O mercado imobiliário tem sido pouco afetado até aqui pelo avanço da pandemia de coronavírus, mas a situação tem chances significativas de mudar nos próximos dias. O movimento nos estandes ao longo do sábado e do domingo foi normal na capital paulista, dizem empresários, mas as obras podem ser paralisadas se a propagação da doença se intensificar no País.
“O mercado foi bem no fim de semana. Ainda não temos os números oficiais, mas sentimos que o movimento nos estandes não diminuiu em relação aos períodos anteriores. Foi um fim de semana como qualquer outro”, disse o presidente do Sindicato da Habitação (Secovi-SP), Basílio Jafet.
Procuradas, MRV e Cyrela também informaram que as operações como um todo estão normais. Outras empresas também foram procuradas, mas não comentaram.
Mesmo com o avanço da pandemia, as construtoras decidiram manter abertos os canteiros de obras na cidade, segundo o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon-SP), Odair Senra. “Não temos paralisação de obra até agora, mas essa determinação pode mudar a qualquer momento. Estamos preocupados e atentos às recomendações das autoridades”, disse.
Senra afirmou que a decisão por manter os canteiros foi tomada na tarde de segunda-feira, 16, em reunião da diretoria do sindicato via teleconferência. Poucas pessoas foram à sede do sindicato patronal, que passou a incentivar o trabalho remoto para os funcionários do escritório. No fim da tarde, o Sinduscon enviou aos associados um e-mail com recomendações de medidas preventivas para os canteiros.
Entre as medidas, estão a redução do contingente de pessoal nos canteiros por um período mínimo de 15 dias, aumento da limpeza de máquinas e equipamentos, redução do número de trabalhadores em elevadores e cremalheiras, maior oferta de álcool gel e mais orientações via folhetos, cartazes e palestras para pequenos grupos, entre outras ações. “Vamos seguir as medidas preventivas e fazer tudo que possa proteger os operários”, afirmou Senra.
Do lado dos trabalhadores, porém, o receio de se deslocarem de suas casas até os canteiros é crescente, e já foi feito o pedido para que as obras sejam interrompidas temporariamente. “Eu acho que já poderiam suspender a obra. Não dá para esperar muito mais. A situação é preocupante”, disse o presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil (Sintracon), Antônio Ramalho, ex-deputado estadual.
Mas uma paralisação pode gerar desemprego, admitiu. Boa parte das empresas do setor da construção é de médio ou pequeno porte, e não tem dinheiro em caixa para manter os trabalhadores em caso de paralisação da obra. A construção não é feita pela dona do projeto, mas sim por subcontratadas para tocar cada etapa específica, desde terraplanagem, passando por fundação, alvenaria, instalações elétricas e hidráulicas, acabamento, etc.
“Essas empresas são pequenas. Aí o dono me fala: ‘Ramalho, como é que eu vou pagar os operários se a obra parar?’. É uma situação difícil”, disse o presidente do sindicato dos trabalhadores. Ele disse que é hora de negociar medidas alternativas, como férias coletivas ou antecipação de pagamento aos empreiteiros pelas construtoras, que são o elo da cadeia produtiva com maior poder econômico. “Queremos chegar a uma solução todos juntos”.
Por sua vez, o presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz França, diz que não é necessário interromper os trabalhos agora. “Os canteiros não são lugar de aglomeração. Os operários trabalham distantes um do outro, em lugares arejados, o que reduz riscos de propagação do vírus”, afirmou.
A turbulência na economia brasileira já coloca em risco a previsão de expansão de 3% para o Produto Interno Bruto (PIB) da construção civil em 2020. Caso o nível de atividade no País sofra uma redução mais drástica, o Sinduscon considera revisar para baixo a perspectiva de avanço do setor.
Em 2019, o setor da construção interrompeu uma sequência de cinco anos de quedas consecutivas e registrou crescimento de 1,6% no PIB do ramo. A quantidade de pessoas empregadas na construção civil brasileira cresceu 3,53% em 2019, período em que foram abertos 80.270 postos. No Estado de São Paulo houve alta de 3,46%, com 21.581 novas vagas.