No primeiro fim de semana após a autorização para reabertura dos estandes de imóveis ao público na capital paulista, apenas cerca de 60% dos locais voltaram a funcionar, de acordo com levantamento da imobiliária Brasil Brokers.
Esse porcentual ainda vai aumentar nos próximos dias, já que muitas empresas não tiveram tempo suficiente para se adaptar aos novos protocolos de higiene contra o coronavírus.
Mas a ausência de uma corrida mais intensa para reabertura pode ser o sinal de que há uma transformação em andamento no mercado. Talvez os estandes físicos não sejam tão importantes assim, começam a refletir os empresários.
Óbvio que o setor sofreu na crise. As vendas em São Paulo caíram pela metade durante a quarentena, quando os estandes fecharam as portas. Por outro lado, o período serviu para as construtoras chegarem à conclusão de que é possível lançar e vender imóveis pela internet – canais praticamente inexplorados até então.
“Nessa reabertura, o movimento nos estandes não cresceu muito nos primeiros dias. O pessoal ainda está um pouco assustado para sair de casa”, relata o copresidente da MRV, Eduardo Fischer. “Já as vendas digitais estão indo muito bem, com procuras altas. A lição que fica é que não vamos precisar tanto do estande como imaginávamos”.
Fischer antecipa que a MRV pretende gastar menos com estandes enormes e plantas decoradas daqui para frente. No futuro, esses locais serão centros de experiência e consultoria para o cliente. “O cliente vai ao estande, coloca o óculos de realidade virtual e vê o mesmo quarto com decoração para menino, para menina, transformado em escritório, o que imaginar. É uma experiência mais ampla, e nossos lançamentos estão indo nessa direção”, conta.
Construtoras fazem planos para depender menos dos estandes de vendas
A Mitre Realty, que abriu suas ações na bolsa neste ano, também vê a digitalização das operações com otimismo, a despeito do baque provocado pela crise. As vendas online já são 20% do total, e a incorporadora investiu para oferecer tours virtuais aos imóveis por meio do seu site. Além disso, tem usado os canais digitais também para treinar os corretores na fase que antecede o lançamento de um novo projeto para o grande público.
“O treinamento exigia um espaço enorme, local para estacionamento, serviço de buffet e tempo de deslocamentos. Hoje isso dura 1h30 por um encontro online. E o cara presta mais atenção, porque não tem conversa paralela”, conta o diretor comercial da Mitre, Henrique Moreno. “Nossa estrutura está tão produtiva ou até mais do que antes da crise. É um legado que acredito que vai permanecer”, complementa o vice-presidente financeiro, Rodrigo Cagali.
A mesma estratégia tem sido adotada pela RNI (antiga Rodobens Negócios Imobiliários). A incorporadora fez uma live recentemente para apresentar aos corretores e ao público um projeto residencial avaliado em R$ 74 milhões no Jaçanã, zona norte de São Paulo. Duas semanas após o lançamento, 20% das unidades foram vendidas pela internet. O próximo lançamento nestes moldes será nos próximos dias em Goiânia.
“O resultado superou o esperado. Imaginávamos vender algo em torno de 8% a 10% na largada. Foi muito bom”, diz o presidente da RNI, Carlos Bianconi. “Nosso grau de eficiência dobrou. O meio digital é mais barato e mais assertivo para achar o cliente”, emenda o diretor de marketing e vendas, Henrique Cerqueira.
Todas essas iniciativas mostram que, embora o mercado imobiliário tenha perdido vendas, o impacto foi menos ruim do que o previsto originalmente, em março. “O tempo dos estandes cheios não vai voltar tão cedo. Mas as últimas semanas mostraram que esse mix entre o mundo online e offline é uma solução eficiente”, destaca o presidente da Brasil Brokers, Cláudio Hermolin.
O executivo espera uma recuperação gradual do mercado, com as vendas de junho acima dos meses anteriores, quando os estandes ainda estavam fechados. Os resultados só devem ganhar mais tração nos meses seguintes. “A virada do mercado, com maior velocidade de vendas e retomada ampla dos lançamentos, deve ser em agosto. Isto é, caso não haja nenhum retrocesso no controle da pandemia”, diz.
A RNI, por exemplo, planeja lançar mais projetos em 2020 do que em 2019, se as condições macroeconômicas permitirem. Já a Mitre cogita diminuir os lançamentos em torno de 30%, dadas as incertezas do mercado. A MRV não fez comentários sobre perspectivas de lançamentos.