Rodrigo Carro
O estoque de imóveis em poder de construtoras e incorporadoras encolheu quase 9% entre janeiro e março deste ano, na comparação com o fim de 2015, na esteira das queimas de estoque em "feirões". Levantamento feito pelo Valor com 15 das 19 empresas do segmento de construção civil listadas na BM&FBovespa indica que a carteira de imóveis em estoque (excluídos da conta os terrenos) somava R$ 24,06 bilhões ao fim de março - contra R$ 26,42 bilhões em 31 de dezembro.
Embora a redução já viesse ocorrendo ao longo de 2015, ganhou força este ano. Em 31 de março de 2015, o estoque somava R$ 26,84 bilhões. Entre as companhias de grande porte, Helbor e Even apresentaram os melhores resultados em termos de diminuição de estoque: 19,2% e 27,3%, respectivamente, na comparação anual entre o primeiro trimestre de 2016 com igual período do ano passado. "Em São Paulo, temos duas imobiliárias próprias, com cerca de mil corretores dedicados à venda de produtos Even, o que tem se mostrado um diferencial", conta Daniella Sasson de Figueira, diretora financeira da Even.
Na Helbor, o processo de diminuição do estoque passou por uma "readequação dos preços das unidades", de forma a refletir a realidade dos valores praticados no mercado atualmente, explica o diretor de vendas, Marcelo Bonanata. "Além disso, o menor volume de lançamentos no período favorece a redução dos estoques, uma vez que esse processo visa readequar a demanda à atual oferta. Por outro lado, os pedidos de distrato impactam negativamente na composição do estoque com o retorno das unidades previamente vendidas."
Na comparação entre o cenário atual e o de cinco anos atrás - quando o mercado imobiliário evoluía em velocidade de cruzeiro - o percentual de distratos cresceu drasticamente. "O índice de devolução, que estava entre 5% e 10%, subiu para um patamar entre 30% e 40%", compara Enzo Ferracini, diretor da área de infraestrutura da JLT, corretora de seguros e consultoria de risco baseada em Londres. "As construtoras estão queimando imóveis nos feirões."
No início da década, o distrato não chegava a ser um mau negócio para as construtoras porque - além de cobrar multa rescisória de 20% a 30% do montante pago pelo cliente - a construtora repassava o imóvel por um valor mais alto, puxado pelo mercado em ebulição. Mesmo que tivesse de pagar impostos e outras despesas relativas ao apartamento ou casa devolvido, o balanço final era geralmente favorável à ponta vendedora. "Hoje, o distrato traz prejuízo para a construtora porque já não é mais possível vender o imóvel devolvido por um preço mais alto [que o de lançamento], diz Ferracini.
Apesar do recuo nos estoques, o nível continua elevado na avaliação de Ferracini. "Esse estoque representa um risco bastante severo", diz o diretor da JLT. O executivo trabalha com um cenário nada animador para o biênio 2016-2017. "Serão dois anos sem novos projetos. As empresas vão correr para entregar o que podem o mais rapidamente possível os empreendimentos já lançados", sustenta. A ênfase na conclusão de empreendimentos - mesmo nos casos em que uma parte expressiva das unidades não foi vendida - é uma forma de reforçar o caixa.
Ficaram de fora da pesquisa a Construtora Adolpho Lindenberg, a JHSF Participações, a TGLT e a Brookfield Incorporações.