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23/05/2024

Piloto do Drex é adiado para melhorar privacidade e terá nova fase em 2025 (Valor Econômico)

Mudanças ocorreram porque os testes com privacidade ainda não atingiram os requisitos impostos pela autoridade monetária

O projeto piloto de “tokenização” (digitalização) do real promovido pelo Banco Central (BC) teve sua conclusão atrasada e seguirá realizando os testes de privacidade previstos para acabar agora. Além disso, o piloto terá uma segunda fase com foco na implementação de outras funcionalidades na rede. A nova fase começa em julho e durará até o fim do primeiro semestre de 2025, postergando o calendário anunciado no começo do programa. Antes, o final dos testes estava previsto para este ano, com o Drex disponível para lançamento escalonado para o público entre o final de 2024 e o começo do ano que vem.

 

A próxima fase buscará incorporar novas funcionalidades, como a implementação de contratos inteligentes dentro da plataformas, de modo que as próprias instituições privadas participantes do projeto poderão criar serviços e modelos de negócios na rede, sem se limitarem àqueles desenhados pelo próprio BC. Deste modo, a autoridade monetária poderá avaliar casos de uso para o Drex propostos pelos participantes do mercado. Além disso, o BC receberá ao longo do terceiro trimestre novas propostas de candidatura de entidades interessadas em participar do projeto. Fabio Araujo, coordenador do Drex, disse que uma vez definido o padrão de governança e a plataforma do real digital, haverá abertura para participação de novos proponentes.

 

Em nota, o BC reconheceu que o atraso no cronograma do Drex ocorreu porque as soluções tecnológicas para garantir a privacidade das transações na infraestrutura de pagamentos na rede do real digital “não apresentaram a maturidade necessária para que se possa garantir o atendimento de todos os requisitos jurídicos relacionados à preservação da privacidade dos cidadãos”.

 

Por não ter chegado ao nível de maturidade necessária, a segunda fase de testes será realizada para promover a "evolução e a maturação da plataforma", de acordo com o BC. Dessa forma, a incorporação da população nos testes do piloto "somente será realizada quando houver segurança sobre a capacidade de se atender aos requisitos de privacidade", informou o Banco Central.

 

O Drex será uma moeda de atacado, transacionada exclusivamente entre bancos e fornecida pela autoridade monetária, operada dentro da rede de registro distribuído (DLT) Hyperledger Besu, uma espécie de blockchain. No entanto, a tecnologia blockchain foi criada justamente com o conceito de ser inteiramente transparente, com cada usuário podendo ver aquilo que foi transacionado em cada carteira. Isso torna desafiador o cumprimento de regras de privacidade obrigatórias do sistema financeiro brasileiro, como a manutenção do sigilo fiscal e bancário.

 

Foram testadas as soluções de privacidade da Zether, Starlight e Rayls (antiga Parchain), esta última fornecida pela startup brasileira Parfin, para resolver o problema da privacidade. Os fluxos que o BC queria verificar para as soluções foram em operações como transferência do real digital de atacado, movimentação de real digital tokenizado (moeda digital que os bancos irão ofertar a seus clientes atrelada ao Drex que possuem em reserva), compra e venda de títulos públicos com real digital e compra e venda de real digital com real digital tokenizado.

 

No caso da Zether foram testados os fluxos de transferência de real digital e a compra e venda de títulos públicos com o real digital. No caso da Starlight foi testada apenas a compra e venda de títulos públicos com o real digital. A Rayls é a única que terá todos os quatro fluxos implementados e testados pelos participantes. O BC ainda analisará uma solução da Microsoft chamada ZKP Nova, que não estava prevista antes e que pode ser testada pelos consórcios se for considerada viável pela equipe do BC.

 

De acordo com Marcos Viriato, CEO da Parfin, a complexidade em se desenvolver uma solução ocorre porque uma série de variáveis precisam ser atendidas, como escalabilidade da privacidade e velocidade das transações quando elas ficam “escondidas”. “O tempo de bloco da Hyperledger Besu é de cinco segundos. Se a solução puder executar várias transações perto deste tempo então está com um desempenho razoável”, explica.

 

Rafael Bianchini Abreu, coordenador de regulação de riscos financeiros de infraestruturas de mercado financeiro no Banco Central, que também é professor da FGV, disse que o Drex “empacou” na questão do sigilo, mas que não é inviável. “É público, já foi noticiado que o que o Drex empacou na questão do sigilo. Quer dizer que é inviável? Não, é possível pensar em soluções que garantam o sigilo bancário, a questão é que elas tiram escala, velocidade, aumentam o custo ou são soluções privadas, o que pode criar problemas lá na frente”, afirmou em evento promovido pela fintech Zoop.

 

Para a segunda fase do projeto, diversos casos de uso já estão em estudo pelas instituições participantes, como tokenização de registro de veículos, CDBs e imóveis. A privacidade também terá que ser testada para esses outros modelos de negócios. “O financiamento de um imóvel, por exemplo, não é interessante que seja público, mas há complexidades em torná-lo privado dentro de um blockchain”, diz Viriato.

 

Os especialistas consideram que a operação padrão dos servidores do BC, que durou dez meses, também teve impacto no ritmo do piloto do Drex, contribuindo para o adiamento do cronograma. O procedimento só foi encerrado em 24 de abril, mediante reajustes prometidos pelo governo. 

FONTE: VALOR ECONôMICO