Há quase R$ 12 bilhões de operações de home equity no Brasil, segundo a Abecip (Associação Brasileira de Crédito Imobiliário e Poupança). Mas talvez você ainda não conheça essa modalidade de crédito – ou se conhece, é possível que saiba pouco sobre seus detalhes na prática. São os empréstimos em que o tomador de crédito oferece um imóvel como garantia, em busca de condições mais vantajosas de pagamento. É um mercado gigantesco em outros países, que cresce aos poucos no Brasil.
Uma das principais vantagens do home equity são os juros, que costumam ficar abaixo dos praticados nas modalidades mais conhecidas de crédito pessoal. Enquanto a taxa média do cheque especial, por exemplo, era de 122% ao ano, conforme os dados apurados pelo Banco Central em maio, no home equity fica em torno de 12% anuais. O custo, é bom lembrar, varia entre as instituições financeiras, pois depende, entre outras variáveis, das condições do imóvel dado em garantia e do perfil de crédito do tomador.
O home equity pode ser de 30% a 40% mais barato que o empréstimo para uma pessoa física que tenha uma boa pontuação de crédito, avalia Thiago Teixeira, CEO da Credimorar, fintech especializada em financiamento imobiliário. No empréstimo com garantia em imóvel, a empresa atua em parceira com três bancos privados (Itaú, Santander e Bradesco) e dois fundos (CashMe e Keycash), oferecendo créditos a partir de R$ 30 mil com prazos de até 20 anos para quitação. As taxas ficam entrem 0,79% ao mês, mais a variação do IPCA, ou 0,95% fixas.
Entre as principais razões para usar o home equity estão a quitação de outras dívidas, o investimento no próprio negócio e a aquisição de bens, segundo levantamento feito pela startup de crédito Creditas. Quem toma crédito desse tipo são, na maioria das vezes, pessoas com idade média na faixa dos 37 anos e renda mensal na casa de R$ 10 mil, mostram dados da Melhortaxa, marketplace especializado em crédito imobiliário.
“Dar o imóvel em garantia exige planejamento para consolidar esse crédito no orçamento e não correr o risco de ficar inadimplente, o que significa a perda do imóvel”, diz Guilherme Regal, coordenador do curso de Real Estate da escola de negócios da PUC-Rio. “Além disso, é preciso ler o contrato com muito cuidado e buscar a melhor taxa. Se possível, sempre melhor contar com a ajuda de um advogado para tirar dúvidas”.
Para atrair quem precisa de dinheiro para esse tipo de empréstimo, as instituições financeiras têm buscado esclarecer as principais dúvidas – e demonstrar as facilidades envolvidas, além da taxa de juros mais baixa. Embora muita gente não saiba, é possível, por exemplo, oferecer um imóvel ainda financiado como garantia ou até usar a casa de outra pessoa na operação. O InfoMoney coletou as orientações de seis especialistas da área sobre os detalhes menos conhecidos (e mais curiosos) do home equity. Confira:
É possível oferecer como garantia um imóvel que não é seu
Você precisa de dinheiro, mas o imóvel que oferece em garantia é de outra pessoa. Pode isso? Os especialistas em home equity explicam que sim. Nessa modalidade, é possível que o tomador apresente um imóvel em nome de outra pessoa – que não ele mesmo – para fechar a operação.
Funciona mais ou menos como ter um fiador, que dá seu próprio imóvel como garantia para o empréstimo de um terceiro – uma espécie de avalista, segundo Rodrigo Leite, professor de finanças e controle gerencial do Coppead/UFRJ.
Na Creditas, um imóvel de terceiro é aceito nas operações de home equity, desde que haja uma comprovação de vínculo com quem está pedindo o empréstimo.
“Pode ser o imóvel de um parente, por exemplo, desde que esse vínculo seja comprovado. É algo comum”, diz Maria Teresa Fornea, vice-presidente de home equity da Creditas. “Muitas vezes, um profissional liberal usa o imóvel dos pais para acessar uma linha de crédito mais barata e poder investir no seu negócio próprio, por exemplo”.
Quando quem busca o empréstimo não é dono do imóvel, a documentação do proprietário também precisa ser apresentada para a instituição que vai conceder o home equity. Além disso, o proprietário também precisa dar uma autorização para que seu imóvel seja considerado a garantia da operação.
Tanto o dono do imóvel quanto o tomador do crédito passam pelo mesmo processo de análise, sendo que o proprietário não precisa comprovar renda. É importante lembrar, no entanto, que no caso de as prestações do empréstimo não serem quitadas, o avalista corre o risco de perder seu imóvel (como acontece com o tomador quando o imóvel é seu).
Mesmo um imóvel ainda financiado pode ser dado em garantia
Pelas regras do home equity, o valor máximo do empréstimo nessa modalidade não pode ultrapassar 60% do valor de avaliação do imóvel. Portanto, na prática, quem tem um imóvel financiado e já pagou 60% ou mais da dívida pode se candidatar a um home equity usando ele como garantia.
“Ter um imóvel é ter um limite de crédito. Quando o financiamento é menor do que 40% do valor do imóvel, significa que há um limite para pedir um empréstimo na modalidade de home equity”, explica Maria Teresa.
Teixeira, da Credimorar, explica que os bancos costumam conceder empréstimos com garantia em imóvel financiado, desde que as duas operações aconteçam no mesmo banco.
“É possível quitar o financiamento com o home equity. O banco vai entender que o cliente está fazendo uma troca de dívida”, diz Teixeira. Faz sentido? Segundo o executivo, sim. Imagine que alguém tenha um financiamento imobiliário com um saldo devedor de R$ 100 mil, e a pessoa precise levantar outros R$ 100 mil em crédito para outra finalidade. Uma alternativa seria fazer um home equity de R$ 200 mil.
“No momento da emissão do contrato, o banco quita o saldo devedor de R$ 100 mil do financiamento imobiliário gerencialmente, dentro da instituição. Depois, faz o registro do contrato e deposita os R$ 100 mil adicionais na conta do cliente”, explica Teixeira.
Embora as taxas do crédito habitacional sejam mais baratas que as do home equity, usar essa modalidade para saldar o financiamento do imóvel pode ser uma vantagem para quem também precisa de dinheiro na conta. Uma pessoa com dívidas acumuladas no cheque especial e no cartão de crédito, por exemplo, poderia trocá-las, em conjunto com o financiamento imobiliário, por uma única operação de home equity – que, na média, tende a ser mais barato que o conjunto anterior.
Rafael Sasso, especialista em inovação e professor de finanças e mercado imobiliário da Finted Tech School, explica que nesse caso é feita uma alienação fiduciária do imóvel para a instituição financeira que quitou o financiamento e concedeu o home equity.
IPTU atrasado, condomínio em aberto? Também vale no home equity
Para as fintechs que trabalham com home equity, a documentação ou certos tipos de pendências dos imóveis não são necessariamente um empecilho para que sejam dados em garantia. Na Creditas, por exemplo, mesmo imóveis com IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e taxa de condomínio em atraso podem ser usados nas operações.
“Vamos olhar os impostos atrasados que estão ligados à pessoa física tomadora do crédito. Se não levarem a uma indisponibilidade do imóvel, podemos analisar”, explica Maria Teresa. Uma prática comum, segundo a executiva, é incluir as taxas pendentes no empréstimo e utilizar parte do crédito para quitá-las.
Leite observa a importância de que débitos desse tipo não tenham sido gravadas no Registro de Imóvel como dívida ativa. “Quando isso acontece, não há como utilizar esse imóvel como garantia”, explica. “É preciso verificar em cada município o prazo limite para um débito entrar na dívida ativa. Se o atraso das taxas não aparecer no registro, é possível fazer a negociação”.
A situação dos imóveis aceitos como garantia depende da instituição ou do fundo que concederá o crédito, segundo Paulo Chebat, CEO da Melhortaxa. Apesar de aumentar a complexidade da operação, ele explica que algumas instituições podem considerar até imóveis com área que não esteja totalmente averbada. Segundo ele, algumas instituições trabalham com exigências de comprovação de renda mais flexível, em contrapartida a uma avaliação do imóvel mais criteriosa – mas isso varia conforme a estratégia de cada uma.
Empréstimo com garantia para comprar outro imóvel: faz sentido?
O home equity, segundo Sasso, da Finted Tech School, não substitui a portabilidade do financiamento imobiliário – operação em que o devedor “leva” a dívida para outra instituição financeira com condições melhores – nem o financiamento de um segundo imóvel. Isso porque, na média, o crédito habitacional é uma opção mais barata.
No entanto, o home equity pode ser, sim, uma alternativa para comprar um segundo imóvel quando não há uma linha tradicional de financiamento disponível – um sítio, por exemplo.
“O importante, ao pesquisar um home equity, é olhar os custos do empréstimo, por meio da taxa efetiva, checar o cálculo das parcelas, verificar o indexador e os detalhes do contrato, e, principalmente, certificar-se de como é feito o processo de avaliação – se há cobrança de tarifas ou coisa parecida”, ressalta Sasso.
Rodrigo Leite, professor de finanças e controle gerencial do Coppead/UFRJ, também enxerga o home equity como uma opção, quando não é possível fazer um financiamento habitacional tradicional para adquirir um novo imóvel. Leite diz que pode ser uma solução quando há problemas na documentação do imóvel ou quando o vendedor tem pressa.
“Pegar o home equity é mais rápido do que financiar, pois não há necessidade de apresentar as certidões e os documentos relativos ao vendedor do imóvel”, explica Leite. “Em cerca de um mês, o empréstimo está liberado, enquanto o processo do financiamento pode durar até três meses para a liberação do valor”.
Usar um empréstimo com garantia para custear obras de melhoria no imóvel é um ponto que merece atenção, segundo Leite. O professor explica que só vale a pena tomar crédito de longo prazo nesses casos se a obra tiver potencial para elevar o valor do imóvel. “Quando a obra não impacta na avaliação, pode ser mais barato pegar um empréstimo específico para construção”, diz.
Imóvel alienado em home equity pode ser vendido
A venda de um imóvel alienado em uma operação de home equity é possível – mas pode ser um procedimento mais complexo, que pode depreciar o valor do bem. Leite ressalta que a venda só pode ser feita com a anuência do banco.
“O comprador quita o financiamento e acerta um valor do imóvel com o proprietário. Nesse caso, o banco é o interveniente anuente e precisa concordar com a venda. Depois do aceite, o banco dá um certificado de quitação da dívida, e o novo proprietário pode registrar o imóvel”, explica Leite.
Documentos detalhados aceleram a concessão do crédito
Quem está pensando em solicitar o empréstimo na modalidade home equity precisa ter em mãos uma série de documentos. O titular do contrato e também proprietário do imóvel deve apresentar: carteira de identidade, CPF, comprovante de estado civil (Certidão de Casamento ou Nascimento com respectivas averbações) e comprovante de endereço no próprio nome com CEP. Se o titular for casado e o imóvel estiver em nome do casal, o cônjuge precisa apresentar o mesmo conjunto de documentos.
No caso do imóvel, costumam ser exigidos documentos como certidão de matrícula e certidão de valor venal, desde que conste o nome do proprietário, endereço e metragem de construção do imóvel. Também é preciso informar a situação com relação ao IPTU, comprovar o valor e a quitação. Em imóveis que tenham taxa de condomínio, a documentação referente ao valor e ao pagamento dos boletos precisa ser apresentada. Fotos da fachada e dos cômodos do imóvel ajudam no processo de avaliação.
Comprovação de renda
Quanto à comprovação de renda, o conjunto de documentos varia para assalariados, autônomos e aposentados. No caso dos assalariados, costumam ser necessários os documentos como declaração de Imposto de Renda Pessoa Física, os três últimos contracheques e a carteira de trabalho. Se o tomador do crédito for aposentado ou pensionista, além do Imposto de Renda, são necessários documentos como os três últimos comprovantes de pagamento da aposentadoria ou pensão, os extratos bancários da conta em que o benefício é depositado dos três últimos meses, além da carta de concessão do benefício.
Para os profissionais liberais e autônomos, além da declaração de Imposto de Renda, normalmente é preciso entregar uma carta de próprio punho detalhando a situação profissional atual. Também é necessário enviar os extratos bancários dos seis últimos meses e, se possível, o contrato de prestação de serviços e a carteira de Identidade da Classe Profissional (OAB, CRC, CRM, etc).