Os prazos mais longos do que os inicialmente esperados pelo mercado para aprovação das reformas - com destaque para a da Previdência - e para a melhora de indicadores econômicos, como a redução do nível de desemprego, e as recentes revisões das projeções para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) estão levando entidades do setor de construção civil a considerar a possibilidade de revisão para baixo de suas estimativas para 2019. Representantes setoriais ouvidos pelo Valor ainda não bateram o martelo, mas sinalizaram que podem alterar projeções se a confiança não voltar a crescer até meados do ano.
Por enquanto, o Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (SNIC) mantém a estimativa de expansão de 3% a 3,3% das vendas internas de cimento, neste ano, mas o presidente da entidade, Paulo Camillo Penna, já considera que possa ser necessário reavaliar as estimativas caso a reforma da Previdência não for aprovada até agosto. O SNIC esperava que a primeira sinalização positiva no acumulado de 12 meses fosse ocorrer em abril, mas houve queda de 0,6%.
Até 2018, o setor de cimento acumulou quatro anos consecutivos de retração, com queda que chegou a 25,9%, para 52,69 milhões de toneladas. Para que a faixa projetada para 2019 pelo SNIC seja alcançada, é preciso que tenha havido crescimento de 1,5% de janeiro a maio e expansão de 4,5% a 5% na segunda metade do ano, segundo Penna. Há 20 fábricas fechadas - 15 integradas e cinco moagens -, e a ociosidade do setor tem girado em torno de 47%.
Atualmente, edificações respondem por 90% do consumo de cimento, patamar que era de 75% historicamente. A mudança se deveu à retração do segmento de infraestrutura. O presidente do SNIC conta se preocupar com a desaceleração do segmento residencial se não houver um "movimento maior de estabilização da economia". "Vamos acompanhar o que acontece com o Minha Casa, Minha Vida", acrescenta Penna.
No primeiro trimestre, o setor de incorporação elevou, fortemente, os lançamentos imobiliários residenciais, principalmente na cidade de São Paulo - maior mercado imobiliário do país. Ainda assim, o Secovi-SP vai reavaliar, em um ou dois meses, as estimativas de lançamentos e vendas de imóveis na capital paulista. "Acho que teremos de revisar os números para baixo", diz o presidente do Secovi-SP, Basílio Jafet.
O Secovi-SP começou o ano esperando estabilidade no volume lançado e aumento de 5% a 10% no Valor Geral de Vendas (VGV) comercializado. A piora das expectativas se deve, segundo Jafet, à redução da confiança, decorrente das incertezas em relação à reforma da Previdência, ao desempenho mais lento do programa Minha Casa, Minha Vida no início do ano e às dificuldades de produção relacionadas às regras do novo Plano Diretor de São Paulo.
Segundo uma fonte setorial, as vendas de lançamentos imobiliários continuam bem, na capital paulista, mas há indícios de arrefecimento na comercialização de unidades em estoque. A fonte ressalta que o desembolso necessário para a compra de um imóvel pronto é maior do que para a aquisição de um lançamento, o que faz com que a queda na confiança tenha impacto maior no segmento de unidades concluídas. "O cenário é positivo, mas a confiança precisa ser restaurada", afirma a fonte.
Em junho, a Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat) vai rever, provavelmente para baixo, a estimativa de expansão de 2% do faturamento deflacionado do setor, neste ano, em decorrência de as projeções para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) terem sido reduzidas. "Mas um crescimento acima de 1% já mostra alguma sustentabilidade em relação à alta de 1% de 2018", diz presidente da Abramat, Rodrigo Navarro.
O presidente da Abramat ressalta que "se as reformas passam, e há retomada das obras de infraestrutura, o cenário muda". De janeiro a abril, as vendas de materiais tiveram leve queda de 0,2%, na comparação anual. O varejo continua a puxar as vendas da indústria. Navarro mantém a expectativa que o crescimento da comercialização de materiais para as construtoras ocorrerá a partir do segundo semestre, devido à defasagem entre lançamentos e início das obras.
Em janeiro, a Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimentos, Louças Sanitárias e Congêneres (Anfacer) estimava que a venda interna de revestimentos cerâmicos cresceria 5%, em 2019, para 730 milhões de metros quadrados.
A entidade ainda não tem nova projeção, mas já espera que as vendas domésticas de revestimentos fiquem abaixo desse volume. "Esperávamos crescimento de 5%, mas não atingiremos esse numero, por conta do momento econômico que estamos enfrentando. O varejo e as construtoras ainda não reagiram", diz o diretor-superintendente da Anfacer, Mauricio Borges. Segundo ele, há também indefinições relacionadas ao gás natural, principal fonte de energia do setor cerâmico.
Com a retomada da economia mais lenta do que o esperado e as revisões para baixo do PIB do país, a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) já espera que o aumento do PIB da construção ficará em torno de 2%, em 2019, abaixo da projeção feita, no início do ano, pela Fundação Getulio Vargas (FGV), de alta de 5%. O PIB setorial acumulou, em 2018, cinco anos de queda.