A principal lição aprendida pelas gestoras de recursos que se apressaram em colocar fundos globais na prateleira após a reforma do setor um ano atrás é que os veículos que investem em portfólios no exterior só ganham apelo para o investidor brasileiro quando há proteção contra as oscilações cambiais.
"Por mais que o investidor concorde com a teoria de que parte da renda deveria ser dolarizada porque tem o custo do carro importado, coisas depreciando em dólar, na hora de investir o CDI fala mais alto", diz Gustavo Pires, chefe da plataforma de fundos da XP Investimentos.
Na sua grade, a XP tem uma oferta pequena de dez fundos de gestores diversos, e os de maior sucesso foram justamente aqueles que oferecem hedge cambial. "Poderia ser maior. Não é porque não tem demanda; não quisemos superpovoar", diz. "Não decolou como se imaginava."
Segundo recorte da Anbima feito para o Valor, considerando-se só os multimercados novos com investimentos no exterior, a captação no ano até novembro totalizava R$ 2,738 bilhões.
Agregando-se as carteiras antigas que já tinham alguma exposição a ativos estrangeiros e foram reclassificadas, o fluxo líquido atinge R$ 52,5 bilhões - o que inclui os portfólios que podem ter até 40% de alocação em ativos estrangeiros. No conjunto, esses fundos tiveram uma rentabilidade média de 0,30% no ano até novembro.
"Os fundos com exposição cambial acabaram sofrendo com a valorização do real, independentemente de o ativo investido no exterior ter apresentado performance positiva ", diz Carlos José da Costa André, diretor-executivo da BB Gestão de Recursos.
Ele conta que no segmento private a gestora abriu ao longo do ano algumas janelas de captação para uma família de fundos que aplica em títulos de renda fixa de emissores brasileiros fora do país. Nela, considerou por bem tirar o efeito cambial em troca de um retorno atrelado ao CDI ou ao IPCA. Essas carteiras, diz, conseguiram atrair cerca de R$ 1 bilhão e têm proporcionado rentabilidade equivalente a 105% do CDI.
O Citi fez parceria com quatro gestores - Franklin Templeton, J.P. Morgan, Schroder e Western Asset - para ofertar fundos 100% globais, sem nenhum tema ou região específicos, e em todos os portfólios optou pelo hedge. "Isso nos deu um certo ancoramento. O cliente conseguiu entender o produto lá fora pois tinha dificuldade de entrar numa diversificação volátil", diz Eduardo Forestieri, superintendente de distribuição de investimentos do Citi. "Parte do retorno acaba sendo atrelado ao mercado interno."
Ele diz que globalmente alguns eventos, como a saída do Reino Unido da União Europeia (o Brexit) e a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, chacoalharam essas carteiras, que chegaram a ter volatilidade entre 8% e 10%, mas que, em termos de retorno, responderam bem. "Lá fora, alguns fundos tiveram cota negativa, mas como tinham cota em reais, grande parte superou o CDI, chegando a dar retorno de 120%."
Antes mesmo da nova regulamentação, a BNP Asset Management já ofertava aqui três fundos globais de renda variável, com foco em bolsa americana, europeia e global, diz Luiz Felipe Santos, responsável pela área de produtos da gestora. Criadas em 2010 e 2011, essas carteiras reúnem cerca de R$ 30 milhões e são todas sem hedge. "É difícil quantificar ou perceber o aumento da captação direta relacionada à [instrução] 555 na indústria. Não foi um movimento relevante em função do cenário macro, mas sem dúvida é uma porta para os próximos anos."
A tendência é o setor privilegiar, pelos próximos três anos, carteiras que ofereçam proteção cambial, diz Giuliano De Marchi, responsável pela área comercial do J.P. Morgan no Brasil. "A gente aprendeu nesses primeiros meses que o risco soberano é muito atrativo para não oferecer hedge", diz. "Até o Brasil ter taxas mais regularizadas, isso vai ser importante."
Nas carteiras da Western Asset Management, com a estrutura de proteção, o gestor consegue entregar de 70% a 75% do CDI mais a variação do ativo no exterior, conta Roberto Teperman. "Se não for assim, o cliente fica com um pé atrás."