Novos conceitos e necessidades surgiram neste momento de pandemia, e o mercado imobiliário é um exemplo. Com mais pessoas em casa, os valores mudaram, e ter espaços maiores ou mais bem aproveitados passou a fazer parte dos planos de muitas pessoas daqui para frente.
Um canteiro de obras em Mogi das Cruzes não parou desde o início da quarentena. A obra começou em abril e está prevista para ser entregue em 2022. Serão 200 unidades em três torres, em um complexo que tem até empreendimentos comerciais.
“Ao longo dos meses, a gente percebeu um movimento maior de vendas, independentemente de os estandes estarem abertos. Depois que os estandes reabriram, as vendas cresceram. A gente estima que tenha crescido em torno de 40%, comparado ao período pré-pandemia, porque as pessoas estão realmente buscando comprar um imóvel agora. Tem mais gente comprando. Tivemos uma procura maior, não só por conta da necessidade das pessoas de buscar um imóvel novo, o que é normal acontecer, mas também pela condição de compra melhor hoje”, disse Roberto Viegas, diretor de assuntos corporativos de uma construtora.
De acordo com a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança, em junho, os bancos financiaram R$ 9,27 bilhões, valor 29,9% maior em relação a maio e 52,8% superior se comparado com junho do ano passado. Mesmo que a pandemia tenha mudado a rotina nos estandes, quem vende está contente com o resultado.
“O que tenho percebido são pessoas que estão comprando para moradia. É uma família de quatro pessoas, como um casal com dois filhos. Eu também tive procura de pessoas que estão vendo oportunidades de investimento nesta fase. Tive bastante procura de pessoas que estão vendo a oportunidade, a taxa Selic baixa, a taxa de juros bancários tão favorável como nunca esteve. Então tenho uma procura de ambos os perfis”, contou a corretora Cristina Akiko.
Hoje, a Selic está em 2% ao ano. É o patamar mais baixo desde 1999. A taxa básica de juros é uma das que ditam as regras, por exemplo, de financiamentos imobiliários.
A FGV fez um cálculo, e o exemplo é um imóvel de R$ 250 mil, financiado 80% do valor e com 20 anos para pagar. No Sistema de Amortização Constante, o SAC, no final do período, o imóvel custaria pouco mais de R$ 350 mil. Se a conta fosse feita em 2016, nas mesmas condições, mas com a Selic da época, o valor total seria de aproximadamente R$ 444 mil.
Esse cenário pode ajudar a construção civil a recuperar resultados negativos dos últimos anos. Para Wilson Cruz, que é sócio-proprietário de outra construtora, o termômetro das vendas ainda não esquentou.
“Hoje, ninguém vai mais aplicar dinheiro em bancos ou em financeiras, porque vai perder para a inflação. Está devagar, mas acho que tende a melhorar bastante”.
No primeiro semestre do ano, foram vendidos 160 mil imóveis em todo o país. O volume é 24,4% superior ao comercializado em 2019.
Só em Mogi das Cruzes, na comparação de janeiro a julho deste ano com o mesmo período do ano passado, o aumento foi de quase 53%. Além disso, o setor da construção civil também sentiu a mudança no perfil do cliente. Muitas pessoas têm dado preferência pra imóveis maiores, de três dormitórios, por exemplo.
Mas a pandemia também mexeu com a vida de famílias que estavam com o imóvel prontos. Como as pessoas passaram a ficar mais tempo em casa, cresceu a procura por arquitetos. Profissionais que ganharam a missão de criar novos ambientes ou adaptar alguns cômodos que já existiam. Quem tem criança em casa, por exemplo, precisou criar um canto para o estudo.
É o que Saulo Barboza faz. Ele é arquiteto e ajuda os clientes na missão de planejar a casa. Desde o início da quarentena, Saulo viu o número de clientes crescer.
Boa parte dos projetos é para uma adaptação, obras ou mudanças pequenas. Reflexo não só da rotina que está diferente, mas da economia, que pode apresentar resultados melhores daqui para frente.
“Com certeza o mercado de construção já aponta um crescimento novamente. O Brasil ainda é um país muito carente de moradia. Muitas pessoas precisam ter uma casa própria. Tem muito o que se fazer no país. Então acredito em um crescimento ainda neste ano”.
Quem trabalha na área da construção civil acredita que não vai reviver o 'boom' imobiliário de 2006. Por melhores que sejam os resultados desta vez, a realidade deve ser diferente.
“A gente acredita que, hoje, o mercado está mais maduro. Ele tende a crescer, mas não naquele patamar que vivemos anos atrás, em que havia uma explosão de mercado. Temos que imaginar que temos que crescer de maneira segura. O mercado imobiliário é uma atividade bastante longa. Demora de seis a sete anos desde você conceber o empreendimento, entregá-lo pronto e dar toda a assistência para o cliente. Se a gente lança muito produto e o país enfrenta alguma dificuldade, isso gera um impacto enorme na sociedade. A gente tem que crescer, esperando que o país também cresça junto com o mercado, para que isso se torne harmonioso, a gente possa desenvolver novos produtos, e as pessoas tenham interesse em comprá-los. Acho que é isso que todo mundo busca”, falou Viegas.