A pandemia do coronavírus deve prejudicar os resultados das construtoras nos próximos trimestres. O setor, que tinha uma boa perspectiva para esse ano com a retomada do crédito imobiliário e a queda de juros, pode não conseguir um bom desempenho, já que a desacelaração da economia deve, segundo analistas, levar à redução da compra de imóveis, aumento dos estoques e consequente paralisação dos lançamentos, além da suspensão das obras ainda na planta. A inadimplência do consumidor é outro temor, com a perspectiva de aumento do desemprego e a impossibilidade de pagamento das prestações nos financiamentos.
"O setor deverá ser altamente impactado no curto e médio prazo, em função da redução do poder de compra aliado a diminuição da confiança do consumidor, que deve se estender. Destacamos ainda expectativas de demissões em massa, reduzindo o acesso a créditos mais baratos e o uso do FGTS para outras finalidades que não a compra de imóveis", diz Julia Monteiro, analista da MyCAP.
Ela explica que as companhias devem resguardar o caixa para pagamento das obrigações de curto prazo e capital de giro, reduzindo assim os investimentos e esperando planos governamentais específicos ao setor. Renato Chanes, estrategista de Pessoa Física da Santander Corretora, diz que entre as discussões em andamento entre o setor e o governo, destacam-se as solicitações para permitir que os compradores deduzam temporariamente os juros dos financiamentos de seu imposto de renda (para promover a demanda e reduzir a inadimplência/distratos); e a criação de um produto bancário (Poupança Mais), para adicionar flexibilidade e aumentar a atratividade das contas de poupança, a principal fonte de financiamento do setor.
"Claramente as medidas de isolamento social terão impacto sobre os resultados das construtoras, mas a magnitude e a duração será diferente entre os segmentos. Além disso, como a construção civil foi responsável por 11% do total de empregos criados no Brasil em 2019, o governo deve ser mais suscetível a ajudar o setor durante e após a pandemia", afirma Chanes.
Alvaro Bandeira, sócio e economista-chefe do banco digital Modalmais, diz que a pandemia vai afetar todos os setores da atividade industrial e serviços e que o setor de construção vai voltar a encolher. Ele cita como exemplo a expectativa de redução do Valor Geral de Vendas (VGV), queda dos lançamentos, além diminuição da capacidade dos proprietários em pagar parcelas de financiamentos. Para ele, as retomadas de imóveis devem voltar a acontecer agravando ainda mais a situação do setor.
"Porém, assim como em outros segmentos como o varejista, será preciso avaliar cada empresa do setor de construção individualmente, pois a resposta será diferente dependendo da situação econômica e financeira de cada uma das empresas. A recuperação prevista certamente foi abortada em 2020", comenta Bandeira.
O analista da Guide Investimentos Luis Sales também acredita que o setor deve sofrer nos próximos trimestres, em meio ao aumento do endividamento das famílias e queda na confiança para investimento. "Com isso, esperamos uma queda no ritmo de lançamentos, principalmente no segundo e terceiro trimestres de 2020, com uma possível retomada no final do ano e começo de 2021. Mesmo em um cenário de taxa de juros em patamares baixos, avaliamos que a busca por ativos mais líquidos e recuperação ainda lenta no segundo semestre serão os principais pontos para o fraco desempenho", diz Sales.
Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, diz que já é possível ver reflexos negativos nos preços de imóveis, tanto para venda como aluguel, e é provável que a atual crise faça com que o poder de barganha se perdure por mais algum tempo na mão do comprador. "Especialmente para setores mais cíclicos, a lógica do cash is king é extremamente válida, e com o giro da economia em menor escala, é esperado sim que o setor entre num compasso de espera até conseguirmos quantificar melhor os desdobramentos da atual crise", comenta.
Já o analista Pedro Galdi, da Mirae Asset, acredita que a dinâmica do setor segue favorável com queda de juros e inflação. Mas ele não aguarda um bom desempenho no segundo trimestre de 2020, diante da paralisação da economia com a quarentena.
Troca de carteiras
Para a próxima semana, algumas corretoras anunciaram troca de carteiras. A XP vai mudar Engie por Sanepar. Segundo a XP, as ações da Companhia de Saneamento do Paraná oferecem um bom risco-retorno no contexto atual, uma vez que negociam a patamares extremamente descontados (com taxa de retorno real de 15%). "Mesmo que ocorram notícias negativas referentes ao iminente reajuste tarifário, como um diferimento devido ao cenário atual da covid-19, acreditamos que isso está mais do que precificado", afirma a XP.
Na carteira da Terra Investimentos saem Lojas Americanas e Klabin e entram Cosan e Yduqs. Na Guide, sai BRF e entra B3. O analista Luis Sales espera que os números operacionais da companhia continuem com um volume mais forte neste 2020, especialmente de ações (segmento Bovespa) e futuros (segmento BM&F), diante do quadro de taxas de juros mais baixas. "Em meio ao cenário conturbado, a companhia vem observando grande fluxo de negociações, por mais que os preços das ações estejam bem mais baixos, o que pode acabar por beneficiar a companhia em volume", comenta. Entre as mudanças na Guide estão ainda a saída da carteira de B2W e Petrobrás e a chegada de Cemig e Suzano.