São Paulo - O debate entre empresários, consumidores e governo federal sobre a regulamentação dos distratos esbarrou em obstáculos ao longo do mês de março, mas deve caminhar para um desfecho nas próximas semanas, de acordo com fontes ouvidas pelo Broadcast.
O mais provável é que o governo siga adiante com a regra em que, nos casos de rescisão da venda de imóveis, a construtora poderá reter como multa o sinal pago pelo comprador mais 20% das parcelas desembolsadas até o momento do distrato. O montante total da multa não poderá superar 10% do valor do imóvel. Essa é a proposta defendida pelos ministérios do Planejamento e da Fazenda, faltando apenas o aval da Justiça, conforme informou o Broadcast em reportagem de 13 de março.
Nas últimas semanas, porém, a análise da regulamentação enfrentou contratempos. A deflagração da Operação Carne Fraca pela Polícia Federal (PF) respingou sobre o recém-empossado ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB). Um grampo descobriu o contato telefônica de Serraglio com um dos fiscais investigados. A operação também demandou atenção da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), que encabeça as discussões sobre os distratos no Ministério da Justiça e precisou analisar o recall de produtos dos frigoríficos envolvidos na operação da PF.
Com a poeira baixando, a expectativa é que o assunto volte a ser tratado com mais atenção dentro da pasta. Uma das questões a serem analisadas no Ministério da Justiça é se a corretagem ficará dentro da multa nos casos de distratos ou será tratada à parte, o que ainda não está definido. Também estão sendo estudados possíveis conflitos entre a proposta feita e a chamada lei de arras, que já prevê a retenção do sinal nos casos de negociações desfeitas.
Do lado dos empresários, a aceitação do conteúdo sugerido pelo governo não é consensual. O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, sinaliza que a proposta é aceitável, pois entende que é preciso agilizar a criação de regras para as rescisões de vendas e encerrar logo a insegurança jurídica no setor. "Pelo que vemos, o modelo que vai ficar é esse", disse Martins. "Uma vantagem é que ela está próxima da jurisprudência já praticada", acrescentou, lembrando que os tribunais já determinam a aplicação de multa sobre os valores pagos pelos consumidores.
Já o vice-presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Cláudio Carvalho, defende que a base de cálculo para a aplicação da multa seja o valor do contrato e não o valor desembolsado pelos consumidores. "Essa proposta não nos atende. Os custos operacionais perdidos em razão dos distratos estão no valor do contrato", ressalta.
O copresidente da Cyrela, Raphael Horn, cobrou que o governo federal bata logo o martelo sobre o caso. "O governo está falando em produtividade. Então, espero que tenha tempo de olhar para o nosso setor", criticou o executivo, durante teleconferência com investidores e analistas realizado na semana passada para apresentar o balanço da companhia. "O governo está com a cabeça certa, na direção das reformas, e a nossa torcida é que em algum momento ele olhe para nosso setor. Ainda não aconteceu", completou Horn.