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13/02/2025

Dificuldade para comprar imóvel pode incentivar medidas de controle de aluguel, afirma executivo (Valor Econômico – Economia)

Para CEO de clube de incorporadores, competição com aluguel de temporada deve se acirrar e piorar acessibilidade à casa própria; pesquisador sugere “pool” de imóveis públicos

no setor imobiliário, como o controle dos preços dos aluguéis. Isso será uma resposta à crise de habitação que se avizinha. A previsão é de Gustavo Favaron, presidente do GRI Club, organização internacional que reúne 17 mil executivos do setor imobiliário, de 103 países.

A dificuldade crescente para comprar imóveis, motivada hoje pelo aumento da taxa de juros do financiamento imobiliário, os recursos mais escassos para dar suporte a essa modalidade de crédito e o esforço necessário para alcançar o valor de entrada — em novembro, a Caixa a elevou de 20% para 30% do valor do imóvel na modalidade SAC e de 30% para 50% na Price —, vão empurrar cada vez mais os brasileiros para o aluguel, analisa.

 

De 2010 para 2022, a parcela da população que mora de aluguel no país subiu de 16,4% para 20,9%, de acordo com o Censo do IBGE. “A oferta não vai acompanhar a demanda, por causa da dificuldade da aquisição da casa própria”. Essa demanda maior por locação deve ter o efeito de fazer subir o preço do aluguel.

Em coletiva de imprensa no dia 5, Ely Wertheim, presidente-executivo do Secovi-SP, sindicato do setor imobiliário, afirmou que os aluguéis devem ganhar força em 2025, mas discordou sobre a relação com a dificuldade para obter o financiamento da casa própria. “Ainda é o financiamento mais barato que tem, está na faixa de 12% ao ano, enquanto a Selic está em 13,25%”, disse.

Favaron aponta que a locação residencial tradicional, de contratos de 30 meses, ainda vai enfrentar mais competição com modalidades de aluguel de temporada, como a oferecida pelo Airbnb, o que pode fazer o preço pedido subir mais, a exemplo do que já acontece em capitais europeias. “[Locação por temporada] ainda é uma parcela muito pequena no Brasil, mas estou pensando em onde vamos estar em cinco anos”, diz.

Na divulgação dos resultados do terceiro trimestre do Airbnb, a CFO Ellie Mertz destacou que o número de noites reservadas por meio da plataforma quase triplicou no país de 2019 para 2024. O CEO, Brian Chensky, citou o Brasil como um dos nove países no qual o Airbnb enxerga “oportunidades enormes”.

Para Favaron, tentar limitar a oferta de imóveis para locação por temporada, como tem sido feito na Espanha, na Holanda e em Nova York, por exemplo, não é a melhor saída, mas é a saída mais popular. Nem tentar controlar os reajustes que proprietários podem exigir dos inquilinos. Com visão liberal, ele afirma que esse tipo de limitação imposta pelo Estado atrapalha o andamento da economia e piora a própria crise habitacional.

Segundo ele, diante de um valor limite para o aluguel, o empreendedor que faz apartamentos para renda vai se questionar se o negócio vale a pena, já que a inflação pode corroer sua margem. Em locais onde isso aconteceu, como Berlim, afirma, o resultado foi um deslocamento dos construtores para outras cidades. “E proprietários de imóveis, se estão limitados a um teto de valor [de aluguel], param de investir no imóvel”, diz, o que tornaria mais precária a oferta imobiliária para locação.

Sua saída é facilitar a construção de mais moradias, onde elas já são viáveis, e criar infraestrutura para viabilizar áreas que hoje não são consideradas propícias para habitação. “Aprovações mais eficientes, incentivo ao retrofit [reforma de prédios antigos], isso deveria ser feito”, diz.

Favaron advoga, também, por programas que facilitem a aquisição da primeira casa própria, com condições especiais para quem ainda não tem um imóvel. Hoje, esse tipo de condição ocorre no programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), que, no entanto, atende famílias com renda mensal de até R$ 8 mil. Aumentar a faixa de renda do MCMV poderia ajudar, segundo ele.

Hoje, porém, nem no setor imobiliário há apoio para um aumento das faixas de renda, já que os recursos do FGTS, que sustentam as condições mais favoráveis do programa, estão ficando escassos até para atender a demanda atual, quanto mais novas famílias, e que comprariam imóveis mais caros.

Para Favaron, há alternativas, como negociar parcerias com fundos soberanos de outros países. “Tem muito capital no mundo, o que falta é o agente público ser mais engenhoso, empreendedor”.

Alternativas via locação

Já Rodger Campos, consultor da RBA&Associados e pesquisador-líder do laboratório Insper Cidades, considera que a melhor solução para a questão habitacional do país é simplesmente o aumento de renda da população, “mas temos muitos problemas no Brasil que dificultam aumentar a produtividade do trabalho”, pondera, o que impede uma elevação de forma sistemática.

Nesse caso, outra saída, e que poderia segurar o aumento dos aluguéis, seria oferecer um “pool” de imóveis públicos para locação. Essa política seria diferente do que se faz atualmente em habitação por não se concentrar na posse do imóvel e não depender exclusivamente de imóveis novos, que levam anos para serem construídos. “O preço do aluguel de mercado tenderá a convergir ao preço do imóvel público”, diz. “Mas, para isso, precisa de escala”.

Em vez do poder público ter a posse dos imóveis, também poderia incentivar a compra de unidades que só pudessem ser locadas para famílias com renda de até três salários mínimos, por exemplo.

É em parte o que está sendo feito em São Paulo, onde imóveis de categoria Habitação de Interesse Social (HIS) 1 só podem ser vendidos ou alugados para quem tem renda de até três salários mínimos — em teoria. Na prática, o Ministério Público investiga incorporadoras que teriam burlado o limite de renda na hora de vender as unidades.

 

FONTE: VALOR ECONôMICO