A melhora operacional vivida pelas incorporadoras de imóveis a partir do segundo semestre de 2018 começa a se refletir nos balanços financeiros, principalmente daquelas voltadas para a média e alta renda. Boa parte das empresas apresentou crescimento da receita, aumento das suas margens e, consequentemente, melhor desempenho no resultado líquido no primeiro trimestre. A tendência é de continuidade desse desempenho, considerando que a receita é contabilizada conforme o avanços das obras iniciadas. Além disso, espera-se que as vendas nesse segmento continuem firmes, apesar de a economia mostrar sinais de desaceleração.
As incorporadoras de capital aberto saíram de prejuízo líquido de R$ 434,8 milhões, no primeiro trimestre do ano passado, para uma perda de R$ 43,3 milhões, segundo levantamento realizado pelo Valor Data. Foram incluídos dados da CR2, Cyrela, Direcional Engenharia, Even Construtora e Incorporadora, EZTec, Gafisa, Helbor, MRV Engenharia, PDG Realty, RNI Negócios Imobiliários, Rossi Residencial, Tecnisa, Tenda, Trisul e Viver Incorporadora. Se não fosse o prejuízo da PDG, de R$ 240,3 milhões, o setor teria apresentado um lucro de R$ 197 milhões.
A receita líquida consolidada cresceu 31,3%, para R$ 4,59 bilhões, e a margem bruta setorial aumentou de 25,3% para 28%. A saúde financeira de parte das companhias, como PDG, Viver Incorporadora, Rossi, Gafisa e Helbor ainda não foi equacionada. A alavancagem do setor medida por dívida líquida sobre patrimônio líquido cresceu de 49,9%, em janeiro a março de 2018, para 52,9% no primeiro trimestre deste ano.
Depois de alguns anos de retração decorrente da piora da economia e do aumento dos distratos, o segmento de média e alta renda viveu seu ponto de inflexão operacional no segundo semestre de 2018, principalmente após as eleições majoritárias. "O setor vive uma recuperação, mas estamos longe de ter um boom", afirma o analista do mercado imobiliário do Santander, Renan Manda. Ele acrescenta que as incorporadoras lançavam o dobro do patamar atual no início da década.
Nos próximos trimestres, as margens das empresas desse segmento tendem a melhorar devido à contribuição maior dos novos projetos lançados - mais rentáveis do que os antigos - na composição do indicador, além da continuidade da redução dos distratos. O analista do setor imobiliário do BTG Pactual, Gustavo Cambaúva, pondera que uma melhora mais expressiva da rentabilidade ocorrerá daqui a dois anos, em decorrência da contabilização da receita pelo setor à medida que as obras avançam,.
Apesar dos bons dados operacionais que vieram neste trimestre, o mercado monitora os efeitos sobre as vendas da queda da confiança em uma retomada mais pujante da economia do país. Por exemplo, em que momento se verá um recuo no nível de desemprego. Em São Paulo - maior mercado imobiliário do país -, as visitas aos plantões de vendas de empreendimentos de média e alta renda caíram, desde o mês passado, conforme relatou ao Valor, recentemente, o presidente do Secovi-SP, Basílio Jafet.
As incorporadoras informaram na divulgação dos balanços que o desempenho de vendas continua bom no segundo trimestre. Mas, uma analista setorial pontua que Cyrela, Even e EZTec têm sinalizado leve piora na comercialização de estoques devido à confiança menor, mas que a venda de lançamentos não foi afetada.
A combinação de demanda por imóveis, vendedores de terrenos menos flexíveis nas negociações e aumento de custos de produção dos projetos por causa da nova Lei de Zoneamento da cidade de São Paulo tem resultado na volta de expectativa de valorização dos preços de imóveis.
"Com a redução do volume de estoques e os valores dos insumos começando a subir, a tendência de alta é clara, mas o momento dependerá do desempenho da economia", diz Cambaúva, do BTG Pactual. O analista do Santander pondera que a demanda está se recuperando, mas ainda há muito estoque pronto. "Os preços não vão se recuperar tão rapidamente", diz Manda.
No trimestre, as incorporadoras lançaram, em conjunto, projetos com Valor Geral de Vendas (VGV) de R$ 3,84 bilhões, com aumento de 71% ante os R$ 2,24 bilhões do mesmo período do ano passado, considerando-se a parte própria nos empreendimentos.
A MRV - maior incorporadora do país - respondeu por lançamentos de R$ 1,09 bilhão, ou seja, por 28,5% do que foi apresentado pelo setor, mas as maiores expansões foram apresentadas pelas empresas com atuação principal em imóveis de médio e alto padrão - Cyrela, Even, EZTec e Trisul. Na Even, a alta de 15 vezes nos lançamentos, para R$ 785 milhões resultou, principalmente, do lançamento do Fasano Itaim - Residencial, em São Paulo, com VGV de R$ 578,7 milhões.
De janeiro a março, as vendas líquidas consolidadas de imóveis cresceram 22,5%, para R$ 4,23 bilhões. Com menos entregas de empreendimentos, os distratos encolheram 41,6%, para R$ 754,4 milhões.
Ancorado pelo programa residencial Minha Casa, Minha Vida, o segmento de baixa renda sentiu menos, nos últimos anos, os efeitos negativos da crise econômica do que o de médio e alto padrão. No primeiro trimestre, porém, foi mais difícil para as incorporadoras de baixa renda repassar os recebíveis dos clientes para a Caixa Econômica Federal, o que impactou a geração de caixa. Ainda assim, MRV e Tenda aumentaram lançamentos na comparação anual.
"A Caixa está mais restritiva nos critérios de aprovação de crédito, mas os resultados mostraram que as empresas conseguiram amenizar o impacto em suas operações", diz o analista do Santander. Outro analista setorial afirma que a MRV foi a surpresa positiva entre as incorporadoras com foco na baixa renda. "A MRV encurtou seu ciclo de construção e, em um período menor, conseguiu contabilizar mais receita", afirma o analista.
A incorporadora mineira respondeu pela maior receita do setor, com R$ 1,5 bilhão, e pelo maior lucro, de R$ 188,7 milhões.