Bem-estar e qualidade de vida são questões críticas para o funcionamento das cidades e, consequentemente, aspectos importantíssimos a serem considerados nos planos diretores estratégicos de cada município. Entretanto, as formas de associação do plano de desenvolvimento urbano com o bem-estar da população e sua relação com o ambiente construído nem sempre estão claras para os planejadores.
Nesse sentido, pode ser bastante útil a compreensão do modelo conceitual proposto pelo professor Kostas Mouratidis, do departamento de planejamento urbano da Norwegian Univeristy of Life Sciences, na Noruega.
O modelo considera para a caracterização do ambiente construído, no âmbito desse estudo, quatro componentes principais: uso do solo, sistema de transporte, desenho urbano e habitação.
A definição de bem-estar da população, considerado um conceito subjetivo, compreenderia três aspectos: satisfação com a vida, bem-estar emocional e a eudaimonia (doutrina que prega a felicidade como finalidade da vida humana).
Assim, estabelecidos o ambiente construído e o objetivo a ser alcançado (bem-estar da população), o autor indica os aspectos que devem ser considerados no planejamento das cidades para proporcionar essa conexão de forma eficiente: mobilidade, lazer, trabalho, relações sociais, bem-estar residencial, respostas emocionais e saúde.
Isso significa dizer que, embora existam inúmeras questões importantes a serem consideradas no planejamento de uma cidade, esses são aspectos essenciais quando se pretende estruturar mecanismos que permitam alcançar o bem-estar da população.
A mobilidade é um dos aspectos mais relevantes e abrangentes. Permite que as pessoas acessem lugares, instalações e serviços e, assim, participem de atividades e atendam às suas necessidades diárias. Gera também respostas emocionais – por exemplo, deslocamentos longos e estressantes ou agradáveis– e, portanto, influencia o bem-estar emocional. As viagens urbanas permitem que as pessoas conheçam outras pessoas, dirijam-se até seus locais de trabalho, visitem lojas e acessem instalações e serviços de saúde, educacionais, espaços recreativos, esportivos e culturais. Essas opções de acesso contribuem para a satisfação de necessidades e permitem que as pessoas alcancem a eudaimonia.
O trabalho é um dos domínios mais importantes da vida, e a satisfação no trabalho contribui substancialmente para o bem-estar. O nível de diversidade e acessibilidade, a oportunidade de trabalho e educação são extremamente importantes nesse processo.
Nesse contexto, estudos mostram que cidades mais densas e vibrantes aumentam o acesso a bens e serviços, facilitam a interação diária, atraem talentos, facilitam o empreendedorismo e possibilitam a mobilidade social e econômica.
A satisfação com a moradia expressa o nível de contentamento com a habitação em que se vive, e fornece indicações sobre a influência das características da habitação no bem-estar social. Além, obviamente, da satisfação com a habitação em si – aspectos relacionados com a vizinhança são importantes. Assim, é desejável que problemas urbanos comuns (ruídos, desigualdades, criminalidade, falta de espaços verdes) sejam relativamente limitados, e características essenciais (densidade, uso do solo equilibrado, transporte público eficiente, caminhabilidade), e um ambiente construído compacto sejam foco do planejamento.
O estudo do professor Mouratidis conclui que as estratégias potenciais para melhorar o bem-estar social por meio do planejamento urbano podem incluir aspectos, como melhorar as condições para viagens ativas e transporte público e restringir as viagens de automóveis quando possível; fornecer acesso fácil e equitativo a instalações e serviços; desenvolver ou orientar a tecnologia e novas opções de mobilidade para melhorar a inclusão e a qualidade de vida de diferentes grupos; integrar ao máximo as várias formas de natureza urbana; fornecer espaços públicos acessíveis e inclusivos; manter a manutenção e a ordem no espaço urbano, vegetação e sistemas de transporte.
Além disso, aponta que outras questões importantes como implementar estratégias de redução de ruído; propor modelos para o desenvolvimento de edifícios e espaços públicos esteticamente agradáveis com base nas necessidades e preferências dos moradores; reduzir as desigualdades socioespaciais ao mesmo tempo em que dá apoio à moradia e ao transporte para grupos vulneráveis; assegurar que políticas, planos, leis e regulamentos urbanos considerem o conhecimento baseado em evidências; melhorar a transferência de conhecimento e interação entre planejadores e coordenadores de saúde pública; aplicar a medição e benchmarking dos resultados do planejamento urbano; e empregar estratégias de empoderamento e incentivar a participação pública e a inclusão de grupos vulneráveis no processo de planejamento.
Essas estratégias podem e devem ser orientações importantes para planejadores municipais que estejam elaborando ou revisando seus planos diretores, para que possam, dessa forma, incorporar definitivamente ao planejamento a conquista do bem-estar da população.
Matéria publicada em 09/07/2022