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21/03/2016

Crédito direcionado tira força de alta de juros, diz estudo

Os empréstimos direcionados, como operações do BNDES, dificultam o trabalho do Banco Central para controlar a inflação, exigindo uma dose maior de juros para cumprir as metas, sugere um dos mais abrangentes estudos já feitos sobre a transmissão da política monetária pelo canal do crédito.

Alex Ribeiro 

Os empréstimos direcionados, como operações do BNDES, dificultam o trabalho do Banco Central para controlar a inflação, exigindo uma dose maior de juros para cumprir as metas, sugere um dos mais abrangentes estudos já feitos sobre a transmissão da política monetária pelo canal do crédito.

Usando dados de empréstimos contratados por quase 300 mil empresas registradas num banco de dados do BC com informações de todo o sistema financeiro, dois economistas chegam à conclusão que aquelas firmas com acesso ao crédito direcionado são menos impactadas pelas altas de juros promovidas pelo Banco Central.

Marco Bonomo, do Insper, e Bruno Martins, do BC, revelam que, quando se trata de crédito, as empresas se dividem em dois grupos. Existem aquelas que se financiam no mercado e sentem com toda a força o impacto dos apertos monetários, contratando menos crédito, pagando mais caro por essas operações, reduzindo novas contratações de empregados e sofrendo mais quando atingidas por choques externos.

E há o grupo de empresas com acesso ao crédito direcionado - que também incluem financiamentos agrícolas, imobiliários e crédito à exportação - que sofrem menos quando o BC sobe os juros ou quando a economia sofre impactos de choques. 

O estudo mostra que, quando o BC sobe a taxa básica em um ponto percentual, empresas sem acesso a empréstimos direcionados sentem uma queda de 3% nas operações de crédito. No caso das empresas com acesso ao direcionado, essa queda é um terço menor. 

Essa mesma alta de um ponto percentual nos juros básicos aumenta o custo de empréstimos para empresas sem crédito direcionado em 1,15%, enquanto que para aquelas que têm acesso ao crédito direcionado o juro sobe 0,89%. 

O crédito direcionado também abre um fosso entre as empresas quando se examina como a alta de juro afeta a contratação de empregados. Quando o juro básico sobe um ponto percentual, empresas sem acesso ao benefício reduzem em quase 1,2% a taxa de crescimento de seu quadro de empregados. No caso das firmas que acessam o crédito direcionado, o efeito é de pouco menos do que 1%.

Os autores do estudo, que foi publicado pelo BC como texto de discussão, não elaboram sobre as implicações para a condução da política monetária. Mas os dados parecem corroborar a visão sempre renovada do BC de que, porque o governo usa muito o crédito direcionado, a dose de juros para controlar a inflação deve ser maior. 

A ideia básica é que um dos canais mais importantes para a transmissão da política monetária - o crédito - está meio entupido no Brasil. Para compensar, o BC seria obrigado a reforçar a dose por meio de outros canais, entre eles a atividade econômica. 

Além de examinar as implicações do crédito direcionado para a política monetária, um achado lateral - mas não menos importante - é que altas de juros realmente se transmitem por meio do mercado de trabalho. 

Como descrito acima, altas de juros afetam, sim, as contratações das firmas, tanto para empresas sem crédito direcionado quanto para quem tem esse benefício. A transmissão da alta de juros para a inflação por meio do mercado de trabalho é um ponto polêmico entre os economistas. 

Empresas com crédito direcionado também estão mais protegidas contra crises, mostra o estudo. Uma alta de 100% no CDS, uma medida do risco Brasil e dos impactos de crises externas sobre o país, reduz em 14% a taxa de crescimento do crédito para firmas sem acesso ao crédito direcionado. Já entre as empresas com acesso ao crédito direcionado o impacto é de 9,2%. 

O estudo, que está disponível na página do BC na internet, tem o titulo "The Impact of Government-Driven Loans in the Monetary Transmission Mechanism: what can we learn from firm-level data". 

FONTE: VALOR ECONôMICO