Notícias

20/04/2023

Incorporadoras miram programas regionais para baixa renda (Valor Econômico)

O apoio estadual ou municipal pode reduzir as prestações e fazer o financiamento caber no bolso

Incorporadoras que atuam no segmento de baixa renda - como Tenda, Direcional e Plano&Plano - estão de olho em programas habitacionais que têm surgido Brasil afora para tentar desbloquear a demanda do público com menor renda e diante de um cenário econômico mais adverso para a compra de imóveis.

 

Os programas são semelhantes ao Casa Paulista, do governo do Estado de São Paulo, em que o poder público entra com um complemento à entrada que a família vai dar na compra de unidades do Minha Casa, Minha Vida. O apoio estadual ou municipal viabiliza uma redução das prestações e faz o financiamento caber no bolso.

 

Já há iniciativas como essa sendo tocadas pelos governos dos Estados do Paraná, Mato Grosso, Goiás e Distrito Federal, além da prefeitura de Belo Horizonte. Há duas semanas, Porto Alegre também aprovou a criação de um programa habitacional. O Pipeline apurou que Pernambuco tem discutido lançar algo nessa linha e, segundo o presidente da Abrainc (Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias), Luiz França, há uma série de prefeitos que tem manifestado às empresas interesse em ter o próprio projeto.

 

Para as companhias, o complemento que os governos estaduais ou municipais oferecem aos compradores acaba baixando a régua do público que consegue entrar em um financiamento do MCMV. Uma conta feita pela Tenda aponta que, a cada R$ 10 mil em subsídio, é possível reduzir em R$ 500 a renda mensal mínima para uma família se habilitar, de R$ 3 mil para R$ 2,5 mil, por exemplo.

“É algo que tem o potencial para dobrar a quantidade de famílias que podem virar clientes”, diz o CEO da Tenda, Rodrigo Osmo. Praticamente todos os empreendimentos da companhia se enquadram no MCMV.

 

O apoio dos governos regionais tem variado entre R$ 10 mil e R$ 20 mil para cada comprador e se soma ao subsídio do MCMV, que tem orçamento de R$ 9,5 bilhões. “Só o programa do Paraná tem verba de R$ 450 milhões. Se todos os 27 Estados tivessem um programa, imagina o quanto você consegue multiplicar os R$ 9,5 bilhões do governo federal”, provocou Osmo.

 

Segundo o executivo, como há muitos Estados e municípios de olho em ter a própria iniciativa, está em discussão em Brasília a criação de modelo padrão que possa ser replicado por todas as regiões, o que facilitaria a vida da Caixa Econômica Federal, responsável por financiar os imóveis do MCMV.

 

“Se cada município ou Estado criasse o seu com uma característica diferente, a gestão da Caixa seria uma loucura, porque são mais de 5 mil municípios e 27 unidades da federação”, disse o CEO da Tenda. E, com esse modelo padrão, quem não tem estrutura para implementar algo do tipo poderia se beneficiar. “Cidades como Sorocaba ou Piracicaba conseguiriam aderir.”

 

O CEO da Direcional, Ricardo Gontijo, também tem notado que cidades e Estados estão mais interessadas em ter programas como o Casa Paulista. Ele considera que esse modelo tem mais potencial para atrair demanda para o mercado do que o Pode Entrar, programa do município de São Paulo que tem outro formato: a prefeitura banca 100% da compra das unidades e depois as revende, com subsídio.

 

Embora veja o Pode Entrar como uma grande sacada do prefeito Ricardo Nunes, porque permite diminuir a renda mínima para conseguir financiar um imóvel, Gontijo avalia que o modelo do Casa Paulista dá mais eficiência ao dinheiro público investido.

 

Por exemplo, em vez de o poder público gastar R$ 200 mil para comprar uma unidade que será revendida, o mesmo valor pode ser usado para dar 10 complementos de R$ 20 mil para 10 famílias, que terão ainda os recursos do FGTS.

Enquanto monitoram o surgimento de programas habitacionais regionais, as incorporadoras aguardam a decisão que será tomada nesta quinta-feira (20) pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e que pode limitar o MCMV.

 

A corte vai julgar uma ação que pede alteração na taxa de correção monetária do FGTS, que hoje está em TR+3% e pode passar a algum indicador de inflação. Como os recursos do fundo servem para financiar as operações da Caixa no mercado imobiliário, se a taxa subir, os juros cobrados no MCMV também acabariam sendo elevados. De um lado, isso pode reduzir a demanda do público de baixa renda pela compra de imóveis. Por outro, pode aumentar a importância de programas regionais para complementar o MCMV.

 

Caso se multipliquem pelo país, os programas podem ajudar as incorporadoras a atravessar um momento que já está difícil para o setor. Com a Selic em patamar de 13,75% ao ano e ainda sem ceder, a demanda pelo financiamento imobiliário está estrangulada, e as companhias têm pensado duas vezes antes de lançar um empreendimento - até porque a inflação elevada pressionou os custos de construção nos últimos dois anos.

 

Na Tenda, o número de unidades lançadas no primeiro trimestre caiu 2% em relação a igual período do ano passado. Por outro lado, as vendas líquidas cresceram 20% - o que, para os analistas do Credit Suisse, sugere o início de um “turnaround” há muito esperado. A mesma dinâmica se repetiu na Direcional: enquanto os lançamentos recuaram 2,4%, as vendas líquidas tiveram aumento de 25%.

 

Para a analista Fanny Oreng, do Santander, os programas habitacionais em discussão pelo Brasil ajudam a compor a visão construtitva que o banco tem para o setor. “Esperamos distratos menos expressivos do que nos últimos anos, estabilização de custos, as empresas retomando rentabilidade e a população com mais acesso.” 

FONTE: VALOR ECONôMICO