A elevação das taxas de Juro básicos ao redor do mundo tem provocado uma perda de fôlego do mercado imobiliário em diversos países, inclusive em economias maduras como nos Estados Unidos. No Brasil, também há uma desaceleração em curso, embora o mercado local conte com artifícios para amortecer o pouso do juro alto. A resposta está no modelo dos financiamentos, de acordo com especialistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast.
Nos Estados Unidos, as famílias têm amargado uma perda relevante no poder de compra porque o país vem assistindo a uma elevação expressiva no valor das moradias e, principalmente, nas parcelas dos financiamentos – esta última reflete a subida dos juro básico pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) para conter a inflação. Veículos de imprensa internacionais têm ressaltado que já há sinais de uma “crise de acessibilidade” a financiamentos imobiliários na maior economia do mundo.
“Tanto as taxas de financiamento quanto os preços das casas subiram muito em um curto espaço de tempo”, avalia o economista-chefe da Associação Nacional de Corretoras (NAR, na sigla em inglês), Lawrence Yun. “A queda na acessibilidade está afetando os potenciais compradores de casas.”
Em junho, os números do mercado imobiliário por lá foram piores que o esperado. A quantidade de construções iniciadas no mês recuou 2% em relação a maio, enquanto a previsão era de alta de 1,4%, levando o total de unidades a 1,559 milhão, o ritmo mais lento desde setembro de 2021. Em um ano, a queda chegou a 6,3%, o segundo mês consecutivo de baixa.
Já nas vendas de imóveis usados, houve retração de 5,4% em junho ante maio, segundo dados da Associação Nacional de Corretoras nos Estados Unidos (NAR, na sigla em inglês). Este foi o quinto mês seguido de baixa, e o ritmo mais lento de vendas em dois anos, segundo a NAR. Na comparação com junho do ano passado, o quadro fica ainda pior: as vendas de moradias usadas diminuíram 14,2%.
A baixa nas vendas tem se refletido em demanda menor por crédito imobiliário. Os pedidos de empréstimos nos EUA caíram 6,3% na semana encerrada em 15 de julho, de acordo com a Associação dos Banqueiros Hipotecários (MBA, na sigla em inglês). Esta foi a terceira semana consecutiva de baixa, levando os financiamentos ao nível mais baixo no país desde 2000.
Enquanto as vendas e os financiamentos caem, os preços dos imóveis seguem em alta nos EUA, o que torna mais distante a compra de uma casa para as famílias norte-americanas. O preço médio de casas usadas teve aumento de 13,4% em junho na comparação anual, para US$ 416 mil, um novo recorde.
Esse conjunto de indicadores negativos aponta para uma tendência de queda ainda maior nas vendas, estima a consultoria britânica Capital Economics. A previsão é de vendas de 4,8 milhões de imóveis em 2022 – número não tão distante do piso de 4,1 milhões registrado em 2008, ano da bolha. Em junho, esse patamar já estava rodando a 5,12 milhões anualizados.
“Com a perda de acessibilidade parecendo tão esticada quanto a crise financeira global, o sentimento do comprador de imóveis está em um poço, o que aponta para uma queda ainda maior nas vendas”, diz o analista da Capital Economics, Sam Hall.
Juro em alta
O impacto no setor imobiliário já era esperado em Wall Street. “O mercado residencial é o setor mais sensível às taxas de juro da economia, e as taxas mais altas devem ajudar a desacelerar as vendas”, avaliam os economistas Isfar Munir, Andrew Hollenhorst e Veronica Clark, do Citi.
Pesa, sobretudo, o processo de aperto monetário por parte do Fed sob a pressão da maior inflação no país desde 1981. Nesta semana, uma nova subida de juros deve acelerar ainda mais o processo de esfriamento do setor imobiliário local. Depois de aventar uma alta de 100 pontos-base em meio à disparada da inflação nos EUA, Wall Street aposta que o Fed promova uma nova elevação de 75 pontos-base no encontro de julho, empurrando os Fed Funds, que são os juros básicos do país, para a faixa de 2,25% a 2,50% ao ano.
“O Fed quer esfriar a demanda e, embora não haja evidências de rachaduras no consumo ou no emprego, eles estão claramente tendo sucesso no setor imobiliário, que é o setor mais sensível às taxas de juros da economia”, afirmam Aneta Markowska e Thomas Simons, do norte-americano Jefferies.
Matéria publicada em 26/07/2022