A crise provocada pelo novo coronavírus acabou emperrando os planos do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) de reduzir os juros no financiamento de moradias do programa Minha Casa, Minha Vida. A pasta defende o corte para ampliar o número de beneficiários, mas a área econômica resiste à medida porque o caixa do FGTS, de onde saem os recursos para o programa, já está sobrecarregado pelas ações de socorro da pandemia.
A revisão das taxas do programa é um dos pontos em discussão no âmbito da reformulação do Minha Casa, Minha Vida, que deve ser rebatizado de “Casa Verde Amarela” diante do desejo do governo Jair Bolsonaro de alavancar uma marca própria em políticas sociais.
A ideia era refletir para os mutuários a queda na taxa de administração do FGTS cobrada pela Caixa Econômica Federal, de 1% para 0,5%. O corte de 0,5 ponto porcentual seria repassado para as duas faixas do programa com subsídio do FGTS.
Diante do impasse, o MDR centrou esforços para tentar viabilizar ao menos uma redução nos juros para famílias no Norte e no Nordeste, onde Bolsonaro tenta ampliar sua base de eleitores, e depois buscar a extensão disso para as demais regiões.
Os cortes estavam previstos para as faixas 1,5 e 2 do programa. Na faixa 1,5, para famílias com renda até R$ 2,6 mil, a taxa hoje é de 5% ao ano. Na faixa 2, para famílias com renda até R$ 4 mil, o porcentual é de 5,5% a 7% ao ano. Nas duas, o FGTS banca uma parte pequena do valor. Na faixa 3, para famílias com renda até R$ 7 mil, a taxa é de 8,16% ao ano, sem subsídio do FGTS.
Segundo apurou o Estadão, integrantes do governo estimavam que a medida permitiria contratar mais 150 mil unidades das faixas 1,5 e 2 do programa com o mesmo valor orçado pelo FGTS para os subsídios.
A posição da área econômica, porém, é de que o fundo não tem como abrir mão de receitas num momento em que está prestando ajuda em diversas frentes. Qualquer decisão de corte nos juros do Minha Casa precisaria passar pelo Conselho Curador, que tem seis representantes do governo (três deles do Ministério da Economia e um do MDR).
O argumento dos técnicos é que a redução significaria menor rentabilidade do dinheiro emprestado pelo fundo de garantia dos trabalhadores – na prática, menos receitas ingressando no caixa. Segundo uma fonte ouvida pelo Estadão, por mais que esse efeito seja sentido no futuro, a “ferida” deixada no FGTS pela pandemia vai demandar toda energia disponível para o fundo se recuperar daqui pra frente.
O governo permitiu que empresas adiem o pagamento da alíquota do FGTS sobre o salário durante três meses em 2020 e também vai conceder aos trabalhadores o direito de resgatar até R$ 1.045 de suas contas no fundo de garantia. Além disso, o Conselho Curador do FGTS concedeu uma pausa em alguns financiamentos contratados junto ao fundo, como os da área de saneamento.
Todas essas iniciativas colocaram pressão no caixa do FGTS, que tem ficado no limite de sua capacidade para fazer frente a seus compromissos. Além das medidas de socorro, o fundo precisa tocar seu orçamento para novos financiamentos no ano e garantir os saques nas demais modalidades já existentes (na demissão sem justa causa, por exemplo, que estão aumentando na crise).
A área econômica ainda mantém no radar sinalizações do Congresso Nacional de que pode ampliar as “benesses” com recursos do FGTS, liberando saques maiores pelos trabalhadores, o que pode comprometer de forma mais dramática a capacidade do fundo. Como mostrou o Estadão/Broadcast, decisões judiciais autorizando resgates de até R$ 6.220 pelos trabalhadores também acenderam o alerta para um risco de necessidade de aporte pelo Tesouro Nacional.
A Caixa afirmou que o assunto cabe ao Conselho Curador do FGTS. O Ministério da Economia disse que não vai comentar.