Os resultados do primeiro trimestre apresentados pelas incorporadoras de capital aberto apontam que, apesar da melhora dos dados operacionais, a receita setorial caiu e o resultado líquido piorou. Com a queda acumulada de lançamentos nos últimos anos, o número de obras diminuiu bastante, resultando em menos composição da receita, que passou a ser mais dependente da venda de unidades já prontas. O indicador continua a refletir também distratos elevados, ainda que menores, em decorrência de menos entregas.
Nos próximos trimestres, receita e resultados líquidos tendem a continuar pressionados por volume pequeno de obras, pelos estoques elevados e pela revenda de unidades distratas com margens menores.
Espera-se que, no próximo ano, o desempenho operacional seja beneficiado por taxas de juros menores e pela inflação mais baixa. Há quem diga que, em função da contabilidade do setor, com composição da receita à medida que a construção avança, melhoras mais expressivas nos balanços podem ocorrer somente a partir de 2019.
De janeiro a março, CR2, Cyrela, Direcional Engenharia, Even Construtora e Incorporadora, EZTec, Gafisa, Helbor, João Fortes, MRV Engenharia, PDG Realty, Rodobens Negócios Imobiliários (RNI), Rossi Residencial, Tecnisa, Tenda, Trisul e Viver Incorporadora tiveram prejuízo líquido consolidado de R$ 582,4 milhões, 40% maior do que a perda registrada um ano antes, conforme levantamento do Valor DATA. A receita líquida caiu 16%, para R$ 3,539 bilhões, incluindo a receita de incorporação da JHSF.
Direcional, Even, Helbor, RNI e Tecnisa reverteram o respectivo lucro líquido do primeiro trimestre do ano passado em prejuízo líquido. PDG continuou a responder pela maior perda do setor, mas reduziu seu prejuízo em 32,7%, para R$ 276 milhões. Cyrela e EZTec apresentaram queda do lucro líquido. Apenas MRV, Tenda e Trisul tiveram ganhos líquidos superiores na comparação anual. MRV e Tenda são as principais incorporadoras com atuação no programa habitacional Minha Casa, Minha Vida.
As companhias lançaram e venderam mais no primeiro trimestre do que no mesmo período de 2016 e registraram queda nos distratos, considerando-se a parcela própria das incorporadoras nos empreendimentos.
Sem incluir JHSF, os lançamentos do setor cresceram 29% na comparação anual, para R$ 2,785 bilhões, e as vendas contratadas líquidas aumentaram 6,9%, para R$ 2,761 bilhões. Os distratos tiveram queda de 21,7%, para R$ 1,827 bilhão. As rescisões corresponderam a 40% das vendas brutas das incorporadoras, patamar abaixo dos 47,5% do primeiro trimestre do ano passado.
Ainda não se pode falar em reaquecimento da demanda, mas de melhora ante uma base fraca de comparação, afetada pelo cenário pré-impeachment da então presidente Dilma Rousseff. "Nem de longe, temos de volta os patamares de 2011 e 2012", diz um analista.
A ausência de regulamentação para os distratos continua a pesar, negativamente, na decisão de lançamentos. "Como ainda não há regulamentação dos distratos, estamos desmotivados a lançar produtos para a classe média", disse o diretor financeiro e de relações com investidores da EZTec, Emílio Fugazza, durante a divulgação dos resultados. A companhia, que não apresentou projetos no primeiro trimestre, vai direcionar os próximos lançamentos para as classes média alta e alta.
Durante divulgação dos resultados, incorporadoras informaram que, em abril, o desempenho de vendas foi prejudicado pelos feriados. Em teleconferência, o copresidente da Cyrela, Raphael Horn, disse que o mês foi "desastroso para o setor", mas que espera vendas melhores em maio e junho.
As incorporadoras continuam a cortar pessoal e a apresentar despesas gerais e administrativas menores, mas esses custos ainda representam parcela relevante da receita, o que pressiona as margens. A Tecnisa, por exemplo, reduziu o quadro de funcionários em mais de 50% nos últimos 18 meses e, no início de abril, devolveu outro andar do prédio em que está sediada. Vale lembrar que a retomada dos lançamentos não significa contratação, já que a obra só começa a sair papel efetivamente meses após o início das vendas.
No trimestre, a margem bruta consolidada dos setor foi de 20,8%, abaixo dos 22,6% de janeiro a março de 2016. A rentabilidade menor reflete também a revenda com descontos de unidades distratadas. A queda não foi mais acentuada devido à economia de custos que vem sendo obtida pelas incorporadoras.
Os balanços apontaram também que ainda há necessidade de provisões para contingências de distratos, problemas cíveis relacionados a empreendimentos antigos e a questões trabalhistas.
Na avaliação de analistas, o ponto mais positivo dos balanços foi a geração de caixa, situação que deve ter continuidade ao longo do ano. A principal razão para o setor ter gerado caixa foi a redução do volume de obras, devido ao pico de entregas em 2016, e não o repasse dos recebíveis dos clientes para os bancos. Entre as companhias que geraram caixa no período estão Cyrela, Even, MRV, RNI e Tecnisa.
A dívida líquida do setor foi reduzida em 2,2%, para R$ 17,092 bilhões. Ainda assim, a alavancagem consolidada medida por dívida líquida sobre patrimônio líquido teve aumento expressivo, passando de 54,4% para 72,7% na comparação anual. A expansão da alavancagem resultou de o patrimônio líquido do setor ter encolhido 26,8%, como consequência do prejuízo líquido de parte das companhias.
A PDG, que pediu recuperação judicial, foi a empresa que mais contribuiu para a redução do patrimônio líquido do setor. A companhia encerrou o trimestre com patrimônio líquido negativo em R$ 3,67 bilhões, ante o valor positivo de R$ 1,939 bilhão do fim de março de 2016. A Viver, também em recuperação judicial, tem patrimônio líquido de R$ 537,9 milhões. O patrimônio líquido da Gafisa continuou positivo, mas teve queda de 48,7%, para R$ 1,562 bilhão, devido à cisão da Tenda.