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13/10/2020

Crédito imobiliário cresce 44% até agosto, com juro baixo e imóvel barato

Expansão também é influenciada pelo nível recorde da poupança. Com aquecimento do setor, preço de imóveis começa a subir

Juro baixo, imóvel barato, crédito farto e poupança em níveis recordes diante do medo do futuro causado pela pandemia criaram as condições perfeitas para a retomada mais forte do setor imobiliário no país. Sinal mais evidente desse movimento aparece no crédito imobiliário para pessoas físicas, que aumentou 44% de janeiro a agosto, chegando a R$ 51,3 bilhões, segundo a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip). Foi a maior alta desde 2015.

E os preços já começam a subir. Segundo levantamento do Índice FipeZap divulgado na semana passada, o valor de venda dos imóveis residenciais aumentou 0,53% em setembro, na comparação com agosto, a maior alta em seis anos.

— Apesar da pandemia, os números de financiamento imobiliário são positivos. De janeiro a agosto verificamos um aumento do volume financiado de 40% em relação ao mesmo período de 2019, chegando a quase R$ 66 bilhões — afirma a presidente da Abecip, Cristiane Portella.

Rafael Scodelario, consultor do setor imobiliário, explica que a taxa básica de juros, a Selic, está no menor patamar histórico, em 2%, mal repondo a inflação, o que permite condições favoráveis para a compra financiada da casa própria e atrai investidores que viram os rendimentos dos títulos públicos minguarem com a queda dos juros:

— Durante a pandemia, as pessoas viram o quão importante é ter uma casa. A procura por imóveis residenciais aumentou. Quem pode comprar um imóvel financiado agora deve aproveitar o momento porque os preços estão começando a subir por causa da procura.

Ele ressalta que a queda na taxa média de juros dos bancos permite que caibam no bolso as parcelas de imóveis maiores e mais caros.

— Quem financiou R$ 200 mil no ano passado, hoje consegue financiar R$ 400 mil. Uma família com uma renda de R$ 3.500, por exemplo, hoje consegue um financiamento em torno de R$ 160 mil a R$ 170 mil reais. No passado, ela conseguiria no máximo R$ 110 mil ou R$ 115 mil. A diminuição dos juros aumentou bastante o poder de compra.

Efeito home office

A advogada Gabriela Mello comprou um dos 198.924 imóveis financiados nos primeiros oito meses do ano. Com a pandemia, a empresa em que trabalha decidiu adotar o trabalho remoto de modo permanente, o que aumentou a necessidade de ter uma casa melhor:

— O apartamento alugado era uma quitinete, e eu não tinha a estrutura necessária para aderir ao trabalho remoto em período integral. Pesquisei as taxas de financiamento e liguei para a minha gerente do banco, que me explicou que o período era bom para a compra de imóvel. Parcelei em 360 meses, mas pretendo ir quitando com o 13º salário e a liberação do FGTS.

O setor imobiliário já vinha melhorando antes da pandemia. Com a quarentena, foi derrubado como todas as atividades econômicas, mas já começa retomar, afirma Silvio Campos Neto, sócio e economista da Tendências Consultoria:

— É um setor muito sensível ao custo do financiamento e se beneficiou desse processo contínuo de queda de juros, que também torna o imóvel uma alternativa de reserva financeira.

As perspectivas continuam positivas para o setor, inclusive pelo comportamento do mercado de trabalho. De modo geral, os que têm mais renda e emprego formal foram menos afetados pelos efeitos econômicos da pandemia, conseguindo manter rendimentos e capacidade de consumo.

Campos Neto afirma que essa parcela está em condições de aproveitar a situação mais favorável ao comprador. Ele alerta, porém, que a situação fiscal comprometida pode ser um freio para o crédito imobiliário.

— Uma das consequências é a piora do ambiente macroeconômico e até aumento de juros. Pode colocar por terra os efeitos da confiança mais elevada, a inflação controlada — resume.

A poupança está batendo recordes de captação, com o medo das famílias em relação ao futuro por causa da pandemia. Esse movimento também é favorável ao crédito imobiliário, já que a poupança é a principal fonte de recursos.

As taxas de juros mais baixas ajudaram o casal de empresários Sabrina Santos e William Silva a comprar um imóvel melhor sem ultrapassar o orçamento. Depois de muita pesquisa, compraram um apartamento mobiliado e bem localizado:

— Conseguimos financiar 82% do valor do imóvel em 360 meses. Os juros mais baixos permitiram que não só comprássemos um imóvel, mas que pudéssemos comprar o imóvel dos nossos sonhos.

Demanda reprimida

O momento propício fez aumentar em 77% a procura por imóveis residenciais na imobiliária APSA entre junho e agosto, na comparação com os três meses antes da pandemia.

O gerente de Compra e Venda da empresa, Gustavo Araújo, conta que os pedidos de avaliações para venda estão em um nível maior do que o esperado. Somente em agosto, a venda de imóveis subiu 32% frente ao mesmo mês de 2019:

— A reabertura da economia, a queda dos juros e a maior facilidade de financiamento imobiliário são alguns dos motivos, mas o setor experimenta uma nova realidade: a necessidade das pessoas se adequarem a novos modelos, como o home office integral, a busca por melhores opções de lazer e facilidades próximas às residências. É a adaptação a uma nova realidade financeira.

Para o diretor de atendimento da Rede Lopes, Cyro Naufel, o setor imobiliário tem sido beneficiado com a queda da Taxa Selic.

Segundo dados da companhia, o volume de financiamento de imóveis pela CrediPronto — joint venture (parceria) da Lopes com o banco Itaú — cresceu 32% no segundo trimestre frente a 2019:

— A melhora nas condições de financiamento atendeu a uma parte da demanda reprimida por imóveis no país. A retomada da confiança e a flexibilização da quarentena também impulsionaram as vendas.

A Loft, start-up que facilita a compra, troca e venda de imóveis residenciais, viu o número de vendas disparar entre julho e setembro.

— O volume de vendas cresceu 220% em relação ao segundo semestre do ano passado, ou seja, mais do que triplicou — diz Mate Pencz, fundador e co-CEO da Loft.

O unicórnio, como é chamada uma start-up cujo valor ultrapassa US$ 1 bilhão, agora investe na intermediação de crédito imobiliário. Desde janeiro, a Loft oferece uma assessoria gratuita a quem busca um financiamento e faz cotações em diversos bancos.

De lá para cá, já foram 360 operações de crédito viabilizadas, a um volume acumulado de R$ 165 milhões.

— Em abril, a visita de pessoas ao site da Loft em busca de financiamento imobiliário dobrou, enquanto o cadastro de pessoas interessadas triplicou. Resultado: o volume de financiamentos de imóveis intermediados pela Loft, pertencentes ou não ao portfólio da empresa, cresceu quase 40% do primeiro para o segundo trimestre — afirma Pencz

FONTE: O GLOBO