Depois de dois anos em queda, os empréstimos com recursos da caderneta de poupança para compra e produção de imóveis residenciais devem ficar estáveis neste ano. É o que espera a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), entidade que reúne os bancos que concedem financiamento habitacional com dinheiro originado da aplicação preferida dos brasileiros.
Em 2023, pelo terceiro ano consecutivo, os saques da poupança superaram os depósitos no país. A chamada captação líquida negativa chegou a R$ 87,8 bilhões, de acordo com o Banco Central (BC).
A fuga dos recursos refletiu tanto a necessidade de uma fatia da população de lançar mão de reservas para arcar com despesas, em um ambiente de endividamento elevado, quanto a transferência de dinheiro para aplicações mais rentáveis em renda fixa por parte de quem busca melhor remuneração de suas economias.
Houve queda, no ano passado, de 14,6% do crédito habitacional originado da principal fonte de financiamento imobiliário do país, para R$ 153 bilhões. O “funding” da poupança financia, principalmente, habitações para a classe média, abrangendo também imóveis para o alto padrão – para a baixa renda, o dinheiro do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é o recurso prioritário.
Os bancos que operam recursos da poupança precisam destinar 65% dos depósitos para o crédito imobiliário. Justamente dessa fonte de recursos é que sai o dinheiro mais barato para moradias das classes média e alta. Se a poupança se mostra menos atrativa para depósitos, passa também a ter também uma contribuição menor na composição do financiamento habitacional total.
Em dezembro 2021, o saldo de “funding” para habitação – incluindo Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), FGTS, fundos de investimento imobiliário (FII), Letras Imobiliária Garantida (LIG), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e Letras de Crédito Imobiliário (LCI) – chegou a R$ 1,71 trilhão, com participação de 46% da poupança.
No fim de 2022, a poupança correspondeu a 40% do total de R$ 1,92 trilhão. Em dezembro do ano passado, a principal aplicação financeira dos brasileiros respondia por 34% do saldo de R$ 2,17 trilhões.
A mudança da composição da pizza pode ser interpretada de duas formas. O financiamento habitacional vem contando com mais instrumentos de captação, reduzindo a dependência da poupança. O outro lado é que se trata de dinheiro obtido de forma mais onerosa pelos bancos, resultando em custo maior para quem contrata um empréstimo para a casa própria.
Financiamento imobiliário: Custo do crédito pode cair até 1,5 ponto percentual
O incremento da participação de recursos mais caros é uma das razões para o crédito imobiliário ainda não ter começado a refletir as quedas da Selic, a taxa básica de juros. E apesar de o ciclo de afrouxamento monetário estar em curso, mais dinheiro continua a sair do que entrar na poupança.
No mercado, comenta-se que, quando a taxa básica de juros voltar ao patamar de um dígito, a captação líquida da poupança tende a retornar ao terreno positivo, contribuindo para a diminuição dos custos dos empréstimos para construção e compra de imóveis residenciais.
No ciclo anterior de queda da Selic, para cada 2,2 pontos percentuais de baixa da taxa básica, os bancos reduziram o crédito imobiliário em 1 ponto percentual, segundo cálculo de Alberto Ajzental, professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV). No cenário atual, os cortes do financiamento imobiliário ocorrerão em um ritmo mais lento.
“Na melhor das hipóteses, a Selic – atualmente, em 11,25% – cairá para 8,75% até o fim do ano. O crédito imobiliário poderá ser reduzido entre 1 ponto percentual e 1,5 ponto percentual”, estima Ajzental, ressaltando que, ao todo, os cortes da taxa básica de juros chegarão a 5 pontos percentuais – 2 pontos, no ano passado, e estimados três pontos, em 2024.
Para o presidente da Abecip, Sandro Gamba, ainda não é possível falar em diminuição do custo dos empréstimos habitacionais.
“A gente não consegue aferir nem avaliar qual vai ser o patamar do crédito imobiliário no médio e no longo prazos. Se houver incremento de poupança em 2024 e queda na curva de juros longa, a probabilidade de redução da taxa de financiamento imobiliário é maior”, diz Gamba.
Compre agora; renegocie o financiamento imobiliário depois
Mesmo que os juros ainda estejam elevados, avalia o presidente da Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz Antonio França, vale a pena comprar uma moradia, em 2024, e migrar para um financiamento mais em conta, quando as taxas estiverem menores.
Segundo França, a partir do momento que a Selic baixar de dois dígitos, a captação da poupança tende a voltar a ser positiva.
“Quem compra um imóvel no lançamento vai assinar o contrato de financiamento com um banco um ou dois anos depois, quando a taxa de juros estiver muito menor”, destaca Ely Wertheim, presidente executivo do Secovi-SP. Até às chaves, as parcelas são pagas à incorporadora.
Em 2023, dos R$ 153 bilhões de financiamento habitacional com recursos da poupança, R$ 113,1 bilhões foram destinados à compra de moradias e R$ 39,9 bilhões, à construção, segundo a Abecip. Essa proporção de 74% do crédito para a aquisição e de 26% para a produção de imóveis tende a ser mantida neste ano.