Pedro Garcia
São Paulo - Os empréstimos para empresas com recursos direcionados despencaram 17,2% em outubro puxado pela fragilidade das contas públicas, que levou a uma redução nos aportes aos bancos estatais, e pela recessão, que atingiu diversos setores tomadores do crédito.
Chamados de recursos carimbados, os financiamentos direcionados costumam ter juros menores por serem subsidiados ou por estarem lastreados em mecanismos estáveis de captação, como as cadernetas de poupança.
Diante do atual cenário econômico, contudo, mesmo esse dinheiro mais barato está minguando.
Um dos motivos foi que, na busca por consolidar o ajuste fiscal, o governo federal reduziu os aportes aos bancos públicos, especialmente ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e elevou as taxas cobradas nas operações dessas instituições, que antes eram bem menores que a média do mercado privado.
"Para um banco emprestar, ele precisa estar capitalizado. O problema para os bancos estatais é que o orçamento público está muito restrito", avaliou Nicola Tingas, economista chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi).
Dados do Banco Central (BC) mostram que os empréstimos gerados pelo BNDES em 12 meses até outubro caíram 23,1% em relação a igual período do ano anterior. Tanto as linhas voltadas para capital de giro (queda de 53%) quanto as de investimento (queda de 22,5%) apresentaram retração no período.
No caso das modalidades que usam os recursos da poupança, a queda foi mais acentuada no financiamento imobiliário, que contraiu 17,5%.
Com saídas líquidas recordes das cadernetas - o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SPBE), usado para o crédito imobiliário, registrou saques de R$ 54,9 bilhões ao longo de 2015 até outubro -, os bancos estão com menos recursos para direcionar ao financiamento de empreendimentos imobiliários.
"Com a escalada da inflação, as cadernetas não conseguem reter adequadamente os recursos necessários para realizar os financiamentos", disse Tingas.
Além disso, os especialistas ouvidos pelo DCI lembram que o segmento de construção civil passa por um momento ruim, com a redução da demanda, aumento das devoluções e consequente queda de novos lançamentos.
"Muitas das construtoras também estão envolvidas na Operação Lava Jato, da Polícia Federal, o que complica ainda mais o cenário", apontou Miguel de Oliveira, diretor de estudos econômicos da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).
O crédito rural, que também usa recursos das cadernetas de poupança foi a única linha de recursos direcionados que apresentou ligeiro crescimento, de 1,6%, em 12 meses até outubro. Considerando a inflação de 9,93% do período, entretanto, houve uma queda real de 8,3% nos empréstimos.
A poupança rural também teve uma saída líquida menor no ano, de R$ 3,41 bilhões, sendo que, em alguns meses, chegou a apresentar saldo positivo - no caso do SBPE, todos os meses de 2015 apresentaram saldos negativos.
O financiamento a custeio e investimento rural também está muito relacionado às safras dos produtores, apresentando oscilações cíclicas.
Sistema mais restritivo - Oliveira ponderou que toda a conjuntura macroeconômica também influencia na queda do crédito direcionado, com as empresas adiando investimentos e os bancos privados, que podem emprestar com recursos direcionados através das cadernetas ou de repasses do BNDES, mais seletivos e cuidados com a inadimplência.
"Mesmo capital de giro, as companhias não conseguem, porque esse crédito muitas vezes é lastreado em recebíveis [como faturas de cartão de crédito e duplicatas]. Se não vendem, elas não geram recebíveis", analisou o economista.
O boletim de crédito do BC mostra, no entanto, que mesmo o crédito originado com recursos livres, em que as taxas de juros são definidas pelos bancos, está em queda. Em 12 meses até outubro deste ano, esses empréstimos anotaram retração de 2,7%.
A contração veio ancorada, principalmente, nas linhas de capital de giro e antecipação de recebíveis. As modalidades que apresentaram avanço foram somente aquelas voltadas para exportação, como Adiantamento sobre Contrato de Câmbio (ACC), e as com limites pré-aprovados, como o cartão de crédito e o cheque especial - essas linhas, porém, são as que possuem as maiores taxas de juros do mercado.
De acordo com a autoridade monetária, o saldo de crédito, livre e direcionado, do sistema financeiro nacional cresceu 8,1% até outubro, para R$ 3,15 trilhões, enquanto os juros subiram para 30,5% ao ano.