lançamentos está acontecendo também em outras capitais, especialmente de empreendimentos residenciais.
No Rio de Janeiro, por exemplo, o número de lançamentos cresceu 30,6% entre janeiro e setembro do ano passado, segundo o Índice de Atividade da Construção Imobiliária (IACI-L). Em São Paulo, no mesmo período, o índice teve expansão de 22,8%.
— O índice cresce menos em São Paulo porque o movimento de retomada de lançamentos começou antes do que nas demais capitais — explica Matheus Ferreira, analista da Tendências, que acompanha o setor.
O presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz França, avalia que, depois de fechar 2019 com a construção de 580 mil novas moradias, as construtoras estão preparadas para entregar 1 milhão de unidades em 2020.
— Hoje, o juro do financiamento está em um dígito, o problema dos distratos foi resolvido por lei e a confiança do consumidor está melhorando. Essas condições são um gatilho de crescimento do mercado em qualquer lugar do mundo — afirma França.
Juro para financiamento
Dados de 20 incorporadoras filiadas a Abrainc mostram um avanço de 9,4% nas vendas líquidas de imóveis novos de janeiro até agosto do ano passado.
Para Cristiane Portella, presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), outro fator estimula o setor é a maior competição entre os bancos para oferecer taxas de juros competitivas para o financiamento imobiliário. A Caixa Econômica Federal, por exemplo, reduziu a taxa a 6,5% ao ano para quem tem conta no banco ou recebe salário na instituição. Outros bancos seguiram a tendência de redução dos juros.
No caso das grandes obras de infraestrutura, o ritmo ainda é modesto. José Carlos Martins, da CBIC, vê chances de acontecerem licitações de maior porte em 2020, mas as obras só devem começar em 2021.
Outro ponto de interrogação para o setor é o programa Minha Casa Minha Vida, que ainda está indefinido, especialmente para a chamada faixa 1, de famílias que ganham até R$ 1,8 mil e recebem os maiores subsídios. Como o governo está com os cofres esvaziados, a questão é de onde virão os recursos para o programa, que terá novo nome e regras a partir de 2020.
Procurado, o Ministério do Desenvolvimento Regional não informou detalhes do novo Minha Casa Minha Vida. Mas o GLOBO mostrou que o novo modelo funcionará com um sistema de voucher (um vale que assegura um crédito), em que as famílias receberão recursos para comprar, construir ou reformar a casa própria.
Cada voucher será de R$ 60 mil. O governo vai priorizar a população que vive em domicílios precários nos centros urbanos, em municípios com até 50 mil habitantes.