Eduardo Campos
A caderneta de poupança completou o décimo primeiro mês consecutivo com retirada de recursos. Em novembro, segundo dados do Banco Central (BC), os saques superaram os depósitos em R$ 1,303 bilhão, pior mês de novembro da série iniciada em 1995. No acumulado do ano, o saldo é negativo em R$ 58,357 bilhões. O resultado só não foi pior em função de uma entrada líquida de R$ 4,563 bilhões no último dia útil do mês, pois até o dia 27 as saídas somavam R$ 5,866 bilhões.
Em novembro do ano passado, foi registrada captação líquida de R$ 2,534 bilhões. Em todo o ano de 2014, a poupança atraiu R$ 24,034 bilhões, menor saldo líquido desde os R$ 14,186 bilhões de 2011 e cerca de um terço do volume recorde de 2013 (R$ 71,047 bilhões).
Os bancos que aplicam recursos da caderneta em crédito imobiliário mostraram resgate líquido de R$ 961,757 milhões no mês passado (SBPE). Já as instituições que destinam os recursos para o crédito rural registram saída líquida de R$ 341,169 milhões (SBPR).
Como o saque foi inferior ao rendimento de R$ 4,079 bilhões, o patrimônio total da poupança subiu de R$ 644,846 bilhões em outubro para R$ 647,623 bilhões no mês passado.
Os fatores que ajudam a explicar os saques continuam sendo inflação elevada, aumento do desemprego, menor crescimento da renda do trabalhador e maiores gastos com tarifas e combustíveis neste ano. A manutenção da Selic em 14,25% ao ano e a possibilidade novas elevações também tiram atratividade da caderneta, que perde em rentabilidade para outros investimentos mesmo considerando a isenção de Imposto de Renda.
Desde o fim de agosto de 2013, a poupança voltou a ser remunerada pela "fórmula antiga" de 0,5% ao mês mais TR. Pela regra atual, se a Selic voltar a ficar abaixo de 8,5% ao ano, o rendimento será equivalente a 70% da taxa básica de juros.
Um trabalho realizado pelo Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco investigou se o comportamento da poupança é influenciado pela renda das famílias ou pelo diferencial de rendimento em comparação com outros investimentos. Os economistas do banco estimaram dois fatores para fazer a investigação: o impacto da desaceleração da atividade econômica no mercado de trabalho, olhando a Massa Salarial Ampliada Disponível, e o efeito da elevação na taxa de juros sobre outras aplicações financeiras, indicador que foi chamado de rendimento.
Para obter esse vetor, foi calculada a diferença entre a remuneração de uma aplicação fictícia com rentabilidade bruta de 95% do CDI e incidência de 17,5% de Imposto de Renda e o rendimento da caderneta de poupança. Pelo indicador, quanto maior o valor obtido, menor a atratividade da caderneta de poupança. Com dados até outubro, o indicador estava em 0,19. Em meados de 2013, por exemplo, estava em menos 0,04.
Feito isso, foi montado um modelo para estimar o impacto desses dois vetores no crescimento em 12 meses dos saques da caderneta. O resultado confirma a percepção intuitiva ao mostrar que, quanto maior for o crescimento da massa disponível, menor será a expansão das retiradas e, quanto maior for a rentabilidade de outras aplicações financeiras ante a poupança, maiores serão os saques da caderneta.
Segundo o estudo, entre o peíodo de 2003 a julho deste ano (mês da última informação disponível da massa salarial), a equação estimada mostrou que tanto a massa quanto o rendimento financeiro são significantes para o crescimento dos saques. No entanto, a variável massa salarial se mostrou mais relevante.
"Infelizmente, temos poucas observações para reestimar a equação acima considerando apenas o período recente, como, por exemplo, a partir do início de 2013, ano no qual o comportamento das retiradas começou a se intensificar", ponderam os autores do estudo.
Intuitivamente, os economistas acreditam que no movimento mais recente, especialmente nas retiradas observadas no primeiro semestre deste ano, a variável rendimento tenha aumentado sua importância no modelo. Uma evidência da influência da taxa de juros na alocação dos recursos é justamente o crescimento de outras captações como as letras de crédito imobiliário (LCI) e do agronegócio (LCA), fundos e Tesouro Direto, o sistema de negociação de títulos públicos pela internet.
Neste ano até outubro, o estoque de LCI cresceu 23,3%, chegando a R$ 185,6 bilhões. Na mesma base de comparação, o estoque de LCA cresceu 17,9% e alcançou R$ 48,6 bilhões. O Tesouro Direto atingiu estoque de R$ 22,9 bilhões, um crescimento de 50,1% no mesmo período. Entre as principais aplicações, apenas o mercado de certificados de depósito bancário (CDBs) mostrou recuo no estoque de aplicações nesse período, de cerca de 4% - no ano até outubro, o saldo de aplicações ficou negativo em mais de R$ 20 bilhões.
"Notamos, portanto, que houve uma migração entre as modalidades", destacam os autores. A somatória de CDB, fundos, LCI, LCA e Tesouro Direto mostrou crescimento de 10,4% no ano até outubro, enquanto a caderneta teve uma retração de 2,7%.
Concluindo, o estudo aponta que ainda que tenha ocorrido aumento da relevância do fator rendimento para justificar o comportamento dos saques da caderneta, não é possível desconsiderar o impacto da massa ampliada no seu desempenho. Tanto que a soma de todas as captações de pessoa física, ou seja, a caderneta de poupança com as demais modalidades descritas acima, é possível notar um crescimento de 5,5% no saldo total em outubro de 2015 ante dezembro de 2014, variação que apesar de positiva é inferior a inflação acumulada no período de 8,53%.