Notícias

22/08/2022

Incorporadoras imobiliárias têm desafio de recuperar margem de lucro perdida no 2º tri (Valor Econômico)

No consolidado das incorporadoras, a margem bruta recuou 4,9 pontos percentuais sobre o mesmo período do ano passado, mostra levantamento do Valor Data

A queda na margem bruta marcou os balanços do segundo trimestre das incorporadoras de capital aberto em todos os segmentos de atuação. Enquanto os resultados operacionais, de vendas e lançamentos, vieram melhores do que o esperado por alguns analistas, os dados financeiros não esconderam o impacto da inflação e da taxa de juros. No consolidado das incorporadoras, a margem bruta recuou 4,9 pontos percentuais sobre o mesmo período do ano passado, mostra levantamento do Valor Data.

 

Companhias de todos os padrões de incorporação sentiram pressão nas margens, mas elas se dividem em dois grupos quanto às expectativas de reversão desse cenário. As mudanças anunciadas nos últimos meses no Casa Verde e Amarela (CVA), principalmente em julho, dão perspectiva de melhora mais rápida para as empresas do segmento econômico, afirmam analistas do setor.

Entre as listadas, se destacam Direcional, MRV, Plano&Plano, Cury e Tenda — a última ainda em situação delicada por um estouro no orçamento em 2021. No início do ano, elas enfrentavam mais dificuldade do que as companhias de médio e alto padrão, porque a população de baixa renda já sofria mais com a inflação e o CVA estava defasado, o que, aliado ao aumento do custo de produção, dificultava o ganho de preço nas unidades. Agora, o horizonte parece mais azul e há menos concorrência, lembra Hugo Grassi, analista de real estate do Citi Bank.

 

A dificuldade para produzir habitação econômica tirou empresas menores do jogo. “Tem janela que vai ser bem forte nesse próximo semestre, pode durar até 12 meses. Para quem tem pipeline engatilhado, permite momento em que podem aferir margem extraordinariamente alta em relação ao que tende a ser perene depois”, diz.

Em relatório, a equipe do Itaú BBA afirmou que os empresários do segmento econômico esperam aumento de ao menos 15% na demanda, com as medidas, o que deve ser capturado principalmente no último trimestre do ano.

As mudanças no programa foram sentidas apenas levemente no segundo trimestre. A MRV, por exemplo, perdeu 6 pontos percentuais de sua margem, na comparação anual. Em teleconferência com analistas, o copresidente Rafael Menin disse que a companhia demorou demais para subir os preços das unidades. Para ele, a margem do segundo trimestre, de 19,6%, está “ridiculamente baixa”.

 

A incorporadora divulgou um dado usado também por outras empresas para apontar que há mudanças a caminho, a margem bruta das novas vendas. Na MRV, o indicador foi de 25%, e a empresa quer elevá-lo a 30% até dezembro. Na Tenda esse dado foi de 28,8% no segundo trimestre. Já a margem bruta ficou em 12,2%, recuo de 14,5 pontos percentuais na comparação com o segundo trimestre do ano passado.

Fanny Oreng, head de real estate do Santander, ressalta que essa margem de novas vendas não necessariamente vai convergir para a margem consolidada.

Entre as econômicas, quem se deu melhor no quesito margem foi a Cury, que recuou apenas 0,3 ponto percentual, para 35,8%, na comparação anual.

 

Oreng analisa que as margens das incorporadoras de baixa renda devem melhorar mais a partir do ano que vem, e, apesar do CVA ajudar, o principal motor será a queda no custo da construção. No momento, ao menos uma estabilização do preço dos materiais já é sentida pelos executivos. “As empresas estão falando que o aço parou de subir, teve até leve queda, e outros componentes também estão arrefecendo. O cimento ainda está muito alto, é a maior questão, mas o aço puxa a cadeia”, afirma.

 

Gustavo Cambaúva, sócio e analista de real estate do BTG Pactual, lembra que a queda no preço dos combustíveis e o dólar relativamente mais baixo também podem ajudar a reduzir a inflação setorial.

A queda no custo da construção é esperança para a melhora das margens também no médio e alto padrão, que sofre igualmente com a pressão sobre o indicador. No entanto, não há um incentivo como o do CVA, o que torna a situação mais complicada. Para os analistas, as margens do segmento vieram até piores do que já era esperado.

 

As empresas de médio e alto padrão precisam se preocupar ainda com o estoque. “Não é que tem muito estoque pronto, mas todo mundo lançou muito e vendeu menos do que lançou”, explica Cambaúva. Para ele, as incorporadoras deveriam lançar menos no segundo semestre, em comparação com o mesmo período do ano passado. “Todo mundo vai dosar um pouco mais os lançamentos com a velocidade de vendas”, diz.

O estoque elevado exige esforços de venda que demandam dinheiro, o que pressiona as margens. Ao mesmo tempo, a venda de unidades antigas também puxa a margem para baixo, mas não vendê-las é igualmente ruim, porque carregam custos de condomínio, IPTU e manutenção, além do próprio capital investido, que fica parado.

 

“Essa maior flexibilidade na precificação e mais esforço de venda, acompanhada de mais despesa de publicidade, parece ser uma temática central", afirma Grassi. Ele cita a Even como exemplo de incorporadora que já refletiu isso em seu balanço. Contribuiu para a perda de 3,4 pontos percentuais na margem (de 25%), ante o mesmo período do ano passado, um evento de vendas com descontos da Melnick, sua subsidiária no Sul. Segundo o analista, esse tipo de evento será cada vez mais comum em empreendimentos de padrão médio e nos compactos.

 

As companhias de médio e alto padrão se esforçaram em aumentar o preço das unidades para combater a inflação, mas isso custou velocidade de venda. Agora, é hora de equilibrar essa conta. Também é esperado que os lançamentos do terceiro trimestre ocorram com mais cautela e volume menor do que no mesmo período de 2021.

 

Um complicador para o segundo semestre é que ele será mais curto para vendas e lançamentos, por causa da eleição e da Copa do Mundo, que podem interferir na vontade dos consumidores de irem aos estandes. “Eventualmente, até em setembro as empresas vão dar uma segurada, se tiver aquela discussão política fervorosa como na eleição passada”, diz Cambaúva. Ele afirma que as companhias tentaram adiantar lançamentos no primeiro semestre, já vislumbrando essas dificuldades.

 

Para o analista, as margens das incorporadoras de médio e alto padrão devem se manter no patamar atual por mais tempo. “É um patamar ok, mas pior do que nos últimos dois anos”, diz. Oreng ressalta que ao menos as empresas do setor estão mais maduras e encaram a situação atual de forma realista. “Quem estava muito pessimista ou otimista ficou mais balanceado”, afirma.

 

Matéria publicada em 21/08/2022

FONTE: VALOR ECONôMICO