Por Rafael Marko
Espremidas entre os aumentos dos custos dos insumos e do financiamento da construção, e os valores que as famílias efetivamente podem pagar pela aquisição de imóveis, construtoras e incorporadoras têm sentido dificuldades em viabilizar novos empreendimentos. Somam-se a isso a dificuldade de acesso das empresas ao crédito, os juros ainda elevados e a expectativa de alguns compradores de imóveis de que valeria a pena aguardar uma queda maior dos juros.
Esta foi a percepção expressa por integrantes da Reunião de Conjuntura do SindusCon-SP, conduzida em 8 de novembro por Eduardo Zaidan, vice-presidente de Economia da entidade, com a participação do presidente Yorki Estefan.
Zaidan comentou que o custo de produção de um imóvel está cerca de 60% maior, comparado ao daquele anterior à pandemia. Estefan assinalou que a lucratividade cada vez mais reduzida tem sido a maior queixa da indústria imobiliária. Odair Senra, vice-presidente de Imobiliário, atribuiu o baixo volume de lançamentos à dificuldade de o empresário chegar a um preço de venda em função do aumento dos custos. Renato Genioli, vice-presidente Administrativo, observou que, embora o volume de vendas tenha se elevado, o VGV (Valor Geral de Vendas) tem diminuído.
Zaidan ainda criticou o texto da reforma tributária aprovado na véspera na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Segundo o vice-presidente, o grande número de exceções à alíquota geral do IVA (Imposto sobre Valor Agregado) levará a uma alíquota alta, a reforma terá modificações a cada quatro ou cinco anos, sua implementação se dará em prazo muito longo e seus resultados serão desconhecidos. Isso dificilmente conduz a termos um cenário arrecadatório coerente com uma política fiscal, observou.
Zaidan comentou que não se pode afirmar que a elevação da Bolsa, a inflação abaixo de 5% ao ano e o petróleo em baixa sejam “o novo normal”. Ele reiterou sua preocupação com a situação fiscal: “Enquanto não avançarmos na modernização do Estado e na melhoria do gasto público, continuaremos vivendo com sobressaltos.”
Eduardo Capobianco, representante do SindusCon-SP na Fiesp e vice-presidente daquela Federação, lamentou a estimativa de apenas 1,5% de crescimento para o PIB em2024. Segundo ele, o foco principal da agenda nacional deveria ser uma discussão sobre como fazer o país crescer de forma contundente, entre 5% e 6% ao ano, em um ciclo de longo prazo.
Cenário da construção
Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas), mostrou em sua apresentação que, no terceiro trimestre, as vendas do comércio de materiais tiveram ligeira elevação, diferentemente da indústria desses insumos. Já as vendas de cimento seguiram em ligeira queda, esta mais acentuada na produção do insumo.
Na construção, houve queda no saldo líquido no emprego no país, mais forte no segmento de edificações. Mas no ano, o acumulado até o final de setembro registrou aumento do emprego no setor de 7%, com destaque para a elevação das contratações nas obras de infraestrutura, informou Ana Castelo.
Já no Estado de São Paulo, prosseguiu a economista, o destaque no emprego no terceiro trimestre foi o segmento de edificações, que, entretanto, mostra ligeira queda no acumulado em 12 meses. Na cidade de São Paulo, o setor de edificações mostra o melhor desempenho neste quesito, seguido da infraestrutura.
No terceiro trimestre, as vendas imobiliárias tiveram um desempenho bastante positivo no município de São Paulo, enquanto os lançamentos continuaram caindo. O mesmo ocorre no acumulado do ano. As mesmas tendências ocorreram no país. No Interior de São Paulo, as vendas tiveram desempenhos positivos ou negativos, dependendo da região, enquanto os lançamentos caíram. A habitação econômica tem a perspectiva de ganhar participação mais significativa no mercado, segundo Ana Castelo.
O crescimento dos preços dos imóveis tem desacelerado no ano. Na cidade de São Paulo, houve uma aceleração no terceiro trimestre. Já os custos da construção não declinaram tão significativamente quanto nos trimestres anos anteriores. Os preços das commodities ainda não sofreram impacto significativo no cenário internacional, embora haja incerteza em relação ao que acontecerá daqui para diante. De maneira geral, espera-se que as commodities não tenham elevação significativa de preços, afirmou.
Em relação às maiores dificuldades enfrentadas pelas construtoras no país, demanda insuficiente e escassez de mão de obra destacam-se no topo do ranking. Entre as construtoras, as menos pessimistas em relação à demanda prevista são as de instalações e de edificações residenciais. A construção ainda segue sendo o setor menos pessimista, na comparação com os demais setores da atividade econômica. As famílias com maior poder aquisitivo são as que se mostram mais otimistas, mostrou Ana Castelo.
Cenário econômico
Robson Gonçalves, professor da FGV, disse não acreditar que a elevação da Bolsa, a inflação reduzida e a baixa do preço do petróleo indiquem o que acontecerá no longo prazo. Ele mostrou que há queda na taxa de juros no Brasil, mas a estabilização do volume de serviços prestados às famílias e de vendas no varejo nos últimos meses denota que ainda poderemos ter baixo crescimento econômico em 2024.
A isso, acrescentou, segue-se a incerteza em relação à política fiscal. Se esta for mais frouxa, com grande volume de gastos, haverá crescimento da dívida pública, pressionando mais os preços, e o Banco Central poderá ser obrigado a encerrar o ciclo de queda dos juros mais cedo e colocar o piso da Selic mais alto. Gonçalves criticou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por haver contraditado o ministro Fernando Haddad em relação ao déficit zero, e questionou se seu recente posicionamento em relação à defesa da estabilidade fiscal realmente acontecerá.
O economista propôs a retomada da proposta de criação de um escritório privado que estude a viabilidade de grandes projetos de infraestrutura, apontando onde haveria ganhos para investidores e seu impacto para a economia. Segundo ele, isso daria aos investidores clareza, e foi o que a China fez com sucesso. Criticou ainda o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), considerando que 50% dele é puro marketing, sem fundamentação na estruturação e na gestão de projetos.
(Matéria publicada em 08/11/2023)