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13/08/2024

Revisão da operação Faria Lima deve atrair mais prédios (Valor Econômico)

Área muito valorizada para escritórios ganha mais potencial construtivo e inclui favelas, mas especialistas veem ‘populismo’ e sobrecarga da região

Uma das áreas mais valorizadas de São Paulo, o entorno da avenida Faria Lima pode ganhar mais prédios nos próximos anos. A região que vai da avenida até a marginal Pinheiros (veja mapa acima) integra a Operação Urbana Consorciada Faria Lima (OUCFL), criada em 1995 para incentivar construções e o desenvolvimento de infraestrutura local.

A OUCFL só tinha sido revista em 2004, mas no fim de julho o prefeito Ricardo Nunes (MDB) sancionou uma nova revisão, que acrescentou mais 250 mil m2 de potencial construtivo.

A operação urbana prevê um estoque limitado de metros quadrados que podem ser erguidos, mediante o pagamento de Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepacs), leiloados pela prefeitura. Para conseguir viabilizar um empreendimento, é preciso ter os Cepacs necessários para o projeto.

Incentivam a área da Hélio Pellegrino, mais nova e com mais terrenos”

— Denis Espinosa

No entanto, nos últimos anos o potencial construtivo e os Cepacs foram se esgotando no perímetro da Faria Lima. Denis Espinosa, diretor da área de “land services” da consultoria imobiliária CBRE, afirma que uma liberação de mais metragem e novos Cepacs era prometida ao mercado, mas demorou a chegar. Enquanto isso, projetos perderam viabilidade na região, que foi se valorizando conforme a vacância dos prédios corporativos caía.

Há prédios corporativos por ali que já cobram mais de R$ 300 por metro quadrado locado, lembra Espinosa, enquanto a média da cidade é R$ 170 para edifícios de alto padrão.

Os 250 mil m2 adicionais são divididos entre os quatro setores que compõem a OUCFL, mas não de forma igualitária. “Nitidamente incentivam a região da Hélio Pellegrino, que é mais nova e tem mais disponibilidade de terreno”, afirma Espinosa. Essa área ganhou 101.750 m2. Já o setor Faria Lima, no miolo da operação, terá apenas 41.000 m2 adicionais. Para o setor Pinheiros foram destinados 53.850 m2, enquanto no setor Olimpíadas haverá mais 53.400 m2.

Uma inovação, ressalta o diretor, é que não há uma delimitação sobre se o empreendimento que usará a metragem terá que ser residencial ou comercial, o que dá liberdade ao mercado.

A quantidade de prédios deve aumentar, mas Espinosa afirma que o processo deve ser gradual, já que os Cepacs são leiloados em lotes - o último certame ocorreu em 2021 e ainda não há uma previsão para o próximo - e as empresas que desenvolvem os empreendimentos levam anos para formar terrenos naquela área.

Os 250 mil m2 correspondem a 13% do que já foi construído só de prédios corporativos na região da Faria Lima, segundo a CBRE. “E isso vai ser consumido em muitos anos”, diz Espinosa.

Os recursos arrecadados com Cepacs na OUCFL já foram usados na remodelação do largo da Batata, no prolongamento da Faria Lima e na construção da sua ciclovia, nos conjuntos habitacionais Real Parque 1 e 2 e em túneis, entre outras obras.

O perímetro total da operação cresceu mais do que os 250 mil m2. Foram acrescentadas as favelas Paraisópolis, Panorama, Jardim Colombo, Porto Seguro, da Rua Coliseu e do Real Parque. Isso foi feito porque o dinheiro arrecadado com a venda de Cepacs nas operações deve ser usado em melhorias dentro da própria região. Com essa manobra, a prefeitura definiu que ao menos 35% dos recursos obtidos na OUCFL irão para obras de urbanização e melhorias nessas comunidades.

Cristina Wehba, urbanista ligada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP e representante do Instituto de Arquitetos do Brasil de São Paulo (IABsp) no grupo de gestão da OUCFL, ressalta a importância de atender o complexo de Paraisópolis, mas analisa que a proposta é “aparentemente populista”, porque não há previsão de quais obras serão efetivamente feitas nas comunidades, do valor a ser arrecado com os Cepacs e se o montante será suficiente para elas. Na sua visão, é uma forma de “justificar a ampliação de potencial construtivo”.

Esse potencial teria sido retirado da OUCFL na sua criação, em 1995, e agora estaria voltando sem a atualização de estudos, como o de impacto ambiental, afirma. Wehba critica, ainda, a falta de interlocução com o grupo de gestão da operação, órgão consultivo e deliberativo. “O projeto foi encaminhado diretamente à Câmara pelo prefeito”, diz.

As operações urbanas recebem críticas há anos por nem sempre levarem a participação popular em conta, por promoverem uma elitização das áreas e por priorizarem obras viárias.

Viviane Rubio, professora da FAU do Mackenzie, que participou dos primeiros projetos da OUCFL, vê as inclusões como positivas, mas lembra que urbanizar favelas é “muito complexo” e que é preciso considerar os desejos dos moradores. “Paraisópolis é uma megafavela, com muita área de risco, vão remover as famílias e colocar onde?”, questiona.

Segundo a Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL) de São Paulo, o “complexo Paraisópolis”, que inclui comunidades no seu entorno, tem mais de 100 mil famílias.

A revisão da operação também passou a incluir parte de uma área que antes ficava de fora do perímetro, entre as ruas Clodoromiro Amazonas e Ramos Batista. Para Rubio, o incentivo a mais construções pode causar impactos em vários níveis, como o aumento do trânsito e da área impermeável. Ela também questiona a capacidade da infraestrutura de água e esgoto, e qual tipo de construção será atraído para lá.

A SMUL destaca que agora edifícios que estavam irregulares por falta de Cepacs poderão ser regularizados. Nesse caso, o dinheiro arrecadado irá para habitação de baixa renda.

FONTE: VALOR ECONôMICO