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23/05/2024

Incorporadoras de menor porte tentam renegociar CRI para terminar obras (Valor Econômico)

Empresas buscam carência em pagamentos e recursos novos para equilibrar orçamento após forte aumento de custos durante a pandemia

Incorporadoras de pequeno e médio portes têm procurado investidores de certificados de recebíveis imobiliários (CRI) para renegociar termos de dívidas. A movimentação ocorre em meio ao aumento dos custos de construção e em um cenário de crédito ainda restrito. Enquanto as grandes incorporadoras conseguem injetar os recursos necessários para finalizar as obras, as médias negociam aportes novos ou a possibilidade de atrasar o pagamento da remuneração ou deixar de cumprir cláusulas restritivas.

 

As atas de assembleias de investidores de CRI realizadas nos últimos meses, documentos públicos enviados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), registram essas negociações. Um exemplo é o da incorporadora Zarin Participações, do interior paulista, que conseguiu em abril aprovar com os “crizistas” a concessão de carência de seis meses para pagamento de amortização da dívida.

 

Outro exemplo é o da incorporadora Manhattan, do Ceará. Os investidores aprovaram que fossem liberados recursos do fundo de reserva “para a evolução das obras”, conforme a ata da reunião realizada no dia 26 de abril.

 

Alguns dos casos envolvem projetos que estão em fase de conclusão, segundo Daniel Magalhães, diretor-presidente e fundador da securitizadora Virgo. “Algumas companhias precisaram renegociar porque o custo estourou. Há também exemplos em que foi levado ao investidor a possibilidade de uma tranche adicional para financiar o fim do empreendimento”, afirma.

 

O ciclo imobiliário costuma durar de dois a cincos anos, então o que as empresas estão vivendo hoje não é reflexo dos últimos seis meses, mas de projetos que começaram em meio à pandemia e que agora estão em fase final, diz Magalhães.

De março de 2020 até o fim de 2023, a variação do Índice Nacional de Custos da Construção, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), foi de 38,6%. Em abril, o índice aumentou 0,41%, em um movimento de estabilização após uma forte alta principalmente em 2021.

“O avanço do custo foi algo que atrasou bastante o cronograma das obras dos incorporadores”, afirma Marcos Ribeiro do Valle, sócio e diretor da securitizadora Habitasec. “O cenário de taxas de juros elevadas também trouxe um desafio adicional na venda dos produtos.”

 

Nos últimos anos, com o desenvolvimento de instrumentos de crédito, como os CRIs, as pequenas e médias incorporadoras passaram a buscar mais o mercado de capitais para financiar suas atividades, diz Fábio Cascione, sócio do Cascione Advogados. Como em alguns casos não há o mesmo nível de controle de processos de uma empresa grande, elas acabam sofrendo com questões como o atraso no cronograma dos empreendimentos.

“Os casos de reestruturação que temos acompanhado têm relação com atraso nas obras. Esse é um problema que afeta todas as empresas do setor, mas vejo que na pequena e na média, os investidores são mais sensíveis”, explica Cascione.

 

No geral, fundos que investem em CRIs têm entrado nas discussões dispostos a encontrar uma solução para a conclusão das obras, relata Magalhães. “O principal interesse não é assumir um prédio inacabado, mas conseguir o retorno do investimento.”

Valle, da Habitasec, diz que nas operações da securitizadora não há casos de “default” por causa da falta de acordo entre investidores e devedores. “As conversas entre tomadores de recursos e fundos têm sido tranquilas”, afirma.

 

Emissores de papéis que ficam concentrados em fundos costumam ter uma resposta mais rápida em processos de reestruturação. “Os papéis que estão pulverizados no mercado, nas mãos de muitos investidores pessoa física, acabam demorando mais para serem negociados, para que seja realizada uma assembleia. Quando estão em fundos, o processo é mais rápido”, diz Felipe Ribeiro, sócio e diretor de investimentos alternativos do Clube FII.

Apesar do aumento da necessidade de negociações, Magalhães, da Virgo, não acredita que há um risco de inadimplência relevante para os investidores de CRIs. “Não necessariamente vai aumentar a inadimplência, mas algumas variáveis dos projetos precisarão ser administradas.”

 

No mercado de CRIs, em geral, houve um leve avanço da inadimplência nos últimos meses. O percentual de CRIs que registraram um evento de “default”, ou seja, atrasaram ou deixaram de pagar o serviço da dívida em abril ficou em 14,1%, segundo levantamento do Clube FII. Em dezembro, eram 13,6%. Na mesma base de comparação, a participação de CRIs com vencimento antecipado e não repactuado teve uma variação pequena, passando de 2,46% para 2,64%.

Procuradas pela reportagem, Zarin e Manhattan não comentaram as negociações com investidores. 

FONTE: VALOR ECONôMICO