Inflação e juros em alta devem reduzir o poder de compra de imóveis pelos consumidores, na avaliação das incorporadoras. O setor continua otimista em relação ao médio e ao longo prazos, mas há expectativa de encolhimento do mercado em 2022. As empresas acreditam que crise será passageira e tende a ser menos acentuada do que as turbulências que se seguiram ao ciclo anterior de alta, ocorrido entre 2007 e 2014.
“O mercado imobiliário terá um grau de atividade menor, mas continuará a existir”, afirmou o presidente da Even, Leandro Melnick. O executivo ressaltou que as projeções para os anos futuros estão muito diferentes daquelas de quando 2021 se iniciou. “Não imaginávamos que iria haver juros tão altos. Ao custo de construção se soma o dos juros para o consumidor”, disse. Para Melnick, o mercado imobiliário “voltará forte” em dois ou três anos, após viver instabilidade no curto prazo.
No entendimento do presidente da Moura Dubeux, Diego Villar, a crise não será “muito duradoura”, considerando-se que as incorporadoras não têm nível elevado de estoques. “Entramos numa crise de curto prazo em um momento em que estamos menos alavancadas e com baixo estoque. Na última crise, foi diferente”, comparou. Villar disse continuar otimista com o mercado. “Haverá um hiato, mas mais curto”, afirmou.
O período de juros baixos possibilitou, segundo o presidente da EZTec, Flávio Zarzur, que os estoques de imóveis fossem “desovados”. Em 2020 e no primeiro semestre deste ano, o financiamento imobiliário permitiu que muitas pessoas comprassem, de acordo com Zarzur, imóveis com valores acima das respectivas capacidades de pagamento.
Para o copresidente da MRV&Co, Eduardo Fischer, pode haver um encolhimento do mercado imobiliário de baixa renda em 2022 e 2023. É possível que haja disponibilidade de financiamento com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), de acordo com Fischer, mas a “inflação muito alta corrói o poder de compra da população”. A MRV Engenharia é a maior incorporadora do Brasil e a principal com atuação no Casa Verde e Amarela.
A demanda por imóveis de baixa renda não é problema, destacou o copresidente da MRV, devido ao elevado déficit habitacional. Por outro lado, houve elevações dos custos de produção e de crédito, não acompanhada da renda das pessoas. A MRV espera ter crescimento, em 2022, considerando-se que o mercado voltado para a baixa renda “irá se esvaziar”, com concorrentes de menor porte deixando de atuar diante de custos pressionados.
No atual cenário, tem sido um desafio “fechar a conta para a companhia e para o cliente”, segundo o presidente da RNI Negócios Imobiliários, Carlos Bianconi. “É hora de olhar para o projeto, rever a metragem, a área útil, a área total e tentar fechar a conta”, disse. A RNI atua em cidades do interior de São Paulo e da região Centro-Oeste, com economia puxada pelo agronegócio.
Com o aumento dos custos de construção, a RNI elevou a renda mínima dos clientes buscados. A incorporadora atua no grupo 3 do Casa Verde e Amarela e no segmento econômico com valores logo acima do programa habitacional. “Vai haver desassistência momentânea [de imóveis para faixas mais baixas do programa] no Brasil”, afirmou o presidente. Ele ressaltou que há uma fatia importante da população “sem conseguir acessar o mercado habitacional”.
A EZTec dará prioridade, no próximo ano, ao lançamento de grandes projetos, com preço por m2 de R$ 8 mil a R$ 9 mil. Segundo o presidente, o que vai “nortear” a incorporadora serão as rendas média e média-alta. A produção para a alta renda deve ganhar força no segundo semestre, quando o cenário político começará a ser definido. “Temos uma situação muito confortável de caixa e um banco de terrenos diversificado. Vamos lançar um mix de produtos conforme a demanda e a capacidade de colocá-los no mercado”, disse Zarzur.
A Moura Dubeux espera elevar lançamentos e vendas, em 2022, mesmo com o mercado mais desafiador. A região Nordeste, onde a incorporadora concentra sua atuação, continua “desabastecida” de imóveis em relação à demanda, segundo Villar.
Levando-se em conta a inflação, os preços dos imóveis ainda estão inferiores aos do último ciclo de crescimento do setor, segundo o presidente da Even. “O mercado está mais maduro, com nível de estoques menor. As empresas estão mais capitalizadas e com melhora significativa da gestão”, afirmou Melnick. Não há expectativa de aumento dos distratos, considerado o maior problema do ciclo anterior. Outro ponto citado pelo presidente da Even foi que a “segunda onda” de oferta inicial de ações (IPOs) de incorporadoras não se realizou.
Os executivos participaram do evento Expectativas do Mercado Imobiliário para 2022, realizado pela consultoria Brain.