A queda da taxa Selic, cujas projeções apontam para um dígito já no fim deste ano, não será necessariamente negativa para os bancos, como sugere o senso comum, e deve ter impacto pequeno ou até mesmo positivo para o resultados das instituições financeiras. Ao menos no curto prazo. A expectativa de analistas é que o efeito do afrouxamento monetário só comece a aparecer de forma mais relevante no ano que vem. Até lá, os bancos esperam compensar esse fator com a recuperação do crédito e a queda da inadimplência.
Segundo o executivo de um grande banco, o impacto da queda da Selic para a margem financeira é neutro ou até positivo em um primeiro momento, uma vez que a redução do custo de captação de recursos dos bancos deve acontecer mais rapidamente que o reajuste das taxas da carteira de crédito, que são em grande parte prefixadas.
A agência de classificação de risco Moody's estima que 41% dos instrumentos de funding dos bancos, incluindo depósitos, estão atrelados a taxas de juros pós-fixadas, que caem automaticamente com o corte da Selic. Isso compensaria um ganho menor com aplicação em títulos públicos.
O impacto da redução do spread - diferença entre as taxas de captação e o valor cobrado nos empréstimos -, segundo o executivo de um banco, deve ser mais evidente só no segundo semestre de 2018. Mas isso pode ser compensado pela queda da inadimplência e das provisões para perdas com crédito de liquidação duvidosa (PDD), bem como pelo crescimento da carteira de crédito. A retomada do crédito, contudo, vai depender das condições da economia. E os bancos com melhor qualidade da carteira de crédito podem sair na frente.
Com a perspectiva de recuperação ainda tímida da economia, os grandes bancos brasileiros pretendem manter o pé no freio do crédito neste ano. Banco do Brasil, Bradesco e Itaú Unibanco projetam uma variação da carteira de crédito entre nula e um avanço de 5%.
O UBS calcula que o impacto da queda da taxa Selic para a margem financeira dos bancos não deve ser significativo já neste ano, uma vez que leva um tempo para o repasse da queda da taxa básica para as linhas de crédito acontecer - e a falta de apetite dos bancos por elevar os empréstimos e a restrição de capital das instituições públicas para ampliar suas carteiras de crédito limitam a competição de preços no médio prazo.
O analista sênior da Moody's, Alcir Freitas, lembra que a queda da taxa básica diminui o custo das dívidas, melhorando a capacidade de pagamento das empresas, o que contribui para a queda da inadimplência e, consequentemente, das despesas com provisão. "O efeito líquido da queda da Selic é mais positivo do que negativo para os bancos em um primeiro momento."
Depois de gastos elevados com provisões para devedores duvidosos (PDD), a despesa menor para créditos em atraso deve trazer um alívio para o balanço dos bancos. No ano passado, os quatros maiores bancos gastaram R$ 83,4 bilhões com isso, valor 26,5% maior que em relação a 2015.
"A maior parte dos créditos ruins já foi provisionada no ano passado. Não esperamos nada relevante que mude os ratings dos bancos", afirma Claudio Gallina, diretor da Fitch Ratings. "A rentabilidade pode cair um pouco, mas o mais importante é o controle da inadimplência", completa.
Para analistas do Santander, contudo, o ciclo de afrouxamento monetário deve causar redução nos spreads, o que pode afetar a rentabilidade já neste ano. "No ambiente atual, acreditamos que a redução dos volumes [de crédito] deve ser incapaz de neutralizar esse impacto negativo dos spreads, e esperamos um efeito negativo na receita dos bancos", aponta o banco em relatório. Os analistas da instituição projetam crescimento do crédito para o setor de 2% em 2017 e 9% em 2018.
Durante entrevista para comentar o balanço de 2016, o presidente do Itaú Unibanco, Roberto Setubal, afirmou que, com o processo de queda da taxa Selic, os spreads bancários devem ter baixa. Com isso, pode haver impacto na margem financeira da instituição em 2017. A projeção do banco é de recuo entre 0,4% e 0,5% neste ano.
A previsão do Bradesco, apresentada durante o anúncio dos resultados de 2016, é de estabilidade a uma queda de até 4% para a margem financeira de juros neste ano, em termos pro forma. Essa queda se deve principalmente à redução da carteira média de crédito ao longo deste ano.
Já o Banco do Brasil prevê um crescimento de até 4% da margem financeira neste ano. Analistas atribuem o resultado ao aumento nos spreads aplicado pela instituição na renovação de operações realizadas na época do programa "Bom Pra Todos", que tinham taxas mais baixas.
O impacto da queda da Selic vai depender da composição do funding de cada banco e também de se a instituição faz "hedge" ou não para as operações de crédito concedidas a taxas prefixadas.
Com base na análise de sensibilidade verificada no último ciclo de alta de juros, o UBS projeta que uma redução da Selic em 1 ponto percentual poderia reduzir, em média, a margem líquida de intermediação financeira (NIM) dos bancos em 0,13 ponto percentual, devendo levar um prazo de três trimestres para esse impacto começar a aparecer. O UBS prevê que o Bradesco seria o mais afetado nesse cenário, com queda de 0,12 ponto da margem financeira, seguido pelo BB (-0,10 ponto) e Itaú Unibanco (-0,07 ponto).
O Banco Central retomou o ciclo de afrouxamento monetário em outubro do ano passado, reduzindo a taxa básica de 14,25% para 12,25% atualmente. O mercado espera uma queda da taxa Selic para 9% no fim de 2017, segundo a última Pesquisa Focus.