Notícias

22/04/2022

Cury quer manter foco em São Paulo e Rio, na baixa renda

Desempenho da incorporadora se descola de suas pares na bolsa e surpreende o mercado

Quando a incorporadora paulistana Cury se tornou uma joint venture da família fundadora com a Cyrela, em 2007, Fábio Cury, presidente da empresa, teve a oportunidade de expandir suas obras pelo país, um movimento feito por várias companhias que abriram capital na época. Sua decisão, no entanto, foi de permanecer em São Paulo, onde o negócio já tinha 40 anos de atuação, especializado em habitação econômica. Em 2009, começou a lançar no Rio de Janeiro e mantém seu foco nessas capitais e em suas regiões metropolitanas.

A decisão tomada em 2007 é um dos motivos dos bons resultados que a companhia vem entregando, de acordo com Cury, membro da terceira geração da família. Ele destaca que são locais onde há poder de compra mais elevado. “Temos que pegar uma pessoa com renda cada vez maior para comprar o mesmo produto. Encontramos ainda, muito por conta dos nossos terrenos e produtos, e por estarmos em São Paulo e no Rio”, diz, em entrevista ao Valor.

 

 

A empresa tem conseguido repassar ao consumidor o aumento dos custos para construir sem perder velocidade de venda - registrou alta de 20,7% no preço das unidades lançadas e de 12,8% nas vendidas no primeiro trimestre, na comparação anual.

 

“Acreditamos que vão continuar nessa política de elevar preço, conseguindo aumentar lançamentos, vender, e manter rentabilidade. É a combinação que a gente gosta”, afirma Ygor Altero, analista-chefe do setor da construção na XP.

 

Em relatório publicado na semana passada, analistas do BTG afirmaram que o índice de vendas sobre oferta (VSO no jargão do setor) deve ser o maior de todo o setor, de longe, e avaliam o desempenho da Cury de janeiro a março como “impressionante”.

Apesar de ter em sua história a atuação nas faixas iniciais do Minha Casa Minha Vida, a Cury é bem-sucedida porque conseguiu se adaptar às mudanças pelas quais o programa, atual Casa Verde e Amarela, passou. Essa mudança levou a empresa a buscar um público com renda mais elevada no segmento econômico.

 

“No começo atuamos nas faixas 1 e 2; em 2013 enveredamos para 2 e 3. Com o fim do governo do PT, as faixas menores estavam com dificuldades, então hoje estamos totalmente focados na faixa 3 e acima dela, no SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo)”, afirma Cury, que não descarta voltar a atuar nas faixas mais populares no futuro, a depender do resultado das eleições e dos incentivos para o programa habitacional.

O teto para o Casa Verde e Amarela em São Paulo e no Rio é de R$ 264 mil, mas a incorporadora lança unidades que custam entre R$ 180 mil e R$ 500 mil.

 

“Gostamos da Cury porque ela está na faixa 3 e uns 30% ligeiramente acima dela, faixa boa porque tem demanda e rentabilidade”, diz Altero. Incorporadoras que focam na faixa 2, para pessoas com renda entre R$ 2 mil e R$ 4 mil, sofrem mais para repassar a inflação e perderam margem de lucro.

A taxa de juros para financiamento imobiliário na faixa 3 do Casa Verde e Amarela foi reduzida no ano passado em 0,5 ponto percentual, enquanto as taxas do SBPE fizeram movimento contrário, acompanhando, mas não na mesma velocidade, a alta da Selic. “Isso ajudou bastante a manter as vendas”, diz Ronaldo Cury, diretor de crédito imobiliário, relações institucionais e com investidores.

 

Fábio Cury tem também uma atribuição considerada crucial na empresa - ele o executivo-chefe de compra de terrenos. Ele define a aquisição como fator-chave para o sucesso de uma incorporadora. “É a única parte do processo de incorporação que não pode ser solucionado se der errado”, diz.

 

No Rio de Janeiro, a Cury viu uma oportunidade na zona portuária, que ganhou infraestrutura na década passada com o projeto Porto Maravilha. O objetivo da prefeitura de tornar o local um polo de negócios não vingou, e a incorporadora enxergou potencial para habitação. “Ficou uma região que é o sonho de todo incorporador, com terrenos sobrando”, afirma o presidente.

Já são cinco empreendimentos lançados na região, dois deles neste ano, e pelo menos mais um deve ser lançado ainda em 2022. A região portuária concentra 80% das operações da Cury no Rio.

Em São Paulo, a estratégia é comprar terrenos ao lado de empreendimentos de padrão mais elevado, o que chama a atenção dos compradores. Fabio Cury cita como exemplo um terreno que era da Camil, de 40 mil m2, adquirido recentemente na Lapa. Ao lado há o empreendimento Caminhos da Lapa, da Helbor e da Tegra.

 

“Tem apartamentos de R$ 1,5 milhão e vamos fazer unidades de R$ 250 mil ao lado, atraindo outro público, então acho difícil os nossos negócios darem errado”, diz.

Hoje, os principais concorrentes da incorporadora são outras grandes do segmento econômico: MRV, Direcional, Plano&Plano e Econ, que disputam os mesmos terrenos. “Percebemos que, nos últimos anos, as empresas menores estão saindo do mercado, estão ficando as maiores e mais profissionais”, diz Cury.

No primeiro trimestre, a Cury alcançou R$ 781,2 milhões em lançamentos, alta de 32,3% ante um ano atrás, com cinco projetos. A expectativa é elevar o valor neste trimestre para até R$ 1,1 bilhão, e fechar o ano com cerca de R$ 3 bilhões. No ano passado a incorporadora fez R$ 2,8 bilhões.

O ritmo de lançamentos a partir de julho vai depender da situação do país, com as eleições ganhando as ruas. “Não gostamos de fazer lançamento em momento ruim, então vamos aguardar e ver o momento político”, diz o empresário.

 

XP e BTG recomendaram a compra das ações da incorporadora, com preço-alvo de R$ 13 e R$ 16, bem acima dos R$ 7,50 registrados na quarta-feira.

“A ação está no preço errado, dado o que a empresa vem entregando”, diz Altero, da XP. Segundo ele, o cenário de juros e inflação alta afugenta investidores do segmento imobiliário, o que afeta todo o setor, mas a Cury tem a vantagem de poder diminuir a velocidade de vendas se precisar aumentar mais o preço, para não perder margem

 

Matéria publicada em 22/04/2022

FONTE: VALOR ECONôMICO