Na composição do spread bancário, além da inadimplência, há outras questões que preocupam o sistema financeiro como um todo, como a dificuldade na execução de garantias, afirmou o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Murilo Portugal, em evento ontem em São Paulo. "Além da inadimplência, existem outros problemas, como dificuldade de recuperação de créditos inadimplidos, mesmo quando há garantias", afirmou o executivo. Segundo Portugal, há uma litigiosidade grande e uma Justiça sobrecarregada, o que acaba gerando demora nas decisões. "Percebemos também na jurisprudência um viés, até compreensível, favorável ao devedor inadimplente."
Para Portugal, o Banco Central (BC) está com diagnóstico correto sobre as causas do spread bancário elevado no Brasil, que refletem custos altos da intermediação financeira, com destaque para os custos tributários. Portugal identifica ainda grande dificuldade dos bancos com a execução de garantias. Ele citou como exemplo especificamente o caso dos veículos. A cada cem ações judiciais, afirmou, um ano depois o banco consegue retomar 15 automóveis, que ainda vêm com IPVA e multas não pagos. Outra questão ligada aos spreads mais elevados, disse ele, é a assimetria existente entre as regras que o BC determina para as provisões - que exigem provisionamento de 100% após 180 dias de atraso do empréstimo - e as regras da Receita Federal. "Isso [a regra] significa que é preciso ir às operações lucrativas, pegar um pedaço do lucro e colocar esse valor para cobrir esse prejuízo", afirmou ele.
Na maioria dos países, ressaltou, é possível deduzir a provisão da base de cálculo do lucro e da tributação sobre a renda. "Aqui no Brasil, há descasamento das regras do BC para fazer provisão e as regras da Receita para permitir que essas provisões sejam abatidas do lucro", afirmou. Segundo Portugal, pela Receita é preciso pagar 45% de alíquota de tributação sobre a renda sobre o prejuízo que o banco teve na provisão e, na maioria dos casos, entrar na Justiça para tentar recuperar o empréstimo. Esse pagamento que foi feito sobre o prejuízo vira crédito tributário e é incluído nos balanços dos bancos sem juros e correção pela inflação. "Isso cria um custo grande. No Brasil, os bancos têm no balanço o dobro do volume de crédito tributário do que é a média internacional", disse. Ao falar sobre risco no mesmo evento, Isaac Sidney Ferreira, diretor de fiscalização do BC, disse que a crescente bancarização sem educação financeira é um "flerte com risco de crédito".