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10/02/2025

Redução das famílias e custo puxam demanda por imóveis menores (Valor Econômico)

Valor dos aluguéis e busca por moradia em regiões mais centrais, próximas do trabalho ou bem-servidas de transporte público acentuam tendência

Por Gabriel Shinoharae Edna Simão

 

A demanda por imóveis menores tem crescido gradualmente ao longo dos anos, movimento influenciado pela mudança do perfil das famílias, que estão menores e querem viver em bairros mais centrais ou próximos do trabalho e de transporte. O alto custo do aluguel também tem sido decisivo na hora de realizar o sonho da casa própria.

A avaliação de muitas famílias tem sido de que é melhor pagar prestação de um imóvel menor, que ofereça alguns serviços e boa localização, que morar com mais espaço, mas refém do reajuste do aluguel, que tem ficado acima do IPCA.

A tendência já vem sendo captada pelo Banco Central e pela Caixa Econômica Federal e tem demandado ajustes na estratégia de negócios das empresas. Segundo dados do BC, a metragem total dos imóveis financiados no país encolheu 12,75% entre outubro de 2018 e outubro de 2024, passando de 82,78 m2 para 72,22 m2, na mediana.

O pico do tamanho de imóveis foi observado em janeiro de 2019, quando as unidades financiadas tinham, na mediana, 105,59 2.

Os dados também mostram queda na chamada área privativa - espaço ocupado exclusivamente pelos moradores da unidade. No mesmo período, a mediana foi de 60,62 m2 para 56,98 m2, queda de 6%.

Segundo dados repassados pela Caixa ao Valor, os contratos para financiamento de imóveis com até 40 m2, que representavam 5,8% do total de contratos em 2019, saltaram para 10,83% em 2024.

No ano passado, foram fechados 83.696 contratos com imóveis de até 40 m2, o que representou alta de 32%, na comparação com 2023. Já as operações para a compra de unidades habitacionais com metragem entre 40,01 e 50 m2, faixa onde há maior concentração de contratos, subiram 16% no mesmo período.

A Caixa explica que o tamanho é uma estimativa feita a partir da base de dados dos contratos individuais de unidades novas, uma vez que não há informações das unidades vinculada a empreendimentos, bem como de unidades usadas.

Os dados do banco indicam que a tendência de mercado é influenciada por mudanças no perfil de família. Dos 772.129 contratos de financiamento imobiliário feitos pela Caixa em 2024, 41,58% foram fechados por pessoas entre 18 e 30 anos.

Além disso, 28% foram para famílias com renda entre R$ 4,4 mil e R$ 8 mil, o que também está relacionado com o valor das unidades adquiridas: mais de 40% dos contratos foram para financiamentos de imóveis entre R$ 150 mil e R$ 250 mil.

“A mudança do perfil das famílias acaba se refletindo no mercado”, afirma a vice-presidente de Habitação da Caixa, Inês Magalhães. A executiva menciona ainda outros fatores regionais. Em São Paulo, por exemplo, o movimento pode estar sendo influenciado pela implementação do novo plano diretor, que define as diretrizes da ocupação do município, explica a Magalhães.

Os imóveis menores também se alinham com o maior número de brasileiros que decidem morar sozinhos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a parcela das famílias unipessoais cresceu 38% entre 2018 e 2023, passando de 10.017 para 14.003. No mesmo sentido, o número de moradores por domicílio caiu de 3 para 2,8.

Diante dessas mudanças nas preferências, é natural que o mercado se adapte, diz o ministro das Cidades, Jader Filho, responsável por tocar o programa Minha Casa Minha Vida (MCMV). “Se há uma demanda por imóvel menor, o mercado vai atender. O mercado se autorregula”, afirma. “No Minha Casa Minha Vida financiado, não há limite de tamanho dos imóveis. O mercado se autorregula, o que eu acho que é uma questão natural”, completa o ministro.

No caso do programa do governo que conta com subsídio, há uma limitação, no entanto. Por lei, casas do MCMV não podem ser menores que 40 m2. Para apartamentos, esse limite é de 41,5 m2. Segundo o ministro, o governo não vai abrir mão desse limite. Além disso, para atender a pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as moradias precisam ter varanda. “Isso vai ser mantido, não vamos retroceder em relação a isso”, diz Jader Filho.

Construir imóveis está um pouco mais caro e o incorporador tem que adaptar o tamanho”

— Filipe Pontual

No mercado em geral, as construtoras se preparam para ampliar a oferta de imóveis menores. A construtora Cavazani, por exemplo, planeja para 2025 lançamentos com metragens entre 36 m2 e 38 m2.

Em 2024, a companhia, que tem uma presença mais forte no município de Guarulhos (SP), comprou terrenos na cidade de São Paulo para expandir o negócio.

Segundo a CEO, Cecilia Cavazani, a ideia é atender famílias com apenas um filho ou pessoas solteiras que queiram morar próximo ao trabalho e do metrô. Esse público está disposto a ter uma moradia menor desde que o edifício ofereça itens de lazer, como piscina, sala de jogos e salão para festas. “Já estávamos em busca de terrenos para comprar. Conseguimos no ano passado e pretendemos lançar este ano”, afirma.

Como imóveis menores tendem a ser mais baratos, o setor se beneficia ainda de programas habitacionais estaduais que, em alguns casos, ajudam no pagamento da entrada, o que viabiliza o plano de sair do aluguel.

O custo para alugar um imóvel, aliás, é outro fator que ajuda na decisão pela compra. Cavazani ressalta que, em alguns Estados, o aluguel tem subido em ritmo superior ao da correção das parcelas dos financiamentos imobiliários. Mesmo com o aumento da taxa de juros, a executiva diz acreditar que o ritmo de crescimento do crédito imobiliário neste ano deve ser similar que 2024, puxado pelos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Renato Correia, aponta que o número de lançamento de imóveis econômicos aumentou desde que o governo alterou as regras do MCMV em julho de 2023. Correia observa que todo o mercado imobiliário, inclusive o do programa, busca se adequar à renda do comprador.

“Apesar de nominalmente a renda aumentar, quando você passa pelo processo em que houve pandemia, aumento de custo de material, de mão de obra, naturalmente a renda acaba sendo comprometida em termos de capacidade de compra, então os imóveis acabam sendo reduzidos”, afirma Correia.

Dados do BC mostram que a mediana do valor de compra de imóveis caiu na comparação de outubro de 2023 com o mesmo mês do ano passado, passando de R$ 280 mil para R$ 220 mil. O pico recente foi em junho de 2023, quando a mediana chegou a R$ 300 mil. Já em outubro de 2022, o valor também estava em R$ 220 mil.

Para o diretor-executivo da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Filipe Pontual, houve ainda aumento nos custos da construção. O Índice Nacional de Custo da Construção (INCC-M) do FGV Ibre terminou 2024 com variação acumulada em 12 meses de 6,34%. Em dezembro de 2023, esse número era de 3,32%.

“O fato é que claramente construir imóveis está um pouco mais caro e o incorporador tem que adaptar o tamanho do imóvel ao tamanho do bolso do comprador”, afirma.

FONTE: VALOR ECONôMICO