A venda de unidades em construção ou em estoque é positiva para as empresas, por diminuir o custo de carrego dessas unidades, mas pode ter impacto sobre a margem bruta das companhias
A poucos dias das divulgações dos balanços das incorporadoras de capital aberto, o mercado aguarda para ver se os bons resultados apresentados nas prévias operacionais vão se refletir também em melhores indicadores financeiros para essas companhias.
Na média e alta renda, as incorporadoras optaram por reduzir seu ritmo de lançamentos, para se resguardar de uma possível diminuição da busca do consumidor pelos imóveis. O período entre julho e setembro foi marcado pela continuidade de juros elevados, que afetam principalmente o consumidor de média renda, e pela proximidade do período eleitoral, que poderia deixar esse consumidor receoso de se comprometer com uma compra do tamanho de um imóvel.
Segundo levantamento do Itaú BBA, o valor dos lançamentos dessas companhias foi de R$ 4 bilhões no terceiro trimestre, enquanto os novos projetos no mesmo período do ano passado e no segundo trimestre deste ano ficaram na casa dos R$ 4,9 bilhões.
A surpresa positiva para o mercado foi que as vendas não acompanharam o mesmo ritmo de queda dos lançamentos. No consolidado feito pelo banco, somaram R$ 3,7 bilhões em valor geral de venda (VGV), pouco abaixo dos R$ 3,8 bilhões do trimestre anterior, mas bem acima dos R$ 2,9 bilhões computados entre julho e setembro de 2021.
O efeito dos ritmos diferentes de lançamentos e vendas foi uma maior comercialização do estoque para as incorporadoras de média e alta renda. A pesquisa do Itaú BBA também mostra que, pela primeira vez desde o primeiro trimestre de 2021, o total de meses necessários para escoar o estoque dessas companhias foi reduzido, de 23 para 22 meses.
A venda de unidades em construção ou já prontas é positiva para as empresas, por diminuir o custo de carrego dessas unidades, mas pode ter impacto sobre a margem bruta das companhias, como afirmou o chefe de real estate da XP, Ygor Altero, em relatório, porque costuma significar descontos maiores para os compradores.
As incorporadoras de todos os padrões vêm tentando aumentar o valor das novas unidades, para compensar a inflação do custo da construção, forte desde o início da pandemia. Esse indicador, ao menos, já começou a se estabilizar. Para os analistas do Credit Suisse, o pior momento de alta de custos provavelmente já ficou no passado, mas o preço do concreto e da mão de obra ainda são fonte de preocupação.
O movimento de elevação do preço das unidades e de estabilidade dos custos também contribui para a expectativa do setor de ter melhora na rentabilidade dos empreendimentos.
No segmento de baixa renda, que foi especialmente atingido pelo aumento do custo da construção, por já trabalhar com margens mais apertadas, é esperado que as companhias que vinham conseguindo apresentar resultados operacionais e financeiros melhores, como Cury e Direcional, repitam os bons números. Já MRV e Tenda, que sofreram mais com os custos, optaram por reduzir o ritmo de lançamentos e a velocidade de vendas, e se concentrar no aumento do preço dos produtos, agora mais selecionados. Para o Credit, a Tenda deve ser o destaque negativo do trimestre, enquanto a MRV pode apresentar uma leve melhora de suas margens.
Em geral, as condições econômicas ainda são melhores para o segmento de baixa renda. A taxa de juros dentro do Casa Verde Amarela (CVA) é fixa e não acompanha as alterações da Selic na mesma velocidade e intensidade, e os recursos para bancar os financiamentos da política habitacional estão chegando em maior volume.
No terceiro trimestre, a Caixa reportou a liberação de R$ 19,3 bilhões para financiamentos do CVA, alta de 20% sobre o período anterior e de 36% ante o mesmo trimestre de 2021.
O período também marcou a implementação de atualizações no programa habitacional, muito pedidas pelas companhias que atuam no setor, como a ampliação da renda permitida e mudanças nas curvas de subsídios. Em setembro, começou a valer a possibilidade de se ampliar o prazo máximo do financiamento imobiliário no CVA de 30 para 35 anos, o que pode reduzir o valor mensal de pagamento e, assim, alcançar mais beneficiários.
Essa última alteração, porém, não é oferecida para todos os usuários do programa, depende da análise de crédito feita Caixa, o que limita seus efeitos.
Uma última atualização começou a operar neste mês, e permite incluir os depósitos futuros no FGTS como parte da renda familiar do tomador do empréstimo pelo CVA. Ela também vem com um porém: só foi liberada para famílias que com renda de até R$ 2.400, ou seja, apenas para as faixas iniciais do programa.
A incorporadora Pacaembu, que faz casas para o CVA no interior de São Paulo, afirma que vai se beneficiar da medida. Seus imóveis são vendidos, em média, a R$ 164 mil. Já incorporadoras que atuam nas capitais do país, principalmente no Sudeste, não conseguem atender esse público, pelo modelo atual do programa.
Matéria publicada em 29/10/2022