O aquecimento da demanda por imóveis residenciais dos padrões médio e alto, na cidade de São Paulo, e dos lançamentos de projetos têm se refletido, diretamente, em mais procura por terrenos e no aumento de preços da principal matéria-prima para a produção de empreendimentos imobiliários. Esse movimento se concentra nos chamados eixos estruturantes - proximidades de estações de metrôs e trens, e de corredores de ônibus, onde o potencial construtivo aumentou com o novo Plano Diretor da capital paulista - e está mais intenso desde outubro de 2019.
Nos últimos 12 meses, os preços de terrenos para unidades destinadas às rendas média e alta tiveram valorização de 20% a 30%, nos eixos estruturantes, segundo Ronny Lopes, sócio da Arquimóvel, empresa que representa incorporadoras na aquisição de terrenos. Em alguns casos, quando recebem ofertas mais elevadas, proprietários de áreas têm aumentado os preços, depois de já iniciadas as negociações, de acordo com Lopes. “Há muita procura e pouca oferta. Quase chega a haver os leilões que ocorriam em 2014”, afirma o sócio da Arquimóvel.
Nos eixos, preços de terrenos para unidades de rendas média e alta tiveram valorização de 20% a 30% em 12 meses
Segundo o superintendente de marketing da Trisul, Lucas Araújo, para um mesmo terreno que era buscado por um ou dois corretores, há hoje de sete a dez profissionais “batendo na porta do proprietário”. O executivo ressalta que muitas incorporadoras têm recebido aportes de fundos e que outras, como a Trisul, levantaram recursos, no mercado, por meio de “follow-on” (ofertas subsequentes de ações). “Em vez de partir para a negociação em permuta, muitas empresas oferecem dinheiro aos proprietários, o que também inflaciona os preços dos terrenos”, diz Araújo.
Segundo Rodrigo Bicalho, sócio do escritório especializado em direito imobiliário Bicalho e Mollica Advogados, os aumentos dos valores de áreas ocorreram ao longo do ano passado, mas o processo ganhou força a partir de outubro, em decorrência da combinação de juros em queda e da possibilidade de financiamento imobiliário atrelado ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que estimulam a demanda por imóveis.
De acordo com Bicalho, quase todos os lançamentos de projetos imobiliários têm sido feitos nos eixos estruturantes, que correspondem a apenas 4% das áreas da cidade de São Paulo, e isso faz com que os preços dos terrenos estejam “explodindo” nessas regiões. Há tanta demanda por essas áreas, segundo o advogado, que proprietários chegam a não aparecer para a assinatura do contrato, se recebem uma proposta melhor. Esse tipo de situação não ocorria desde 2010, conforme o advogado.
Pablo Meira Queiroz, do escritório Tozzini Freire Advogados, ressalta que os terrenos disponíveis dos eixos vêm sendo ocupadas com grande velocidade neste momento de retomada do mercado imobiliário. Em poucos anos, no entendimento de Queiroz, haverá “um certo esgotamento” das áreas dessas regiões. “Temos cinco, dez anos para comprar terrenos”, diz Araújo, da Trisul, acrescentando que, se não houver calibragem da Lei de Zoneamento, os valores ficarão “quase inviáveis” nos eixos.
O secretário de Desenvolvimento Urbano da Prefeitura de São Paulo, Fernando Chucre, afirma que ainda há espaço para crescimento do setor sem extenuar os eixos, mas reconhece que alguns deles, como o da Rebouças e da Consolação, estão se esgotando. Chucre ressalta que não fazem parte das áreas dos eixos “apenas o que está de frente para as avenidas”.
O setor tem expectativa que haja revisão de alguns pontos da Lei de Zoneamento para que a produção no chamado remanso (miolos de bairros) seja considerada factível e para diversificar as tipologias produzidas nos eixos. Por enquanto, a maior parte das incorporadoras está em compasso de espera em relação à compra de áreas no remanso.
A EZTec, que fez oferta adicional de ações para captar recursos com o objetivo de comprar terrenos, está avaliando áreas para projetos das rendas média-baixa à alta em diversas regiões da capital paulista, incluindo eixos e remanso. Segundo o diretor financeiro e de relações com investidores da EZTec, Emilio Fugazza, a incorporadora está “bastante protegida” por já ter estoques de áreas nas regiões dos eixos. “Fizemos o ‘follow-on’, no momento certo, para dar suporte às aquisições”, afirma Fugazza.
Levantamento realizado pela Brain Inteligência Estratégica a pedido do Valor aponta que, nos últimos 12 meses, a média de aumento do preço fechado por metro quadrado de terreno, em regiões de alto padrão da capital paulista, localizadas no remanso, foi de 30% e, nas de médio padrão, situadas nos eixos, de 20%. A pesquisa foi realizada com 15 incorporadoras e cinco grandes imobiliárias de 7 a 16 de janeiro.
Nas melhores localizações dos melhores bairros do remanso, onde há mais as restrições de produção, a alta chegou a 50%, segundo o sócio da Brain, Fábio Tadeu Araújo. O executivo cita que os preços elevados refletem o aumento da liquidez de recursos para o setor, a sequência de lançamentos bem-sucedidos e a demanda por imóveis em um ambiente de juros baixos.
Fernando Trotta, sócio da Pivô Desenvolvimento Imobiliário, afirma que os patamares de 2011 e 2012 já foram retomados nas aquisições de áreas de maior porte, o que se reflete nos preços dos terrenos pequenos, de cerca de 500 metros quadrados. Juntamente com investidores pessoas físicas, a Pivô compra áreas maiores e entra como permutante em projetos de outras incorporadoras. Em outra frente de atuação, adquire terrenos menores e desenvolve, sozinha, os empreendimentos.
Segundo o advogado do Tozzini Freire, mesmo nos eixos, as incorporadoras têm sido bastante cuidadosas em relação às definições de preço e produto para evitar repetir erros do passado.