São Paulo - A retomada da construção civil ainda depende em boa parte de decisões do governo. Enquanto a criação de uma nova faixa no programa Minha Casa, Minha Vida pode dar fôlego às construtoras, a revisão das regras de uso de recursos do FGTS tem potencial para se transformar em novo gargalo.
Para tratar dessas pautas, a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) apresentou um pacote de medidas para a retomada do setor ao Ministério do Planejamento. De acordo o presidente da entidade, Rubens Menin, caso os pleitos sejam atendidos em curto prazo, o setor poderá criar 200 mil empregos no primeiro semestre de 2017. "Deixaríamos de demitir e começaríamos a contratar", ressalta.
Uma das principais demandas para atingir essa meta é a criação de uma nova faixa do programa Minha Casa Minha Vida, a chamada Faixa 4, que atenderia a demanda com renda familiar superior a R$ 6,5 mil. "O teto deve variar entre R$ 10 mil e R$ 15 mil", explica.
"Existe um vácuo entre a faixa três e resto das pessoas", afirma presidente da Setin Incorporadora, Antonio Setin. Segundo ele, apesar da empresa não focar em imóveis para o programa, caso a nova faixa seja criada é possível que a companhia crie projetos para atender o nicho. "Primeiro vou entender os detalhes e a regulamentação do programa, mas a nossa intenção é fazer algo que se enquadre na nova faixa", analisa.
Para o sócio-presidente da França Participações, Luiz Antônio França, assim como a Setin, a expectativa é que a Faixa 4 seja uma estratégia muito usada por construtoras em 2017. Segundo ele, por ter um grande público reprimido, mesmo com a instabilidade econômica, é possível que a demanda seja grande. "A nova faixa será um foco interessante e importante, porque para incorporar é necessário ter demanda e devemos ter nessa nova faixa."
Pleitos - Além da criação da faixa, a entidade espera algumas mudanças nas faixas 1,5, 2 e 3 do programa habitacional. "Precisamos turbinar o pró-cotista", destaca o conselheiro da Abrainc e diretor de relações institucionais da Cury Construtora, Ronaldo Cury de Capua. Segundo ele, apesar da notícia de que a Faixa 3 poderia ter alta do valor limite de comercialização do imóvel em 2017, em capitais de maior porte, a mudança não é suficiente. O executivo aponta que as alterações pedidas são pequenas - como, por exemplo, o aumento de 10% do teto do valor do imóvel -, mas que devem fazer diferença na retomada da demanda. "Neste ano, por exemplo, a Caixa não vai aplicar o que tem que aplicar", ressalta. A projeção da entidade é que o Minha Casa, Minha Vida e o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos (SBPE) terminem o ano com 400 mil unidades contratadas.
Outra demanda pleiteada pelo setor é a regulamentação dos distratos, que hoje provoca insegurança jurídica. "Precisamos acabar com a judicialização e a melhor forma e fazer isso é regulamentando", afirma Rubens Menin da Abrainc.
Menin contou que existem três possíveis caminhos para resolver o problema, o primeiro é o acordo ou pacto que dispõe de regras para distrato, a aprovação do projeto de lei que aborda o tema ou até a criação de uma medida provisória. "Eles [o governo] têm que arrumar uma solução", cita Menin.
Só com a regulamentação, o executivo aponta que será possível reduzir em 2 pontos percentuais (p.p) o custo médio de captação do setor , ao ano.
Na opinião do diretor da Abrainc, Luiz Fernando Moura, além de consumidores e construtoras, a instabilidade jurídica e a falta de previsibilidade da operação provocada pelos distratos também afeta diretamente o interesse de investidores estrangeiros. "Quem está investindo na construtora? Muitos investidores já saíram do Brasil por isso", conta.
Outras questões dispostas no documento entregue ao Ministério do Planejamento, está a necessidade de rever as fontes de funding do setor. Sobre isso, os executivos da Abrainc sinalizam que é necessário manter a isenção de tributação da Letra de Crédito Imobiliário (LCI).
Já Antônio França da França Participações, acrescenta que a regulamentação da Letra Imobiliária Garantida (LIG) também é importante como alternativa de funding. "Não é substituir a poupança, mas ter mais recursos para atender a demanda. O CRI [Certificado de Recebíveis Imobiliários], por exemplo, também é necessário", complementa ele.
Neste ponto, o temor do mercado é que o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) seja utilizado para outras finalidades que não seja a compra de um imóvel, como o que o Governo de Michel Temer tem proposto. "O credito imobiliário já está muito sacrificado, temos problemas de distrato e é fundamental não mexer no FGTS", complementa França.
Expectativas - Se por um lado o pacote de medidas para impulsionar o setor pode gerar um grande número de empregos rapidamente, caso os pleitos não sejam atendidos Rubens Menin da Abrainc sinaliza que é possível que o próximo ano o setor mantenha o ritmo de contração. "Os juros mais baixos podem ajudar, mas não será o suficiente", expõe.
"A agenda política está atrapalhando a agenda econômica e precisamos que a agenda micro seja agilizada", ressalta Menin. Mesmo sem falar em crescimento, ele esclarece que caso as medidas sejam tomadas, executivos do setor poderão "ir para casa descansar".
O lider da Setin Incorporadora, Antonio Setin, já afirmou ao DCI que, caso as coisas não mudem no ambiente do setor e político, a incorporadora não deverá fazer nenhum lançamento ano que vem. "Vamos ficar assistindo e esperar as coisas melhorarem. Só termino de entregar o que está em construção."
Por outro lado, se as mudanças ocorrerem, o plano da Setin será focar em imóveis de dois a quatro dormitórios. "Estamos nos reestruturando e não esperamos alta de faturamento em 2017, mas já compramos terrenos com VGV [Valor Geral de Vendas] de R$ 650 milhões. Se o mercado não voltar em 2017, volta em 2018", prevê Setin.
"Queremos focar menos em investidor e mais em família." Ele acrescentou que no ramo hoteleiro, no modelo de condo-hotel, os projetos aprovados estão congelados esperando um cenário mais favorável e retomada da confiança do investidor. "É um plano diferente do que vínhamos focando [condo-hotel e estúdios]", conclui.