A faixa de menor renda do novo Minha Casa Minha Vida, reinserida após o fim do Casa Verde e Amarela, deve ser o principal foco da MRV (MRVE3). Em sua primeira versão, o programa ajudou a empresa a viver um crescimento importante, no início da década passada.
Mas, segundo Ricardo Paixão, CFO e diretor de Relação com Investidores da empresa, desta vez, a postura da empresa deve ser menos arrojada.
“A MRV (MRVE3) está num momento diferente daquele vivido em 2009. Naquela época, a empresa vivia um ciclo de crescimento importante, uma expansão geográfica grande. Obviamente, o programa habitacional deu um impulso extra e foi um combustível do nosso crescimento”, diz o executivo em entrevista exclusiva à Inteligência Financeira.
Redução de praças e aumento de vendas
Atualmente, a empresa tem reduzido o número de praças em que atua, embora busque ampliar a participação nas remanescentes.
O almejado aumento das vendas, se concretizado, deve vir principalmente de unidades de menor valor, incluídas na faixa um do Minha Casa Minha Vida, que foi excluída enquanto o programa havia sido substituído pelo programa Casa Verde e Amarela.
Paralelamente ao aumento das vendas, impulsionado pelo MCMV, a MRV conta com a queda no custo de materiais de construção e aumento no preço das unidades comercializadas para expandir suas margens.
Entre meados de 2020 e final de 2022, a empresa registrou aumento de custo de cerca de 40%, com os preços de venda subindo em magnitude muito inferior. Isso teve como resultado as piores safras da história da MRV (MRVE3).
Nesse período, a margem bruta foi de aproximadamente 16% a 17%, resultado classificado como “trágico” pelo CEO da empresa, Rafael Menin, durante teleconferência de resultados do segundo trimestre.
Impacto sobre as ações da MRV (MRVE3)
Assim, as ações da MRV (MRVE3) caíram de mais de R$ 13 em janeiro de 2022 a cerca de R$ 5,50 no seu pior momento, em março do ano passado.
Porém, os papéis da empresa reagiram e voltaram para a casa dos dois dígitos. Em agosto deste ano, chegaram a superar o pico de janeiro do ano passado com a melhora do cenário inflacionário e do mercado de consumo.
Segundo Paixão, a nova versão do Minha Casa Minha Vida é um diferencial para a MRV dar sequência à sua recuperação. A empresa aposta na sua capacidade de fazer redirecionamentos de terrenos para faixas mais demandas pelo programa.
Baixa renda em foco
Engajada nessa estratégia, a MRV, que tinha praticamente zerado suas áreas voltadas a unidades para rendas abaixo de R$ 2.600 por mês, passou a estabelecer 30% do seu banco de terrenos para a faixa um do Minha Casa Minha Vida.
“A gente tem um land bank muito robusto”, diz o executivo ao mencionar as propriedades adquiridas e ainda não construídas. “Então, a vantagem da MRV é ter a possibilidade de puxar mais ou menos projetos de determinadas faixas do programa na hora que for mais interessante”, diz.
Leia a entrevista na íntegra.
A MRV conta com o impulso do Minha Casa Minha Vida para reeditar o boom do início da década passada e um novo ciclo de altas na bolsa?
A MRV (MRVE3) está num momento diferente daquele vivido em 2009. Naquela época, a empresa vivia um ciclo de crescimento importante, uma expansão geográfica grande. Obviamente, o programa habitacional deu um impulso extra e foi um combustível do nosso crescimento.
Atualmente, a MRV tem vários outros segmentos e empresas. Então, nossa estratégia atual não é crescer. A gente não deve esperar um crescimento da companhia em número de unidades aqui na operação brasileira, mas vamos experimentar um crescimento importante de lucro, de margem bruta.
Além de subir o nosso preço acima da inflação, a gente também vai ter uma diluição importante de despesas gerais.
O governo Lula prevê 2 milhões de imóveis financiados via Minha Casa Minha Vida em 4 anos. Quanto a MRV está pronta para absorver disso?
A MRV Incorporadora tem apetite para pegar mais ou menos 40 mil unidades. Então, seria algo como 8% de marketshare por ano do programa.
Em termos de faturamento, 90% do faturamento é relacionado a imóveis financiados via FGTS, que são inseridos dentro do programa.
Como você avalia as diferenças de abordagem dos governos PT e Bolsonaro e dos seus respectivos programas, Minha Casa Minha Vida e Casa Verde e Amarela
Esse programa habitacional, Minha Casa Minha Vida, tem sido cada vez mais um programa de estado, muito mais do que um programa de governo. Então, independente do partido, a gente viu esse programa sempre muito robusto. O que a gente vê às vezes é um pouco de mudança de foco.
Por exemplo, o governo agora do PT (Partido dos Trabalhadores) está muito enfático em relação ao programa, o que é muito bom, e com ênfase maior nas primeiras faixas do programa, naquela população que é mais carente efetivamente.
Com as novas medidas, o governo consegue aumentar o volume e ao mesmo tempo deslocar o programa em direção das faixas de renda mais baixas, que seria até os dois salários mínimos, de R$ 2.640.
Nessa nova fase do programa, a MRV tende a apostar mais em determinadas faixas? Quais seriam?
A gente tem um land bank muito robusto. Então, a vantagem da MRV é, agora, ter a possibilidade de puxar mais ou menos projetos de determinadas faixas do programa na hora que for mais interessante.
Até junho, a faixa inicial (até R$ 2.640) era praticamente zero da nossa base, e atualmente estabelecemos que seria de 30%. Então, a gente conseguiu enquadrar mais projetos naquela faixa inicial por conta disso.
Quais os temores relacionados à inflação, tendo em vista que este fator pesou bastante contra a empresa em 2022?
A gente está menos preocupado com o cenário inflacionário para ser bastante sincero, porque dificilmente vão acontecer eventos tão trágicos quanto os que ocorreram nos últimos três anos.
A gente não consegue de hoje traçar um cenário onde a gente observe um aumento tão abrupto de preço, de insumo ou de matéria prima, como a gente viu, como a gente viu no último ciclo. A gente está vendo os preços andando de lado, assim, e as cadeias produtivas ainda não retomaram totalmente sua produção. Várias delas não estão operando na capacidade full.
Então acho que ainda tem espaço para poder crescer o mercado como um todo e ainda assim ter algum tipo de folga na relação entre preço de venda e custo.
Com relação aos juros, o que muda na estratégia da empresa com a perspectiva de que a Selic caia perto de 11% até o final do ano?
Os impactos (da queda dos juros) são diferentes em cada uma das linhas de negócio da MRV. Um dos exemplos é a linha Multifamily, que criamos para vender para fundos imobiliários.
A gente tem um acordo grande com a Brookfield, que tem comprado os nossos empreendimentos. À medida que os juros caíam, essa modalidade pode voltar a ser um bom veículo de saída para os projetos e dar lucro.
Outro ponto importante é que a queda da taxa de juros vai significar mais captação na caderneta de poupança, que se converte em um maior apetite dos bancos para emprestar e, automaticamente, também gera uma queda na taxa de financiamento imobiliário, o que melhora a capacidade de compra dos clientes.
Por último, a operação brasileira ainda tem entre 40% e 42% de dívida líquida sobre patrimônio. Então, é uma alavancagem alta para os nossos padrões. Nesse cenário. a queda de taxa de juros se converte automaticamente numa economia enorme para a operação.